Coreia do Norte faz mais um ensaio nuclear enquanto espera por Trump

Coreia do Norte faz mais um ensaio nuclear enquanto espera por Trump


Sábado, Pyongyang está em festa: o fundador do país faria 105 anos. A frota dos EUA está perto e é altura de largar a bomba


Em 1984, tinha 30 e poucos anos, Donald Trump declarou ao “Washington Post” que queria negociar acordos nucleares com os soviéticos. “Levaria uma hora e meia para aprender tudo sobre mísseis”, declarou. “E, de todo o modo, acho que já sei quase tudo.” Segundo Bruce G. Blair, investigador do Programa de Ciência e Segurança Global da Universidade Princeton, Trump, numa receção em 1990, encontrou um negociador americano de armas nucleares e deu-lhe conselhos sobre como fazer um acordo “genial” com o seu homólogo soviético. Disse-lhe para chegar atrasado, encarar o interlocutor, enfiar-lhe o dedo no peito e dizer: “Fuck you!” Parece que o novo presidente vai experimentar o singular método nas costas da Coreia do Norte mas, desta vez, em vez do dedo vai utilizar bombas.

Quem não parece estar pelos ajuste é Pyongyang. Os norte- -coreanos investiram num programa nuclear como forma de fazer um seguro de vida ao seu peculiar regime, depois de terem assistido a algumas invasões e ataques protagonizados pelos EUA em várias zonas do golfo. Na altura da invasão do Iraque contava-se que a razão por que Washington atacava o Iraque e não a Coreia do Norte é que os segundos não tinham petróleo, mas tinham armas de destruição maciça.

O seguro parece ter funcionado até à posse de Donald Trump: o novo locatário da Casa Branca está convencido de que consegue pôr na ordem o regime norte-coreano. É certo que os EUA têm capacidade para destruir todo o planeta e Pyongyang ainda não construiu mísseis intercontinentais que possam atingir fiavelmente o território norte-americano, mas o mundo pode pagar caro este método. Chineses e japoneses, que estão na região, não parecem especialmente agradados com esta terapia de choque. Os chineses são tradicionais aliados da Coreia do Norte e perderam mais de 300 mil homens na Guerra das Coreias, que acabou em 1953. Na altura morreram e foram feridas mais de 2,5 milhões de pessoas. Agora, com armas nucleares, o inferno é o limite.

Segundo imagens de satélite divulgadas pelo portal especializado 38 North, a Coreia do Norte não vai recuar e prepara-se para fazer mais um ensaio nuclear. As fotografias foram tiradas, na quarta-feira passada, na área onde a Coreia do Norte realiza todos os seus ensaios nucleares, na zona da base militar de Punggye-ri, numa região montanhosa situada a 100 quilómetros da fronteira com a China e a 350 quilómetros a norte de Pyongyang. O diagnóstico é impreciso porque grande parte das instalações são subterrâneas, mas os investigadores afirmam que o tipo de atividade à superfície, ou a falta dela, indica que pode estar em preparação um novo ensaio nuclear. Segundo o “El País”, nos últimos dez dias, a quantidade de água drenada dos subterrâneos reduziu–se e a pilha de resíduos está intacta, o que significa que foi mais seca e escavada a galeria. Este padrão poderia “significar a iminência de um sexto ensaio nuclear”.

Alguns dos analistas citados pelo jornal espanhol especulam que este ensaio poderia coincidir com a celebração, este sábado, do 105.o aniversário do nascimento do Kim Il-sung, avô do atual líder, pai do precedente homem forte da Coreia do Norte, fundador do regime e autor da ideia de Zuche, base teórica abastardada do “comunismo” de Pyongyang.

Um novo ensaio, somado à presença de uma poderosa esquadra naval dos EUA nas águas da Coreia, poderia fazer subir muito a tensão na região. A Coreia do Norte tem procedido a numerosos testes de mísseis apesar da oposição da ONU; e a Coreia do Sul decidiu acelerar a instalação de um escudo antimísseis. A nova administração Trump já ameaçou várias vezes, nas últimas semanas, resolver o diferendo com uma intervenção militar caso a China, histórico aliado de Pyongyang, não garanta a desnuclearização da Coreia do Norte.

Não é a primeira vez que um presidente norte-americano corre para o botão nuclear depois da ii Guerra Mundial. Houve ocasiões que a catástrofe esteve por muito pouco. Depois de Nixon ter mandado descolar bombardeiros nucleares rumo à União Soviética, para mostrar a sua determinação e que poderia atacar com essas armas o Vietname do Norte, a sua equipa passou a vê-lo com outros olhos.

Durante as semanas finais do escândalo Watergate, em 1974, alguns dos assessores do presidente viam-no como uma pessoa instável. James R. Schlesinger, o secretário da Defesa à época, emitiu uma diretiva ao chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos, solicitando que “qualquer ordem de emergência proveniente do presidente” passasse por ele, Schlesinger, antes que se desse curso a qualquer tipo de ação – assim relata James Carroll em “House of War, uma história do Pentágono”. Resta saber se farão o mesmo com Trump.