Venda de prédios  da Fidelidade é uma “bomba-relógio”, diz Roseta

Venda de prédios da Fidelidade é uma “bomba-relógio”, diz Roseta


A deputada e presidente da Assembleia Municipal de Lisboa está preocupada com a intenção da Fidelidade de vender várias frações em bloco, em Lisboa 


Helena Roseta, deputada pelo Partido Socialista e presidente da Assembleia Municipal de Lisboa (AML), diz que a intenção de venda em bloco de vários imóveis, localizados em Lisboa, por parte da seguradora Fidelidade é uma “bomba-relógio”.

A empresa anunciou em outubro de 2017 a intenção de alienar 277 imóveis espalhados por todo o país, concentrados principalmente em Lisboa. A deputada diz que a autarquia fez um levantamento que sugere que, só em Lisboa, há esse número de imóveis na posse da seguradora, o que suscita alguma preocupação.

“A Câmara de Lisboa fez uma pesquisa nas conservatórias para saber o património em nome da Fidelidade e tinha informações de que estavam interessados em vender”, disse ao i Helena Roseta. Segundo os dados recolhidos, esse património ultrapassa as “1500 frações” numa lista de “páginas, páginas e mais páginas”, apontando para um universo de 280 prédios.

Alertados pela situação dos moradores de Santo António dos Cavaleiros, em Loures – onde contratos de arrendamento em prédios da Fidelidade não estão a ser renovados -, responsáveis da Câmara Municipal de Lisboa entraram em contacto com a seguradora para apurarem se estaria interessada em dar direito de preferência à autarquia numa possível venda. “A Câmara começou a fazer diligências, a dizer que estava interessada em comprar, e deparou-se com a Fidelidade a fazer diligências para vender, mas quer vender em bloco e não prédio a prédio”, garante Helena Roseta. “A Câmara de Lisboa não tem condições para comprar de repente 1500 frações”, avisa a deputada.

A lista a que a presidente da AML teve acesso apresenta apenas o património da Fidelidade, não se sabendo qual a utilização dos imóveis, se são comerciais ou habitacionais, mas não se pode afastar a possibilidade de significativa preponderância dos segundos. “Muitas destas pessoas que moram nestes lugares até, provavelmente, não receberam carta nenhuma [de não renovação do contrato de arrendamento]”, admite Roseta. “Temos uma ideia da dimensão em Lisboa, mas não no resto do país.”

O desenrolar da situação em Loures pode abrir o precedente para a capital. “Presumimos que, ao abrigo da atual legislação, quando o contrato chega ao fim e se o proprietário notificar o inquilino, com determinada antecedência, que se opõe à renovação do contrato, o inquilino tem de se ir embora”, explica ainda a deputada. 

Apesar de a Fidelidade estar a respeitar a lei, a questão assume uma nova proporção com o impacto da seguradora no mercado imobiliário. “Acontece que agora de repente há uma concentração de 1500 situações dessas [não renovação de contratos de arrendamento] num só proprietário”, disse a presidente. “Os problemas mudam de natureza quando mudam de escala.” 

A situação deve, na opinião de Roseta, ser “encarada politicamente” por se tratar de uma “bomba-relógio”. Contactada pelo i para esclarecer quais os planos para os imóveis em Lisboa, a Fidelidade não respondeu até ao fecho da edição. 

A seguradora anunciou, em setembro de 2017, a intenção de reconfigurar a sua carteira de imobiliário ao vender 277 imóveis espalhados por todo o país, com 70% a terem usufruto habitacional. Destes 277, 54% localizam-se em Lisboa e 12% no Porto, estando os restantes espalhados pelo resto do país. Em Lisboa, a seguradora tem cerca de 1700 inquilinos. Se, tal como Roseta afirma, a empresa pretender avançar com uma venda em bloco das frações que detém em Lisboa, então o número de imóveis alienados poderá até ser maior do que o inicialmente previsto.

Com a venda dos 277 imóveis, a seguradora pretende fazer entrar nos seus cofres cerca de 400 milhões de euros – uma decisão que, segundo Roseta, não pode ser separada da privatização da seguradora pelo anterior governo PSD-CDS, em 2014, numa venda à chinesa Fosun. “Foi uma entidade privatizada em 2014. Se se tivesse mantido pública, este problema não se colocava ou, pelo menos, não nos mesmos termos”, considera a deputada. Roseta diz ter tentado apurar em que moldes a privatização da seguradora foi feita para saber se tinha sido acautelado o interesse dos seus inquilinos, mas não teve sucesso. 

Entretanto, a comissão parlamentar de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação já requereu a presença da administração da Fidelidade no parlamento, para prestar esclarecimentos. A deputada espera que o conselho de administração explique tanto a intenção de venda de imóveis em Lisboa como a situação dos moradores de Santo António dos Cavaleiros. A secretária de Estado da Habitação, Ana Pinho, vai ser também ouvida no parlamento sobre este dossiê no início da próxima semana.

Nova lei de bases da Habitação Há décadas que uma Lei de Bases da Habitação é reivindicada e até ao final de abril estará concluída, adianta ainda Helena Roseta, sem avançar pormenores. A deputada socialista tem trabalhado sozinha na redação da proposta legislativa desde abril do ano passado. O processo atrasou-se com as últimas eleições autárquicas, mas avançou nos meses seguintes com iniciativas de discussão e participação públicas.