A confissão de Durão Barroso


Ninguém ligou ao que disse o ex-senhor Europa e atual mister Goldman na Web Summit, mas vale a pena recordar


1) Nota prévia: quando Durão Barroso aceitou ir para o Goldman Sachs, não se o criticou neste espaço, uma vez que tinha cumprido o tempo legal para o poder fazer, porque outros tinham feito percursos semelhantes e porque não há razões para achar que todos são uns crápulas naquela instituição, perante a qual quase todos os poderes dobram a espinha.

Dito isto, Durão Barroso parece ter ultrapassado os limites do decoro, na semana passada, numa declaração que fez na Web Summit e que ninguém comentou.

Mas vejamos o que disse o ex-presidente da Comissão Europeia, citando-o textualmente: “Agora falo completamente à vontade. Já não tenho nenhum cargo oficial. Digamos que o meu nível de sinceridade está a aumentar dia após dia.” 

Depois disto, há que pensar em dar a mão à palmatória e reconhecer que os detratores de Barroso podiam ter razão quando consideravam que ele foi sempre pura e simplesmente um oportunista e um cínico na política.

Claro que se sabe que um político não pode dizer tudo o que lhe vem à cabeça, mas não é menos certo que há padrões de comportamento que não devem mudar tão radicalmente, porque as funções públicas devem ser acompanhadas de transparência e comportamentos éticos corretos.

É verdade que há muitos políticos que praticam exatamente o que Barroso confessou e é exatamente por isso que estão a aparecer cada vez mais fenómenos populistas que encantam os que ficam horrorizados ao ouvir Barroso e afins.

Mas pode ser que o nosso compatriota esteja a falar verdade e se esteja a redimir. E que agora seja genuinamente sincero e que através dele possamos saber, nós e o mundo, as coisas maquiavélicas e os negócios que o Goldman Sachs faz e fez, como, por exemplo, operações financeiras que levaram à crise de 2008 ou a manipulação infame e sistemática das contas da Grécia. Sim, deve ser exatamente isso que José Manuel Durão Barroso vai fazer nas funções em que ficou investido no Goldman! Só pode ser isso! Que ninguém duvide de que esta fase de sinceridade vai trazer uma enorme transparência a uma organização até aqui opaca. Que bom!

2) É preciso ser um idiota chapado para se ser português e do PNR, um partido nacionalista, xenófobo e racista. Ser patriota é saudável e é uma qualidade que se deve ter, independentemente de estar mais à esquerda ou mais à direita. Quem pensa como o PNR não pode sequer reclamar-se de um povo como o nosso que, além de misturado, é regularmente objeto de ostracismo, racismo e xenofobia em países que distam menos de mil quilómetros em linha reta. É claro que este partido é um bando residual a que se juntam outros, alguns dos quais nada têm a ver com política, mas com violência criminal e sistemática. Para os castigar, era engraçado mandá-los para a Hungria, Rússia e Alemanha para ver o tratamento que os coleguinhas magiares, eslavos e arianos dispensariam a estes sulistas do Al-Andalus.

3) Como se não bastassem os problemas que os quase 200 países do mundo e os seus sete biliões de habitantes humanos lhe irão dar, o nosso António Guterres vai agora ter de gerir um cromo chamado Trump. A criatura coloca em termos internacionais mais problemas do que os que suscita a nível interno e que, na realidade, dizem respeito fundamentalmente aos americanos que o elegeram e que terão de o aturar.

A questão mais complexa para Guterres pode não ter a ver com o aumento da tensão político-militar, mas antes com o desafio da sustentabilidade ambiental. Trump tem dito e repetido que tenciona retirar os apoios financeiros americanos às políticas ambientais, pondo fim ao compromisso relativo a que se chegou com Obama depois de muitos e aturados esforços, e que se definiu no histórico acordo de Paris.

Qual avestruz, Trump não acredita no aquecimento global e não vê razões para andar tudo à procura de energias alternativas quando há, por exemplo, o xisto e ainda muito petróleo e gás natural a explorar.

Ora sabe-se que a ONU tem sido, mal ou bem, o fórum onde se encontram consensos mínimos, apesar das reservas de russos, chineses e indianos, os outros maiores poluidores atuais. Se a América recuar no pouco que se avançou, então também não haverá razões para que a Europa mantenha os seus níveis de comprometimento, que são os mais rigorosos do planeta. Numa perspetiva de futuro coletivo, talvez seja este o aspeto mais substancialmente negativo da eleição de Trump, até porque a questão ambiental depende praticamente só da política interna, no caso das grandes economias. 

Algumas análises sobre Trump e as eleições americanas são, entretanto, patéticas. Fazem recordar aquele jornal francês que terá acompanhado o regresso de Napoleão do seu primeiro exílio em Elba nos seguintes termos. Primeiro: O Ogre fugiu da ilha de Elba. Depois: O ditador desembarcou em terras francesas. Mais tarde: Napoleão avança em direção a Paris. E finalmente. Sua Majestade Imperial entrou triunfalmente no Palácio das Tulherias. 


