11 de setembro. Super heróis sem capa

11 de setembro. Super heróis sem capa


Mantiveram a calma no meio do caos e vestiram a pele de líderes quando ninguém lhes pedira que o fizessem. Deram a vida por outros e ajudaram a tornar um dia negro mais claro para alguém


Os anos vão passando e aquele dia de terror, que a maioria de nós viveu através de um ecrã, vai-se transformando, aos poucos, em História. E hoje, ao recordarmos as imagens das torres gémeas em colapso, rapidamente refletimos no que mudou a partir daí, nos Estados Unidos e no mundo. Mas não devemos esquecer-nos do número chocante e perturbador de mortes e feridos. Do número de filhos que ficaram sem pais e do número de pais que ficaram sem filhos.

Ao longo dos primeiros meses que se seguiram ao 11 de setembro de 2001, fomos ouvindo relatos de pessoas que sobreviveram, porque alguém as ajudou a escapar do perigo, alguém lhes deu a mão, no meio do caos e do fumo. Pessoas anónimas, trabalhadores normais, bombeiros ou soldados. Numa tragédia desta magnitude, que vitimou perto de três mil pessoas, muitos foram os desconhecidos que, em momentos de heroísmo puro ou através de simples atos de bom senso, contribuíram para que o dia do pior ataque terrorista da história dos EUA, fosse um pouco menos negro para quem sobreviveu para contar a sua história.

Welles Crowther tinha 24 anos quando se deu o ataque ao World Trade Center. Trabalhava numa empresa com ligações à bolsa, situada no 104º andar da torre sul. Quando o primeiro avião atingiu a torre norte, ligou à mãe e disse, muito calmamente, que estava tudo bem. Minutos mais tarde, quando o segundo avião se despenhou contra a torre onde estava, Crowther vestiu a pele de herói.

Na adolescência tinha servido como bombeiro voluntário e, no meio do caos, o instinto disse-lhe que tinha de levar o máximo de pessoas que conseguisse para fora do prédio. Desceu, então, até ao 78º andar, onde, com voz autoritária, liderou um plano de fuga, ajudando os feridos e desorientados a descer as escadas que os levariam até ao solo. “É o meu anjo da guarda”, partilhou Ling Young com a CNN. “Se não fosse ele, tínhamos ficado sentados, à espera que o prédio viesse abaixo”, confessou. Crowther carregou Young às costas pelas escadas e é o grande responsável por esta ter sobrevivido para dar o seu testemunho. Calcula-se que Crowther tenha ajudado outras 11 pessoas a escapar. O seu corpo foi encontrado, mais tarde nos escombros da torre sul.

E porque é comum os heróis virarem mito, também a personagem de Welles Crowther tomou esse rumo. Fico conhecido como “o homem do lenço vermelho”. Isto porque, no meio do fumo e do barulho, aqueles que sobreviveram não lhe viram cara, apenas uma “figura alta” que usava um lenço vermelho a cobrir o rosto.

Já Mark Bingham, de 31 anos, estava sentado em primeira classe no voo 93 da United Airlines, vindo de São Francisco, quando um grupo de quatro terroristas invadiu o cockpit e sequestrou o avião, com a intenção de o despenharem contra o Capitólio, em Washington. No mesmo avião seguiam Tom Burnett, Jeremy Glick e Todd Beamer, todos eles, até esse dia, ilustres desconhecidos.

“Tom, eles estão a sequestrar aviões e despenhá-los contra alvos designados”, avisou Deena Burnett, num relato assustador, feito através de uma chamada telefónica para o marido que se encontrava a bordo. “Já atingiriam as torres do WTC”, informou, em pânico. Glick, Beamer e Bingham tiveram telefonemas semelhantes. Depois de uma votação entre os passageiros, estes ‘quatro magníficos’ decidiram ripostar contra os terroristas e evitar que aquele avião servisse também como arma de destruição.

A caixa negra recuperada do avião confirmou a rebelião a bordo. No meio da confusão, os terroristas acabaram por perder o controlo da aeronave, que se despenhou em Shanksville, na Pensilvânia, evitando o seu alvo inicial.
Rick Rescorla era já um herói de guerra e contava com uma estrela pelos seus serviços na guerra do Vietname. Nos tempos do exército era conhecido por cantar, como forma de encorajar os seus companheiros. No dia 11 de setembro de 2001, contava com 62 anos e trabalhava como chefe de segurança numa empresa com sede na torre sul do World Trade Center. Quando um avião atingiu a torre norte, Rescorla recebeu ordens para manter os empregados da empresa nas suas secretárias. 

“Vão se lixar, seus filhos da mãe!”, foi a resposta que deu, segundo um amigo, Daniel Hill, citado pelo “San Diego Source”, que falou com Rescorla ao telefone nessa manhã. É que o veterano de guerra já tinha avisado a administração de que as torres tinham sério problemas de segurança.

Rescorla ordenou imediatamente a evacuação da torre sul, como tantas vezes tinha feito em simulações. Enquanto ordenava aos empregados que saíssem, cantava para o ar, tal como fazia nos pântanos do Vietname.

Segundo o jornal “The New Yorker”, para além do amigo Hill, também a mulher de Rescorla recebeu uma chamada sua. “Não chores”, pediu-lhe. “Se me acontecer alguma coisa, quero que saibas que nunca fui tão feliz”. Mas lembrou: “Agora tenho de tirar estas pessoas daqui em segurança”.

Rick Rescorla foi responsável pela evacuação de 2700 pessoas nessa manhã. O seu corpo nunca foi encontrado.