“Ó pá, vê lá se picas os gajos para eu ter oposição!” – diria Mário Soares a António Campos, segundo este

“Ó pá, vê lá se picas os gajos para eu ter oposição!” – diria Mário Soares a António Campos, segundo este


Ó António Campos, estás mesmo convencido de que Mário Soares precisava que tu arranjasses “sempre um sarilho” e “picasses” quem quer que fosse para ele ter adversários e/ou inimigos?!


As escandalosas tentativas de revisão da história do PS e do próprio Mário Soares, agora que ele está morto, chegam a ser ridículas e obscenas.

Não me refiro, sequer, ao lamentável livrinho recentemente publicado por Vítor Ramalho, cheio de inexactidões, aldrabices e uma significativa lacuna pessoal que contrariaria o título, se o autor tivesse tido a coragem de a revelar.

Refiro-me, sobretudo, à insistência com que António Campos (por quem já tive sincera amizade e consideração) jura a pés juntos que Mário Soares o obrigava a “arranjar sempre um sarilho para haver oposição” contra ele dentro do PS. Era como se Soares dissesse a Campos: “Ó pá, vê lá se picas os gajos para eu ter oposição!” Talvez convença quem nunca conheceu pessoalmente o político Mário Soares na intimidade. Mas, para quem o conheceu bastante bem, a imputação que António Campos lhe faz é, no mínimo, hilariante.

Ainda por cima, António Campos apresenta, em defesa da sua tese, o pior dos exemplos possíveis: o da oposição a Mário Soares, então secretário-geral do PS, levada a cabo, com a maior determinação, pelo chamado “grupo do ex-secretariado”, liderado por António Guterres, António Reis, Jorge Sampaio, Vítor Constâncio e alguns outros, sob o “alto patrocínio” de Francisco Salgado Zenha, a “cumplicidade” do então Presidente da República, general Ramalho Eanes, a “expectativa” esfusiante de Álvaro Cunhal e do PCP, e uma tribuna jornalística que era o semanário “O Jornal”, antecessor da “Visão”.

Se o António Campos está convencido de que foi ele que desencadeou esta tão vasta e ramificada coligação informal para derrubar Mário Soares do cargo de secretário-geral do PS – e em boa parte não o terá conseguido porque Zenha não quis disputar o cargo a Mário Soares no congresso do PS de 1981, no Coliseu de Lisboa –, então é porque o António Campos poderá não estar no seu perfeito juízo. Se estiver, dá-me vontade de fazer como um amigo dele que já morreu, o João Roque, que se deitava no chão a rebolar de riso…

Lamento ter tido de “exumar” este episódio politicamente tão significativo da vida do PS, mas tive de o fazer em nome da verdade histórica e convencido de que se trata de um episódio incontornável para qualquer autor responsável que queira escrever uma história do PS. Documentos e livros não faltam que a ele se referem e o atestam, nomeadamente o semanário “Ação Socialista”, de que fui fundador e diretor nesse período tão agitado, além de uma importante brochura com “Dez pontos de vista sobre a Crise no PS” (de 1981).

Ó António Campos, estás mesmo convencido de que Mário Soares precisava que tu arranjasses “sempre um sarilho” e “picasses” quem quer que fosse para ele ter adversários e/ou inimigos?!

 

Escreve sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990