A eleição de Rui Rio é uma excelente oportunidade para o PSD virar a página em relação a um discurso e a uma prática política seguida nos últimos anos e que conduziu o partido a sucessivas derrotas eleitorais e a um total impasse político. Na verdade, a liderança de Passos Coelho há muito que estava esgotada, não conseguindo adaptar-se à nova realidade política de uma esquerda unida no parlamento e à mudança do ciclo económico. Passos acabou por reconhecer isso quando viu os desastrosos resultados a que as suas apostas falhadas nas autárquicas conduziram o partido, já depois da sua própria insuficiente votação nas legislativas. Por isso, e quando já era evidente para todos que Rui Rio se apresentaria a disputar-lhe a liderança, Passos Coelho optou por desistir de se recandidatar.
Apesar da retirada de Passos Coelho, os seus apoiantes recusaram-se a reconhecer a necessidade de um novo ciclo no partido e preferiram apostar numa “evolução na continuidade”, apoiando um candidato que pudesse protagonizar uma espécie de passismo sem Passos. O problema é que os candidatos mais óbvios perceberam claramente que não seria essa a escolha dos militantes, pelo que o desejado candidato anti-Rio nunca mais aparecia. Até André Ventura anunciou que se candidataria contra Rio se mais ninguém aparecesse.
À última hora apareceu, porém, Santana Lopes, uma candidatura que, embora totalmente inesperada, foi fazendo o seu caminho. Santana Lopes é um bom orador, sabe criar empatia com os militantes e tem alguma facilidade nos debates. Foi por isso recebido de braços abertos pelos apoiantes de Passos Coelhos, que todos os dias lhe apareciam a manifestar-lhe apoio. Mas a sua candidatura tinha fragilidades óbvias. Em primeiro lugar, muita gente ainda estava recordada do desastre que foi a sua passagem pelo governo em 2004-2005, que permitiu ao PS obter a sua primeira maioria absoluta, com José Sócrates. Em segundo lugar, depois disso, as tentativas de regresso político de Santana Lopes tinham saído fracassadas, como em 2009, quando defrontou António Costa para a Câmara de Lisboa, permitindo que este tivesse igualmente maioria absoluta na câmara. Finalmente, não se compreendia que Santana Lopes tivesse deixado a Santa Casa para se candidatar à liderança do PSD, depois de ter afirmado que não podia candidatar-se à Câmara de Lisboa precisamente por causa do seu compromisso com a Santa Casa.
Foi assim que, embora os barões do PSD estivessem quase todos de corpo e alma com Santana Lopes, por acharem que Rio não podia ganhar, o PSD profundo deu a vitória a Rui Rio. Os militantes perceberam perfeitamente que Santana Lopes seria mais uma vez derrotado por António Costa e que era essencial ter um candidato a primeiro-ministro consistente, seguro e capaz de conquistar o centro político. Rui Rio tem, no entanto, uma tarefa hercúlea pela frente. Em primeiro lugar, os seus opositores no partido, seguindo o exemplo de Santana Lopes, vão andar por aí. Depois, não só António Costa é um político hábil como o ciclo económico vai ser favorável ao governo. É preciso, por isso, muito trabalho para reconquistar todo o eleitorado que o PSD perdeu nos últimos anos. Mas, pesem embora as dificuldades, ter virado a página já foi muito importante.
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990