Armando Vara. “A razão por que Campos e Cunha me chamou era porque queria mexer na Caixa”

Armando Vara. “A razão por que Campos e Cunha me chamou era porque queria mexer na Caixa”


Poucos dias após o ex-ministro das Finanças Luís Campos e Cunha ter revelado no parlamento um encontro com Armando Vara, o ex- -administrador da Caixa contou ao i tudo o que aconteceu no restaurante do CCB. E garante que entendeu a conversa como uma “sondagem”


Armando Vara não tem dúvidas de que Luís Campos e Cunha queria mudar o rumo da Caixa Geral de Depósitos e garante que, durante o almoço que ambos mantiveram – revelado este mês pelo ex-ministro das Finanças no parlamento –, a insatisfação com a antiga administração do banco público foi clara. Há dez dias, durante a audição na comissão parlamentar de inquérito, Campos e Cunha revelou ter almoçado com Armando Vara numa altura em que disse estar a ser pressionado por José Sócrates para demitir a administração do banco público. Explicou ainda que o almoço se tratou de um encontro entre amigos – negando que fosse um convite a Vara para a administração – e que, por isso, pagou do seu bolso e rasgou a fatura à frente do convidado.

Vara diz ao i não se lembrar do detalhe da fatura, mas garante que muito do que foi dito na comissão parlamentar de inquérito sobre o tal almoço – que aconteceu no restaurante do Centro Cultural de Belém – não está correto: “Lembro-me muito bem do almoço, ele não disse a verdade no parlamento.”

Armando Vara, que chegou à administração do banco público depois da saída de Campos e Cunha – já na tutela de Teixeira dos Santos –, diz mesmo ter entendido a conversa “como uma sondagem”: “É óbvio que a razão pela qual me chamou era porque estava a pensar mexer na Caixa Geral de Depósitos.”

Ainda assim, o ex-administrador do banco público recorda que, durante a refeição, o assunto que mais preocupava o ex-ministro das Finanças nem era a Caixa Geral de Depósitos. “Nessa altura estava para ser aprovada a lei que impedia que as pessoas acumulassem as reformas com os ordenados, e ele estava nervosíssimo. Estava preocupado com isso, até porque a mulher o estava a pressionar”, refere Vara, explicando ainda que Campos e Cunha também estava preocupado com uma alegada conspiração da comunicação social contra ele.

“Senti-o destabilizado porque tinha escrito um texto sobre a sustentabilidade dos investimentos públicos e achava que havia uma conspiração na comunicação social sobre ele porque estava tudo a criticá-lo”, conta o então diretor da CGD ao i, garantindo que nunca falaria sobre tal encontro se o mesmo não tivesse sido referido publicamente por Campos e Cunha: “Acho que aquilo foi um absurdo e acho que nem ficou bem a um ex-ministro das Finanças ter dito que foi almoçar com uma pessoa, que pagou do bolso dele e que rasgou a fatura para não ficar nada registado. Então para que falou disso se era privado? Eu nunca falei desse almoço com ninguém.”

Acrescenta tê-lo feito agora por ter visto o seu nome referido durante a audição na comissão parlamentar de inquérito: “Nunca falo sobre conversas privadas e é isso que faz as pessoas confiarem em mim.”

As alterações na Caixa De acordo com Armando Vara, durante o almoço ficou claro que o então ministro das Finanças queria alterar várias coisas na estrutura do banco público: “A certa altura falou-se da Caixa, ele perguntou-me como estavam as coisas no banco, disse que gostava de ouvir a minha opinião, porque estava a pensar mudar a governance e criar uma holding, uma coisa assim do género.”

Tudo porque havia muitas instituições distintas de que a Caixa era proprietária e que seria melhor que estivessem separadas, tendo todas elas essa holding como proprietária. “Houve uma altura em que se falou muito nisso. A Caixa é proprietária do banco em Espanha, do banco em Moçambique, é proprietária do banco de investimento, é uma holding em si. Tudo é do banco. Na altura, o que se pensava é que era necessária uma holding acima que tivesse a Caixa e as restantes instituições. Mas, nesse encontro, ele não entrou em detalhe. Sei, porém, que na altura era uma ideia”, adianta.

Foi nessa parte da conversa que Vara se terá apercebido de que o ex-ministro queria mudar o rumo da Caixa Geral de Depósitos, tendo até pedido que Vara o ajudasse com ideias: “Perguntou-me ainda se não me importava de fazer um paper com ideias que pudessem ser relevantes para o futuro da instituição. Mas, como dez dias depois já não era ministro, não cheguei sequer a enviar.”

Teixeira dos Santos com ideias novas Contrariamente ao que Campos e Cunha disse no parlamento – que alguns aspetos do destino da Caixa estavam traçados quando Teixeira dos Santos chegou –, Vara garante que o novo ministro trouxe ideias suas: “Na cabeça do novo ministro nunca esteve a questão da holding, a mudança da estrutura governativa do grupo. E quando se diz que ele mudou a administração, é importante perceber que só entraram três novos elementos; os restantes ficaram lá.”

O ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos recorda que foram nomeadas três pessoas – Carlos Santos Ferreira, ele e Francisco Bandeira – e que os outros quatro já lá estavam na administração anterior.

“Alguns não foram reconduzidos porque eram 11 administradores e, com a mudança, passaram a ser sete administradores – só três eram novos elementos”, conclui, atirando: ”A grande mudança de que falam foi a entrada de três elementos, parece que era grande porque estava lá eu.”

Não se importa de ir à AR Questionado pelo i sobre se estaria disponível para ir ao parlamento esclarecer alguns pontos sobre a Caixa Geral de Depósitos, Vara diz não ter qualquer problema em fazê-lo, desde que tenha conhecimento dos assuntos.

“Mandei uma carta ao presidente da assembleia-geral a dizer que deveria haver inquérito, porque quem não deve não teme. Estou disponível para ir à Assembleia da República explicar tudo aquilo que entenderem, desde que tenha conhecimento”, conclui.

“Os contactos que tive com o dr. Vítor Martins [que na altura liderava a CGD], que eu não conhecia pessoalmente, foram muito positivos. Senti que havia uma estratégia para a CGD, que os problemas existentes estavam identificados e havia soluções para os ultrapassar”