Para os mais distraídos, não, não me estou a referir à tomada de posse de Donald Trump como 45º presidente dos Estados Unidos. Essa jigajoga aconteceu a 20 de Janeiro portanto não comecem já com a ideia que vou começar aqui a bater no cabelo do homem com todo o entulho que vem agarrado por baixo. Não… O que aconteceu no dia 13 foi muito mais grave. Mais grave para os meus ouvidos pelo menos.
O dia deve ter nascido como outro qualquer, com o sol a despontar no horizonte, lá para lá do oriente do mundo até que ocorreu o lançamento mundial, talvez por volta do meio-dia, talvez a seguir à bucha do almoço, do single Despacito, de um rapaz porto-riquenho de seu nome Luis Fonsi.
Eu agora escrevia por aqui dois ou três monumentais palavrões só para poder ilustrar de forma fidedigna o que me vai na alma em relação a este acontecimento de proporções cataclísmicas mas não posso porque senão não me publicam isto, o que seria uma pena dos diabos e eu até tenho algo a dizer sobre o caso.
Mas que estou com ganas, lá isso estou… Adiante.
Vamos colocar a questão da seguinte forma, nós ainda estamos em Junho e eu já devo ter ouvido o Despacito para aí umas 83692 vezes e em nenhuma dessas vezes pedi ou tive vontade de o ouvir, foi a modos que me enfiado pelas entranhas adentro basicamente em todo e qualquer lugar a partir do momento em que me levanto da caminha. Um gajo vai ao café, Despacito, um gajo liga o auto-rádio, Despacito, um gajo vai comprar um par de peúgas, Despacito, um gajo vai beber um copo, Despacito. Chiça penico! Não há volta a dar, e o pior desta macacada toda é que eu dou por mim sozinho, a cuidar da minha vidinha, a pôr gasóleo na viatura ou a arear uma panela, o que for, e começo a trautear como que possuído pelo demo do Reggaeton,
Despacito,
Quiero respirar tu cuello despacito,
Deja que te diga cosas al oído,
Para que te acuerdes si no estás conmigo,
Despacito…
Por esta altura já não tenho mão no meu corpo que se meneia como uma bailarina profissional dos Alunos de Apolo em dia de forrobodó, enquanto eu estou ali, na cozinha, só de boxers, com uma panela numa mão e um Scotch-Brite na outra. Eu tento pôr travão nisto, a sério que tento, eu sei que estou a fazer figura de urso, eu sei que estou mas acaba sempre por ser mais forte do que a minha vontade racional entendem?
Vamos lá ver uma coisa, eu tenho consciência que a música não é só a Quinta Sinfonia do Mahler ou o Pássaro de Fogo do Stravinsky, mas… o Despacito? É que já nem é o fundo do poço, é um tipo agarrar numa picareta e escavar um buraco de dois metros no fundo do poço, furar um cano do esgoto no processo, enfiar-se lá dentro e ficar a boiar com cocó até ao pescoço. Estamos a falar duma música de um tipo mascarado de Enrique Iglesias, cuja letra fala de se embrulhar nas carnes de uma garota toda bem encavalitada (como todas as outras letras aliás) e que começa com uma profundidade romântica verdadeiramente avassaladora: Ai, Oh, Oh no, Oh no, Oh yeah, Diridiri, Diridiri Daddy, Go.
É, portanto, a versão loja do chinês do Bailando do Iglesias, ou seja, o momento em que percebes que se consegue sempre ser um pouco mais azeiteiro no que toca à música de abanar a anca.
Bolas, lá estou eu outra vez… acabei de escrever o último parágrafo a trautear o raça da música e nem me dei conta. Sou um ser possuído pelo Reggaeton e o Despacito é a minha Kryptonite, é o que é.
Mas calma que não sou o único. O Youtube diz-me que o vídeo do Despacito possui cerca de 2 Biliões (!!) de visualizações em menos de 6 meses. Deduzo portanto que um terço da população mundial tem em si uma anca levada da breca para o roça-roça e em 2017 o Planeta Terra é nada mais que uma grande ilha do Caribe que anseia em vestir-se de chulo e suar abundantemente dos sovacos.
Mas aqui entre nós, ninguém me tira da ideia que nos poucos momentos de solidão, na reclusão da Casa Branca, por entre um telefonema sobre a construção do muro na fronteira com o México e um e-mail acerca de rasgar o Tratado de Paris, Donald Trump lá estará a dar tudo ao nível da anca, cabelo ao vento, camisa desfraldada, cuecas de velho, óculos de sol, peúgas até ao joelho, um roçar na parede aqui e ali enquanto o Despacito ressoa alto pela boca presidencial na privacidade da Sala Oval com um forte sotaque de canastrão americano,
Despacito,
Quiero desnudarte a besos despacito,
Firmo en las paredes de tu labirinto,
Y hacer de tu cuerpo todo un manuscrito (sube, sube, sube)
Não era lindo? Eu acho que sim.
João Pedro Santos, Escritor e Humorista.