Lobo Antunes 4 – Sócrates 0

Lobo Antunes 4 – Sócrates 0


Lobo Antunes passou a ser merecidamente detentor do estatuto de homem mais desassombrado sobre o Processo Marquês que o país já teve


Por entre um percurso político sempre ascendente, um poder formal que daí inegavelmente adveio e uma incontinente oralidade assente num ego desmedido, cedo se pareceu considerar José Sócrates como o verdadeiro “Guru da retórica”.

Não que na prática e ao olhar dos mais argutos alguma vez o tenha sido de facto mas, honra lhe seja feita, numa mescla assente num estilo de confronto face aos seus interlocutores e numa real capacidade de falar de tudo sem, ainda assim, nada dizer, passo a passo foi o próprio sempre retirando dividendos de um indevido e por vezes até possidónio “endeusamento” que em seu redor se foi criando.

Astucioso, soube sempre tirar igualmente partido de um defeito crónico nacional que se traduz em o “português” ser um individuo inatamente inteligente mas que, ainda assim, tem propensão para se querer fazer passar por parvo. Com a chegada do Processo Marquês, no qual continua a ser, até prova em contrário, inocente, ainda mais se agudizou na presença e no estilo uma postura pública nefasta e quase fétida só possível de tolerar pela brandura intelectual do povo português, pela qual ninguém assume publicamente a coragem de dizer que “já chega” ou que certas explicações “não cabem na cabeça de ninguém”.

Ora, qual raio de luz na opacidade e quando a esperança de lisura crítica parecia já nada mais ser que uma utopia, eis que António Lobo Antunes, em dois minutos e, sobretudo, em apenas quatro frases desintegrou por completo a personagem em questão. Não é que tenha dito nada de extraordinário, mas disse-o! Teve a coragem de dar voz ao que muitos sentem, silenciam ou são “obrigados” a silenciar! Num país que está como está porque os mais capacitados se refugiam na comodidade do silêncio em detrimento da confrontação quando esta deva existir, Lobo Antunes passou a ser merecidamente detentor do estatuto de homem mais desassombrado que, face a esta temática, o país já teve. Deve, por isso, perdurar como o exemplo a seguir. Bem haja!

 

Escreve à sexta-feira