A confissão de Durão Barroso


Ninguém ligou ao que disse o ex-senhor Europa e atual mister Goldman na Web Summit, mas vale a pena recordar


1) Nota prévia: quando Durão Barroso aceitou ir para o Goldman Sachs, não se o criticou neste espaço, uma vez que tinha cumprido o tempo legal para o poder fazer, porque outros tinham feito percursos semelhantes e porque não há razões para achar que todos são uns crápulas naquela instituição, perante a qual quase todos os poderes dobram a espinha.

Dito isto, Durão Barroso parece ter ultrapassado os limites do decoro, na semana passada, numa declaração que fez na Web Summit e que ninguém comentou.

Mas vejamos o que disse o ex-presidente da Comissão Europeia, citando-o textualmente: “Agora falo completamente à vontade. Já não tenho nenhum cargo oficial. Digamos que o meu nível de sinceridade está a aumentar dia após dia.” 

Depois disto, há que pensar em dar a mão à palmatória e reconhecer que os detratores de Barroso podiam ter razão quando consideravam que ele foi sempre pura e simplesmente um oportunista e um cínico na política.

Claro que se sabe que um político não pode dizer tudo o que lhe vem à cabeça, mas não é menos certo que há padrões de comportamento que não devem mudar tão radicalmente, porque as funções públicas devem ser acompanhadas de transparência e comportamentos éticos corretos.

É verdade que há muitos políticos que praticam exatamente o que Barroso confessou e é exatamente por isso que estão a aparecer cada vez mais fenómenos populistas que encantam os que ficam horrorizados ao ouvir Barroso e afins.

Mas pode ser que o nosso compatriota esteja a falar verdade e se esteja a redimir. E que agora seja genuinamente sincero e que através dele possamos saber, nós e o mundo, as coisas maquiavélicas e os negócios que o Goldman Sachs faz e fez, como, por exemplo, operações financeiras que levaram à crise de 2008 ou a manipulação infame e sistemática das contas da Grécia. Sim, deve ser exatamente isso que José Manuel Durão Barroso vai fazer nas funções em que ficou investido no Goldman! Só pode ser isso! Que ninguém duvide de que esta fase de sinceridade vai trazer uma enorme transparência a uma organização até aqui opaca. Que bom!

2) É preciso ser um idiota chapado para se ser português e do PNR, um partido nacionalista, xenófobo e racista. Ser patriota é saudável e é uma qualidade que se deve ter, independentemente de estar mais à esquerda ou mais à direita. Quem pensa como o PNR não pode sequer reclamar-se de um povo como o nosso que, além de misturado, é regularmente objeto de ostracismo, racismo e xenofobia em países que distam menos de mil quilómetros em linha reta. É claro que este partido é um bando residual a que se juntam outros, alguns dos quais nada têm a ver com política, mas com violência criminal e sistemática. Para os castigar, era engraçado mandá-los para a Hungria, Rússia e Alemanha para ver o tratamento que os coleguinhas magiares, eslavos e arianos dispensariam a estes sulistas do Al-Andalus.

3) Como se não bastassem os problemas que os quase 200 países do mundo e os seus sete biliões de habitantes humanos lhe irão dar, o nosso António Guterres vai agora ter de gerir um cromo chamado Trump. A criatura coloca em termos internacionais mais problemas do que os que suscita a nível interno e que, na realidade, dizem respeito fundamentalmente aos americanos que o elegeram e que terão de o aturar.

A questão mais complexa para Guterres pode não ter a ver com o aumento da tensão político-militar, mas antes com o desafio da sustentabilidade ambiental. Trump tem dito e repetido que tenciona retirar os apoios financeiros americanos às políticas ambientais, pondo fim ao compromisso relativo a que se chegou com Obama depois de muitos e aturados esforços, e que se definiu no histórico acordo de Paris.

Qual avestruz, Trump não acredita no aquecimento global e não vê razões para andar tudo à procura de energias alternativas quando há, por exemplo, o xisto e ainda muito petróleo e gás natural a explorar.

Ora sabe-se que a ONU tem sido, mal ou bem, o fórum onde se encontram consensos mínimos, apesar das reservas de russos, chineses e indianos, os outros maiores poluidores atuais. Se a América recuar no pouco que se avançou, então também não haverá razões para que a Europa mantenha os seus níveis de comprometimento, que são os mais rigorosos do planeta. Numa perspetiva de futuro coletivo, talvez seja este o aspeto mais substancialmente negativo da eleição de Trump, até porque a questão ambiental depende praticamente só da política interna, no caso das grandes economias. 

Algumas análises sobre Trump e as eleições americanas são, entretanto, patéticas. Fazem recordar aquele jornal francês que terá acompanhado o regresso de Napoleão do seu primeiro exílio em Elba nos seguintes termos. Primeiro: O Ogre fugiu da ilha de Elba. Depois: O ditador desembarcou em terras francesas. Mais tarde: Napoleão avança em direção a Paris. E finalmente. Sua Majestade Imperial entrou triunfalmente no Palácio das Tulherias.