Tenho tentado que este espaço de opinião no i contribua para a discussão sobre novas formas de afirmar e modernizar Portugal por caminhos de sustentabilidade e crescimento económico. As últimas semanas têm sido dedicadas ao tema dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) – o mapa para o desenvolvimento proposto pelas Nações Unidas, talvez a carta mais importante para que, no concerto das nações, se consiga um mundo mais solidário, justo e sustentável em 2030. Um dos ODS é o reforço do papel das cidades. A prioridade que a ONU concedeu às cidades na concretização dos ODS não é ocasional: é que as cidades são mais do que a primeira forma de organização política, elas são a forma primordial de estruturação e identificação comunitária no presente, a força económica, democrática e científica do século xxi.
Ora, se os ODS são o tal mapa para um mundo melhor e se as cidades são uma peça essencial para lá chegar, a pergunta seguinte é esta: qual é o caminho para cidades melhores?
Cascais tem tentado encontrar resposta a esta pergunta com uma estratégia assente nos quatro pilares da sustentabilidade: ambiental, social, económica e da boa governação.
Ontem, Cascais deu mais um passo para que essa sustentabilidade holística seja uma realidade. Foi lançada uma parceria entre Estado central e Estado local na área da saúde, um acordo no qual Cascais e o governo assumem a responsabilidade de dotar o quinto maior concelho do país de mais e melhores unidades de cuidados de saúde primários. Resultado: Cascais terá três novos centros de saúde, ampliados ou construídos de raiz, e o objetivo do município é ter toda a população com cobertura de médico de família até 2019, num investimento superior a 6 milhões de euros.
Sem passa-culpas nem desculpas, cada um sabe exatamente o que fazer: à Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) caberá, entre outras medidas, equipar as unidades de saúde e proceder à alocação de recursos humanos; a Câmara Municipal de Cascais diligenciará a localização dos terrenos para construção de infraestruturas e equipamentos de saúde, elaborará projetos de arquitetura e construirá ou requalificará equipamentos de saúde já existentes.
Esta parceria é apenas um exemplo de como diferentes níveis de administração, de diferentes cores partidárias, alcançam resultados positivos para os cidadãos quando a disputa política é substituída pela boa vontade, quando o imobilismo dá lugar à ação. E por isso sublinho o papel decisivo e construtivo da diretora da ARSLVT, Rosa Zorrinho, e do ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes.
Porque tenho a certeza de que os tempos exigem mais cooperação entre poder central e local, tentarei alargar o espírito desta parceria a outras áreas definidoras do Estado social.
Como a educação pública.
Cascais, como outras cidades no país, não pode educar os seus jovens para a excelência nem pode exigir mais dos seus professores quando há escolas provisórias há 40 anos – como é o caso da Escola Polivalente de Cascais.
Irei propor ao ministro da Educação um acordo nos moldes que já aqui desenhei: Cascais assume a responsabilidade de construir novas escolas se o governo garantir que as equipa com os devidos recursos materiais e humanos.
Mas mais ainda: porque os recursos do Estado, tal como os de uma câmara, são os recursos de todos os portugueses, tentaremos dar continuidade a uma parceria iniciada com o anterior governo na área do património público.
Há poucas coisas mais tristes, reveladoras da ausência de poder político e do desprezo pela história, do que encontrar patrimónios públicos ao abandono. Olhe–se para o Forte de Santo António: é um pedaço da história nacional que continua a cair aos pedaços em vez de ser recuperado. E porquê? Porque alguém decidiu não dar continuidade a uma decisão anterior que permitia à câmara pôr mãos à obra e recuperar o forte.
É verdade que o Estado não sabe que património tem. Ou, sabendo, não tem ideia sobre o que fazer com ele. Defendo que as câmaras podem ser parceiras do governo no objetivo de rentabilizar os patrimónios públicos – induzindo a regeneração urbana (por via da reabilitação do edificado), a abertura de novas cadeias de valor económico (por via de novos usos comerciais dados aos espaços devolutos) e até novas receitas fiscais (IRS, IVA, etc.).
Tenho a certeza de que tanto o atual como o anterior primeiro-ministro partilham esta visão. Todavia, as decisões de ambos tiveram grande dificuldade em vencer o atrito causado pelas estruturas intermédias do Estado – o coração da burocracia.
Para os autarcas, pode ser tentadora a ideia de ter em Lisboa um governo que serve de desculpa para tudo porque não faz o que deve ser feito. Mas a política não pode resumir-se a isso.
Eu não quero um governo que me sirva a mim de desculpa. O que quero é um governo que seja parceiro na ultrapassagem dos obstáculos ou, no mínimo, que me dê autonomia para os resolver por minha conta e risco.
Tal como os governos, os autarcas são eleitos para resolver problemas, não para os atirar para o outro lado da cerca.
Escreve à quarta-feira