Se dúvidas existissem, o último debate quinzenal dissipou-as por completo. António Costa e o seu governo revelam um certo desnorte e destilam uma certa raiva cada vez que percebem que, afinal, a governação do tempo novo prometido não só não é tão simples quanto nos quiseram fazer crer como já revela uma certa instabilidade no que toca à tão afamada coligação patriótica e de esquerda.
A irritação do primeiro-ministro quando as coisas não lhe correm de feição é tão evidente que se percebe à distância a fragilidade e a fraqueza que subjazem ao acordo das esquerdas. O tempo novo de António Costa é um tempo de democracia de algibeira. O primeiro-ministro lida mal com a crítica, lida mal com o contraditório e lida sobretudo muito mal com a decomposição dos seus números que revestem e sustentam a sua realidade ficcionada.
António Costa, ao afirmar que “o PSD é hoje irrelevante, o PSD não conta para nada relativamente ao país”, num claro amuo e irritação sobre a votação na TSU, está em boa verdade a fazer o melhor elogio que o partido mais votado pelos portugueses nas últimas eleições poderia ter.
O PSD foi colocado na oposição numa ação premeditada e concertada pelo Partido Socialista com comunistas e radicais. E fizeram-no conscientes de duas premissas, hoje cada vez mais inquestionáveis: impedir que existisse novo governo liderado por Passos Coelho, ainda que fosse essa a expressão do voto popular, e criar uma quimera onde era possível viver sem responsabilidade e sem se continuar num caminho rigoroso e determinado depois de um dificílimo período de ajustamento.
Costa tem toda a razão. O PSD não serve para nada. Sobretudo quando o “nada” surge para se fazer os jeitinhos inconvenientes de medidas mais impopulares que afastam Costa dos seus parceiros do tempo novo, isolando-o na degustação do fel que ele próprio fomentou. E como se torna evidente, o PSD, para esse “nada”, não pode estar disponível. Até por uma razão muito simples.
A validação de medidas que camuflem a irresponsabilidade desta governação é contribuir para o jogo de Costa que, com a sua conhecida habilidade, lá vai tomando todos por idiotas.
No fundo, o que aconteceu na TSU. Uma proposta que servia para compensar a subida do salário mínimo, uma medida popular mas pouco condizente com a capacidade económica do país, tal como, de resto, afirmou o próprio ministro Vieira da Silva no debate parlamentar.
Que o PCP e o BE se sintam confortáveis com os ataques de retórica do PS, ao mesmo tempo que apoiam a generalidade das medidas do seu governo, é um problema deles que só revela aquilo que estes partidos são.
Que o PCP e o BE se sintam confortáveis com a falsa devolução de rendimentos, totalmente apagada com o aumento de impostos indiretos, com escolas fechadas por falta de funcionários e de condições mínimas, por termos hospitais em dificuldades de funcionamento, pela degradação de serviços públicos fruto das cativações permanentes que ajudaram a mascarar as contas públicas e por termos juros de dívida pública a dez anos acima dos 4% é um problema deles e apenas a eles caberá responder por isso.
Ao PSD cabe apenas mostrar que vai desempenhar o papel que o tempo novo lhe reservou. Opor-se com veemência ao desbaratar dos pergaminhos que conquistou durante o período de resgate – sim, a nossa economia crescia mais no final do resgate do que cresce agora – e mostrar uma coisa muito simples: que o seu projeto é alternativo, e nunca complementar, à fantasia do tempo novo.
Portanto, o palavreado culpabilizador de Costa em relação ao PSD de nada serve. Costa tem de fazer jus à tão proclamada estabilidade com os seus parceiros no parlamento. É a eles que é devida lealdade e solidariedade política. Para o que é bom e popular, mas sobretudo para o que é necessário e, não raras vezes, impopular.
Escreve à segunda-feira