Dediquei-me, nos dias posteriores, a aplaudir a resiliência desta equipa de projeto sobrevivente à depauperação de técnicos e gabinetes de projeto a que o Estado foi sendo sujeito ao longo dos anos. Mas estava a ser enganado. Não havia equipa. Se parece ser verdade que quem assina o projeto é um técnico da DGPC, a própria instituição, alegando “falta de recursos internos”, contratou, por ajuste direto, uma empresa privada para “apoio na elaboração do projeto de arquitetura”. Ou seja, fugiu ao concurso público de conceção a que a lei obriga.
Infelizmente, a fuga ao concurso é a regra e, perante o insuficiente escrutínio público e do Tribunal de Contas, só nos resta o escárnio sobre o anedotário. Alguém ouviu falar das 20 contratações entre estudos, projetos e levantamentos para o Mercado do Bolhão, fracionadas de modo a não atingirem os 75 mil euros (limite para o ajuste direto), superiores, em valor somado, a 850 mil euros? Alguém foi confirmar se o projeto do campus da Universidade Nova, tão elogiado pelo Presidente da República, foi a concurso público, como se escreve?
Até 10 de outubro está em discussão pública uma nova revisão do Código da Contratação Pública. Apesar de ir, a meu ver, no bom sentido – assim que expurgada de alguns disparates, como a possibilidade de haver júris de um indivíduo –, esta alteração não irá mexer no que é estrutural. No que faz com que, a partir de 2008, o concurso público de conceção tenha passado a ser raríssimo. Como não creio que a maioria dos decisores públicos sejam corruptos ou tenham arquitetos de eleição a quem queiram adjudicar trabalhos, entendo que o problema estrutural está no facto de ser muito mais simples e rápido fazer um ajuste direto a uma empresa do que padecer dos longos e intrincados processos de concursamento. A chave do problema está na inversão deste paradigma. Importa tornar mais complexa e fiscalizável a decisão de contratar sem concurso e mais céleres todos os procedimentos de concursamento.
Escreve à segunda-feira