No cemitério das definições


O relatório “The Global Risks Report 2018”, apresentado no Fórum Económico Mundial, define o risco global como um evento que pode provocar, pelo menos durante os próximos 10 anos, um impacto negativo significativo para muitos países ou indústrias. 


Vivemos uma época salpicada de incertezas, inquietações e múltiplos receios de que algo aconteça, mesmo quando tudo parece estar controlado. A necessidade de querer definir tudo e de tudo querer prever é algo de intrinsecamente inerente à condição humana, pois tendemos, por regra, a suportar melhor o que nos rodeia e interpela a curiosidade, pela singela circunstância de lhe darmos um nome.

Vêm estas minhas palavras a propósito do mais recente relatório relativo aos riscos globais, intitulado “The Global Risks Report 2018”, apresentado por estes dias no quadro do Fórum Económico Mundial, em Davos, Suíça. Nesse documento, de importância vital para os destinos das nações nos próximos anos, define-se risco global como um evento ou condição de ocorrência incerta mas que, tendo lugar, pode provocar, pelo menos durante os próximos 10 anos, um impacto negativo significativo para muitos países ou indústrias. Referem-se, aí, riscos económicos, ambientais, geopolíticos, sociais e tecnológicos, procurando-se, concomitantemente, descrever, de modo curto e incisivo, em que é que cada um deles consiste e de que forma se manifesta.

A título exemplificativo, prevê-se a ocorrência de riscos globais no plano económico, em virtude do surgimento de bolhas de ativos, crises financeiras em economias chave, elevado desemprego estrutural, potenciais falhas nos mecanismos ou instituições financeiras ou, ainda, o risco de práticas comerciais ilegais, tais como as que se traduzem por um recrudescimento da evasão fiscal e tráfico humano, apenas para referir duas das mais importantes.

No contexto ambiental, os riscos não são negligenciáveis, antevendo-se, por exemplo, o surgimento de eventos climatéricos extremos ou mesmo de falhas de vária ordem na adoção, pelos diferentes Estados, das medidas necessárias no quadro de uma desejável estratégia de adaptação e de mitigação às alterações climáticas.

No plano geopolítico, antecipam-se riscos significativos conexionados com ataques terroristas em larga escala ou mesmo a entrada em cena de armas de destruição maciça, circunstâncias estas adensadas pela emergência, no complexo mosaico social, de novas crises alimentares e por uma galopante proliferação de doenças infeciosas, tudo enleado num ambiente de profunda instabilidade social.

No encriptado universo dos riscos tecnológicos, assistir-se-á, muito provavelmente, a um aumento das situações de fraude e de roubo de dados, à explosão de ciberataques em larga escala e, ainda, mas não menos importante, ao surgimento de múltiplas consequências adversas como resultado direto do imparável desenvolvimento tecnológico a que nos últimos anos se tem assistido.

Em boa verdade convenhamos que todos estes riscos nos soam bem familiares. Para todos eles se ensaia, no quadro dos conhecimentos disponíveis, uma breve descrição, procurando, sem tibiezas, densificá-los, determinar a grau de probabilidade da sua ocorrência e, caso esta se confirme, o respetivo impacto.

Avança-se, em suma, com os riscos globais nos mais variados domínios de atuação dos Estados e, paralelamente, ilustram-se os mesmos, definindo para cada um deles o que de mais importante lhes subjaz. Estes herméticos e arrojados exercícios de tipificação dos riscos globais e de propostas definitórias do que neles de mais crítico se contém, encerram em si uma incompreensível e exasperante fuga para a frente dos principais decisores públicos no palco da nova ordem mundial. Prevê-se, aqui e ali, riscos que já não o são, dado que a realidade que os corporiza é já parte do nosso presente, herança que é de um passado recente, impregnada de ensinamentos que a memória dos homens persiste em obliterar e sequestrada num futuro que nos prende num continuum inesgotável.

Na verdade, não é incerto o que em parte já se conhece, o que ocorre como causa-efeito de experiências já vividas, o que se mimetiza na história para, uma vez mais, nos pôr à prova. Esse é, sem dúvida, o presente feito eterno futuro, que transmuta os riscos em realidade bem viva e cruel no dia-a-dia de todos e de cada um de nós. De tal sorte que a tentação de abarcar uma coisa com uma definição, por mais arbitrária que seja, é rejeitá-la, torná-la insípida e supérflua ou, numa só palavra, aniquilá-la.

Na verdade, mais do que um «cemitério das definições» que o ambicioso Relatório se propõe ser, para utilizar a poderosa expressão de Emil Cioran, impõe-se, nesta e noutras matérias, que se aprenda com os erros do passado, pois é partindo destes que, estamos certos, se esquissarão adequada e eficazmente os riscos futuros e a sua desejada eliminação.


