O cheiro sentia-se no ar. A coisa ia sendo disfarçada pelo discurso oficial – tire-se o chapéu ao mestre Santos, sempre fiel ao pragmatismo que já o colocou nos píncaros do futebol português –, mas bastava medir o pulso ao povo em geral: todos viam Portugal a atropelar a Suíça, a Bélgica, Itália e mais viessem! Às vezes, faz falta o tal banho de humildade, e esse chegou ontem pelas mãos cruéis dos suíços, que tantos dissabores nos têm provocado ao longo das décadas. Agora, Fernando Santos já sabe o que é perder um jogo enquanto selecionador de Portugal – nada agradável, decerto. Mas, de um modo estranho e até perverso, este desfecho até pode ser positivo: afinal de contas, foi a perder que a mui nobre equipa lusitana iniciou a caminhada rumo ao Europeu de França. E todos sabemos no que deu…
E aquele penálti? Nada, siga! Os primeiros 20 minutos pareciam estar a colocar-nos perante novo embate entre Portugal e Gibraltar, tamanho o domínio e o volume atacante que os comandados de Fernando Santos imprimiram ao jogo. Faltou, como falta quase sempre, aliar a eficácia ao domínio territorial e ao número de oportunidades criadas. Servido por João Moutinho, Éder teve a primeira tentativa de remate à baliza de Sommer – saiu torto, muito torto, como viria a sair quase tudo o resto à seleção portuguesa. Na jogada seguinte, um remate à meia volta de Bernardo Silva podia ter entrado. Devia, até. Mas saiu à figura – salvou-se a fotografia.
O primeiro grande momento do jogo, porém, ainda estava para chegar. Ok, não foi um grande momento – pelo menos para o árbitro, o nuestro hermano Mateu Lahoz, que desvalorizou por completo um chutão de Lichtsteiner que saiu direitinho à mão direita (bem aberta) do colega Djourou. Lahoz viu – era impossível não ver: penálti mais claro era difícil. Mas mandou seguir. Pronto, seja feita a sua vontade: siga.
Chegou a hora da soneca Depois de mais um par de ataques portugueses sem quaisquer efeitos práticos, os suíços começaram a sair da casca. Aos 13’, dois cortes na raça de Raphael Guerreiro evitaram males maiores. Quatro minutos depois, Ricardo Rodríguez deixou mais um aviso: a sorte é que o bombardeiro do Wolfsburgo não tem pé direito.
Por outro lado – literalmente –, o esquerdo é demolidor. Como foi aos 24’, quando mandou um balázio com o nome de Rui Patrício lá escrito. O guarda-redes do Sporting reagiu como pôde ao efeito caprichoso que a bola tomou pelo caminho, mas foi impotente para travar o mergulho fulgurante de Embolo rumo ao golo. Culpas, muitas, para os defensores portugueses, que ficaram a dormir, especados como árvores de raiz profunda.
Como voltou a acontecer aos 30’ – já depois de José Fonte ter feito um corte impressionante. O contra-ataque da Suíça foi bem executado, e de forma rápida, mas nem isso serve de atenuante, pois Portugal tinha na área jogadores em número suficiente para impedir novo tiro no porta-aviões. Mais uma vez, porém, demoraram bastante a reagir, e mais uma vez os frios suíços não perdoaram. No caso, por Mehmedi, que havia iniciado o ataque e teve depois todo o tempo do mundo para o concluir.
Apenas dois remates Veio a segunda parte, mas o filme até podia ter acabado ao intervalo, pois nada de novo aconteceu em 45 minutos. Portugal rematou, rematou, rematou… e depois, continuou a rematar. Ao todo, foram 27 remates portugueses – 18 dos quais na fase decisiva da partida. Desses 18, porém, o caro leitor adivinha quantos foram na direção da baliza? Nós respondemos: dois. Dois remates apenas a assustar Sommer: um cabeceamento de Nani ao poste, após cruzamento perfeito de Quaresma, e um livre lateral de Raphael Guerreiro fortíssimo, mas direitinho ao guardião suíço. Com perigo, mas torto ou intercetado, outras duas tentativas de Bernardo e um tiro de ressaca de Fonte. Há muito para melhorar; caso contrário, lá teremos de sacar outra vez da velha máquina de calcular…