Califórnia. Depois do fogo, a chuva e a lama

Califórnia. Depois do fogo, a chuva e a lama


Pelo menos 15 pessoas morreram e mais de 20 estão desaparecidas no sul da Califórnia, vítimas da chuva intensa que provocou deslizamentos de terra em locais onde há um mês lavrava o maior incêndio da História daquele estado norte-americano


A natureza não tem dado tréguas aos habitantes do sul da Califórnia, nos Estados Unidos. Depois do monstruoso incêndio que desde o início do mês de dezembro já consumiu mais de 6600 hectares nos condados de Santa Bárbara e Ventura – ainda ativo em algumas zonas e catalogado pelas autoridades norte-americanas como o maior incêndio da História daquele estado e o sétimo mais destrutivo –, a região foi atingida por intensas chuvas que, na ausência da vegetação consumida pelos fogos, transformaram-se em autênticos rios de lama e entulho, e provocaram perigosos deslizamentos de terra.

Ao início da tarde desta quarta-feira o número de mortes confirmadas situava-se nos 15, o de feridos perto dos 160, e o de desaparecidos ultrapassava as duas dúzias, segundo as estimativas das autoridades. Para além disso, mais de 50 pessoas foram resgatadas.

Outras centenas aguardavam, porém, a chegada das equipas de socorro e dos seus helicópteros para poderem abandonar as suas casas sãs e salvas. Esta quarta de manhã, o escritório do xerife de Santa Bárbara revelou ter recebido mais de 600 pedidos de ajuda por telefone.

“Formou-se literalmente um tapete de lama e lixo por todo o lado, com enormes pedregulhos, rochas, árvores caídas, postes de eletricidade, carros destruídos – demasiados obstáculos e desafios para as equipas de socorro conseguirem alcançar as casas”, descreveu o xerife Bill Brown, citado pela CNN. À KCAL, um residente de Montecito, conta que se conseguia ouvir o “chiar” das condutas de gás destruídas pelo “rio de lama” e ver os postes de eletricidade “partidos em dois”.

De acordo com o Serviço Nacional de Meteorologia norte-americano, entre terça e quarta-feira caíram quase 14 centímetros de chuva na região, sendo que, em alguns períodos de terça-feira, foi registada a queda de 3,8 centímetros por hora. A força das águas destruiu várias casas nas comunidades de Montecito, Carpinteria e Goleta, em Santa Bárbara, obrigou ao encerramento de diversas estradas, incluindo a autoestrada 101, e deixou dezenas de pessoas sem acesso à eletricidade e água potável.

Tragédia expectável

Os incidentes no sul da Califórnia já tinham sido previstos, em grande medida, pelas autoridades. A passagem do incêndio Thomas pela região aniquilou quase por completo a vegetação existente, situação que retirou praticamente toda a resistência natural do solo à ocorrência de deslizamentos de terra, e aumentou o risco de inundações para os cinco anos seguintes.

Conscientes desta realidade e aconselhadas pelos autoridades meteorológicas, os responsáveis políticos de Santa Bárbara emitiram uma ordem de evacuação para várias cidades. Sete mil pessoas foram aconselhadas a abandonar as suas casas antes da chegada da chuva, e o número de pessoas que o fizeram chegou aos 23 mil. O xerife Brown revelou, no entanto, que nem todos “cooperaram com as evacuações” e acabaram por ser apanhados pela água. “Muitos residentes escolheram ficar em casa”, lamentou.

O terreno acidentado e íngreme em vários pontos, característico daquela região da Califórnia, torna-o bastante vulnerável à ocorrência de perigosos deslizamentos de terra. Na memória dos californianos ainda está viva uma catástrofe semelhante: em janeiro de 2005 10 pessoas morreram no condado de Ventura, atingidas pela água e pela lama.