O Conde de Montenegro


Como qualquer homem inteligente, Montenegro também tem os seus momentos de menor assertividade. Foi o que aconteceu no congresso


Um cenário idílico! Uma comovente união entre vencidos e vencedores! Um congresso que mais parecia um romance! Mas eis que por detrás do alvorecer da suposta nova era, e qual Edmond Dantès da modernidade, surge feroz, renovado, tonitruante e jurando o seu impiedoso regresso o Conde de Montenegro. Foi mais ou menos isto que aconteceu no 37.º Congresso do PSD, onde Rui Rio teve a sua primeira grande prova de fogo!

Congressos são congressos e, verdade seja dita, entre discursos na generalidade enfadonhos, demonstrações de afeto aos vencidos e aos que saem, para inglês ver, e a costumeira, mas falsa simpatia aos que entram, tudo parecia demasiado lírico para ser verdade. Ora bem, o momento alto estava para chegar e, desta feita, ficou a cargo de Luís Montenegro, que finalmente pareceu assumir aos sete ventos que, nas próximas eleições à liderança do partido, lá estará para reclamar a sua Mercédès.

Porém, desta quase alegoria que se faz tendo como cenário originário uma célebre obra de Alexandre Dumas, um pormenor não bate certo. É que pese embora, ao que parece, o amor de Rio e de Montenegro seja o mesmo, verdade seja dita, o primeiro, distintamente do que no livro fez Fernand Mondego, não traiu o seu amigo para lhe roubar a donzela. Foi Montenegro quem por opção própria dela desistiu. E, por isso, aqui termina o domínio da romântica prosa, começando a dura e politiqueira realidade. Luís Montenegro é, sem margem para dúvidas, um homem inteligente.

Porém, como qualquer homem inteligente, também tem os seus momentos de menor assertividade. Foi o que aconteceu no congresso. E para sustentar o que se diz, atente-se nas duas principais linhas argumentativas do seu discurso. Por um lado, a declarada crítica política e de postura pessoal que fez a Rio e, por outro, o chavão do “quando me candidatar não vou pedir licença a ninguém”. Quanto ao primeiro domínio de observação, Montenegro, obviamente como qualquer outro congressista, esteve no seu pleno direito de discursar. Até aí, tudo normal. Agora, se de facto tem uma tão grande aversão ao que Rio, ganhando, fará, na sua opinião, ao PSD, e considerando-se, como pareceu, o líder certo para o mesmo, porque é que não se candidatou já? Tinha sido de valor. E hipoteticamente, quem sabe, muitos que votaram Rio até poderiam ter votado nele. É que este hábito de fugir aos confrontos e, depois de se querer estar fora deles, vir rachar lenha, não cai bem! Peca por extemporâneo!

Já quanto ao segundo argumento, era só o que faltava que Montenegro, quando se decidir candidatar, e a fazê-lo, fá-lo-á bem, tenha de pedir licença a alguém. Ora também eu não pedia! Também eu e qualquer outra pessoa. Portanto, para lá da intenção que pretendeu, que foi deixar o recado no ar, mais uma vez não disse nada de extraordinário. Quase pareceu que Montenegro, no receio de se esquecerem da sua futura presença, tivesse ele próprio de relembrar. Enfim, desnecessário!

 

Escreve à sexta-feira