Da violência juvenil


Há uma discussão, ainda que bastante controversa, que se reveste de absoluta atualidade. Refiro-me, claro, à redução da idade da imputabilidade penal.


Nas últimas semanas têm vindo a público sucessivos episódios de violência juvenil de uma brutalidade tal que torna impossível ficarmos à margem deste emergente comportamento. Os episódios de violência gratuita entre jovens são um motivo de preocupação social que transcende a pura e simples ligação afetiva às vítimas. Sobretudo porque o ritual que subjaz à sua propositada divulgação nas redes sociais confirma a premeditação da atrocidade do ato. 

Desta vez foi no Seixal. Uma jovem de 13 anos é brutalmente espancada por um grupo de outros jovens enquanto outros registam o momento de humilhação com os seus telemóveis. Mais do que a violência, grave por si só, o assunto reveste-se de uma espécie de rito grupal em que a humilhação, a demonstração de fraqueza e a impotência do outro são o objetivo principal. 

A inimputabilidade em razão da idade é uma das causas de desculpação que o Código Penal prevê. Aos jovens entre os 12 e os 16 anos de idade que pratiquem facto qualificado na lei como crime podem apenas ser aplicadas medidas cautelares, previstas na Lei Tutelar Educativa, e que podem ir da admoestação à imposição de regras de conduta ou da frequência de programas educativos e ao internamento, a mais grave das medidas. Em Portugal, o julgamento de ilícito criminal com adulto apenas se dá efetivamente aos 21 anos, estando os jovens entre os 16 e os 21 sujeitos a um regime especial fixado pela imperatividade do art.o 9.o do Código Penal português. Quer isto dizer que, em Portugal, a imputabilidade penal não se dá com a maioridade civil.

Ora, posto o normativo jurídico, há, contudo, uma questão que interpela o Estado e que o potencia a responder perante a crescente gratuitidade da criminalidade juvenil considerando aspetos sociais, culturais e económicos. É verdade que o princípio jurídico vigente procura instituir um direito mais reeducador do que sancionador sem, evidentemente, descurar os interesses fundamentais da comunidade, mas também é verdade que a lei, com mais de 30 anos, que institui esse princípio merece uma abordagem atualizada concomitante com uma desejável revisão, considerando o requinte, a premeditação e a ostentação que estes episódios de que temos vindo a ter conhecimento assumem cada vez mais. 
Sendo o direito aquilo que a sociedade cumpre e não esquecendo o papel preventivo que a administração local e central podem desempenhar, sobretudo ao nível da dissuasão, da promoção da vivência em sociedade e, não menos importante, na integração das suas diferentes comunidades, veja-se os bons exemplos dos municípios de Oeiras e Cascais, passando pelo combate ao enfraquecimento do papel da autoridade, sobretudo familiar. Há uma discussão, ainda que bastante controversa, que se reveste de absoluta atualidade. Refiro-me, claro, à redução da idade da imputabilidade penal. 

As Nações Unidas criaram as regras mínimas para a administração da justiça da infância e da juventude, as Regras de Pequim. E elas dizem-nos que compete a cada Estado a implementação das soluções de combate à delinquência juvenil desde que elas respeitem os legítimos e irrenunciáveis direitos humanos e os direitos das crianças e dos jovens espelhados nos diversos diplomas internacionais.

Não referindo a evidente imaturidade juvenil, na grande generalidade dos casos até aos 16 anos de idade – de resto já protegida, e bem, pela figura da inimputabilidade em razão da idade –, há uma questão que deve ser debatida para os restantes casos também, como já vimos, protegidos por lei especial. Um jovem de 20 anos e 11 meses de vida alvo de tratamento especial pela lei penal tem assim uma noção tão reduzida da ilicitude dos seus atos e uma incapacidade de controlo da sua ação face a um jovem com 21 anos de vida já considerado como adulto aos olhos da lei penal? Pode um jovem assumir na sua plenitude direitos económicos, sociais e políticos sem que cumpra também na sua plenitude, aos olhos da lei, as suas obrigações e deveres para com a comunidade e com o Estado? É uma reflexão que merece ser feita.
 
Deputado do PSD
Escreve à segunda-feiranda-feira