Quando em julho deste ano António Costa, sobre o desaparecimento do material militar de Tancos, afirma que, “com grande probabilidade”, os riscos de segurança interna ou a associação a qualquer tipo de atividade terrorista eram diminutos ou inexistentes, presumindo-se assim uma desvalorização do sucedido, estávamos ainda longe de imaginar que essa desvalorização se viria a traduzir num facto com a recente entrevista do ministro da Defesa Nacional (MDN).
Por entre avanços e recuos o sucedido que levou ao desaparecimento do material militar, que curiosamente nunca foi oficialmente detalhado tendo sido apenas publicado numa notícia de um periódico espanhol, foi sempre, ao longo do processo, alvo de uma certa opacidade. Aliás, igualmente desde o início de julho, a própria Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, após a audição de diversas entidades militares e civis, procura obter respostas por parte do Ministério cujo mero desrespeito institucional com o parlamento e com a sua atividade de escrutínio apenas pode explicar não apenas o silêncio do MDN como a justificação pela opção duma explicação enviesada na comunicação social ao invés do parlamento.
Nela, o MDN considera a hipótese de “no limite” não ter existido um furto. Ora se há hipótese de não ter existido um furto e se, por ordem de razão, não existiu um roubo uma vez que não se identifica uma subtração ilegítima por meio de violência, ameaça ou impossibilidade de resistência de terceiro (neste caso dos militares) apenas podemos concluir que o MDN considera a hipótese da simulação. O que é ainda mais grave por dois motivos simples.
Em primeiro lugar porque lança a suspeita sobre as próprias Forças Armadas imputando-lhes, ainda que indiretamente, um crime contra o Estado e uma participação ardilosa e premeditada no desaparecimento do equipamento e, em segundo lugar, porque a simulação consubstancia uma denúncia sem possibilidade de imputação de um crime a uma pessoa concreta, o que torna o incidente ainda mais grave na medida em que não só impede o completo apuramento da verdade inviabilizando a realização da justiça, como denota um certo disfarce no público e exigível conhecimento da verdade dos factos.
Se aliarmos isto às conclusões do inquérito que apenas o MDN conhece, à desvalorização feita logo em julho pelo primeiro-ministro, que de resto já referi, e às declarações do Secretário-Geral do SIRP – cuja tutela depende do próprio primeiro-ministro – onde refere que apenas tomou conhecimento do sucedido pelas notícias do dia seguinte, percebemos que estamos perante um problema sério cujo esclarecimento cabal não pode deixar de se efetuar.
Mas há, com evidência, um aspeto bastante relevante e que ressalta se trouxermos à memoria um conjunto de acontecimentos em áreas de estado determinantes e que, de uma forma ou de outra, encontramos sempre óbices ao seu apuramento fazendo o acontecimento de Tancos tudo menos um ato isolado. Este governo não tem tido a melhor das fases em aspetos relacionados com assuntos da sua soberania. É assim na Defesa Nacional, tem sido assim nas questões de Segurança Interna ou nas questões da Justiça e da sua administração.
Não sabemos se isto se deve às visões antagónicas, entre o governo e os partidos que o suportam no parlamento, que consubstanciam as áreas que tutelam as questões da nossa soberania nacional. Mas é certo que elas têm existido e que isso constitui, a prazo, um problema sério no regular funcionamento das nossas instituições.
Seja como for ao que parece de uma coisa podemos estar certos. Estamos a caminhar, a passos largos, para que este assunto, tal como outros que ainda procuram explicação, se torne, no limite, em mais um erro de perceção.
Vice-presidente do grupo parlamentar do PSD. Docente universitário
Escreve à segunda-feira