No cemitério das definições


O relatório “The Global Risks Report 2018”, apresentado no Fórum Económico Mundial, define o risco global como um evento que pode provocar, pelo menos durante os próximos 10 anos, um impacto negativo significativo para muitos países ou indústrias. 


Vivemos uma época salpicada de incertezas, inquietações e múltiplos receios de que algo aconteça, mesmo quando tudo parece estar controlado. A necessidade de querer definir tudo e de tudo querer prever é algo de intrinsecamente inerente à condição humana, pois tendemos, por regra, a suportar melhor o que nos rodeia e interpela a curiosidade, pela singela circunstância de lhe darmos um nome.

Vêm estas minhas palavras a propósito do mais recente relatório relativo aos riscos globais, intitulado “The Global Risks Report 2018”, apresentado por estes dias no quadro do Fórum Económico Mundial, em Davos, Suíça. Nesse documento, de importância vital para os destinos das nações nos próximos anos, define-se risco global como um evento ou condição de ocorrência incerta mas que, tendo lugar, pode provocar, pelo menos durante os próximos 10 anos, um impacto negativo significativo para muitos países ou indústrias. Referem-se, aí, riscos económicos, ambientais, geopolíticos, sociais e tecnológicos, procurando-se, concomitantemente, descrever, de modo curto e incisivo, em que é que cada um deles consiste e de que forma se manifesta.

A título exemplificativo, prevê-se a ocorrência de riscos globais no plano económico, em virtude do surgimento de bolhas de ativos, crises financeiras em economias chave, elevado desemprego estrutural, potenciais falhas nos mecanismos ou instituições financeiras ou, ainda, o risco de práticas comerciais ilegais, tais como as que se traduzem por um recrudescimento da evasão fiscal e tráfico humano, apenas para referir duas das mais importantes.

No contexto ambiental, os riscos não são negligenciáveis, antevendo-se, por exemplo, o surgimento de eventos climatéricos extremos ou mesmo de falhas de vária ordem na adoção, pelos diferentes Estados, das medidas necessárias no quadro de uma desejável estratégia de adaptação e de mitigação às alterações climáticas.

No plano geopolítico, antecipam-se riscos significativos conexionados com ataques terroristas em larga escala ou mesmo a entrada em cena de armas de destruição maciça, circunstâncias estas adensadas pela emergência, no complexo mosaico social, de novas crises alimentares e por uma galopante proliferação de doenças infeciosas, tudo enleado num ambiente de profunda instabilidade social.

No encriptado universo dos riscos tecnológicos, assistir-se-á, muito provavelmente, a um aumento das situações de fraude e de roubo de dados, à explosão de ciberataques em larga escala e, ainda, mas não menos importante, ao surgimento de múltiplas consequências adversas como resultado direto do imparável desenvolvimento tecnológico a que nos últimos anos se tem assistido.

Em boa verdade convenhamos que todos estes riscos nos soam bem familiares. Para todos eles se ensaia, no quadro dos conhecimentos disponíveis, uma breve descrição, procurando, sem tibiezas, densificá-los, determinar a grau de probabilidade da sua ocorrência e, caso esta se confirme, o respetivo impacto.

Avança-se, em suma, com os riscos globais nos mais variados domínios de atuação dos Estados e, paralelamente, ilustram-se os mesmos, definindo para cada um deles o que de mais importante lhes subjaz. Estes herméticos e arrojados exercícios de tipificação dos riscos globais e de propostas definitórias do que neles de mais crítico se contém, encerram em si uma incompreensível e exasperante fuga para a frente dos principais decisores públicos no palco da nova ordem mundial. Prevê-se, aqui e ali, riscos que já não o são, dado que a realidade que os corporiza é já parte do nosso presente, herança que é de um passado recente, impregnada de ensinamentos que a memória dos homens persiste em obliterar e sequestrada num futuro que nos prende num continuum inesgotável.

Na verdade, não é incerto o que em parte já se conhece, o que ocorre como causa-efeito de experiências já vividas, o que se mimetiza na história para, uma vez mais, nos pôr à prova. Esse é, sem dúvida, o presente feito eterno futuro, que transmuta os riscos em realidade bem viva e cruel no dia-a-dia de todos e de cada um de nós. De tal sorte que a tentação de abarcar uma coisa com uma definição, por mais arbitrária que seja, é rejeitá-la, torná-la insípida e supérflua ou, numa só palavra, aniquilá-la.

Na verdade, mais do que um «cemitério das definições» que o ambicioso Relatório se propõe ser, para utilizar a poderosa expressão de Emil Cioran, impõe-se, nesta e noutras matérias, que se aprenda com os erros do passado, pois é partindo destes que, estamos certos, se esquissarão adequada e eficazmente os riscos futuros e a sua desejada eliminação.