Segunda é dia de ter atenção à direita

Segunda é dia de ter atenção à direita


A primeira peça do projeto “Sete Anos Sete Peças”, de Cláudia Dias, tem hoje estreia nacional no Alkantara Festival


Nunca se sabe de onde pode vir o próximo soco mas se Cláudia Dias nos diz para estarmos atentos à direita vamos confiar,  se alguém anda nisto há um ano vai saber mais do que nós de certeza. Mas olhemos em frente antes, à confiança, que é no palco que está o ringue em que ela se bate contra Jaime Neves, pugilista de verdade, mestre que a bailarina e coreógrafa trouxe para o espetáculo. Porque isto é boxe, senhores, mas no teatro, para ver entre hoje e domingo no Maria Matos, em Lisboa, com o título “Segunda-feira: Atenção à Direita”. Segunda-feira porque é a primeira das sete peças que integram o projeto “Sete Anos Sete Peças”, que Cláudia Dias vai desenvolver ao longo dos próximos anos em colaboração com sete artistas.

De qualquer das formas um combate é sempre um combate e Cláudia e Jaime vão mesmo “dar e levar na boca”, é o que se diz, “literal e metaforicamente”, porque também eles pertencem a esta sociedade que com dificuldade se vai levantando agora mas que já foi muito ao tapete, demasiado. Era aliás no tapete, bem no tapete, que estava em 2011 quando começou a ser delineado este projeto de longo prazo, que tem o apoio do Alkantara Festival, a decorrer até 11 de junho em Lisboa, nesta e nas próximas edições.

“Estávamos a viver uma situação social, politica e económica complicada, ainda estamos mas foi quando isso se começou a sentir de forma mais violenta”, conta Cláudia Dias que recorda uma “ideia generalidaza de ausência de futuro”, de que o futuro apenas poderia ser construído ano a ano, sem grandes expectativas, sobretudo o dos artistas. “Comecei este projeto para contrariar essa ideia, sobretudo a sua inevitabilidade. Ou seja, nós estando no Sul da Europa num país periférico e com alguns problemas temos tanto direito a construir futuros como um cidadão de um país economicamente forte.”

A primeira destas sete partes, cada uma correspondente a um dia da semana, que foi já apresentada em Munique e tem hoje estreia nacional, começou então a ser pensada no ano passado, numa colaboração com o escritor, poeta e curador Pablo Fidalgo Lareo, o primeiro artista convidado, com quem Cláudia Dias teve um primeiro encontro tudo menos pacífico. “Foi uma verdadeira luta, não foi um encontro em consenso, e isso também é uma ideia que este projeto visa rebater: não temos que estar sempre em consenso, os consensos muitas vezes são imobilistas, é possível edificar coisas em conjunto mesmo em desacordo e sem as pessoas prescindirem de quem são.”

Daí a decidir fazer disso um combate de boxe inspirado em Foreman vs. Ali em 1974, ano tudo menos irrelevante num espetáculo que é afinal político, foi só um passo. “Segunda-feira: Atenção à Direita” é então um combate com 12 rounds de três minutos, pode dizer-se, Cláudia vs. Jaime com Pablo sentado à mesa do júri a ler perguntas. 220 perguntas, mais concretamente, nenhuma delas com resposta. Essa parte fica parao público – ou então para “quem de direito”, como se diz.

Fica a esperança, e a promessa, de que entre o sangue, o suor e as lágrimas do costume se faça luz algures, “como nas fábulas esclarecidas”. O que se quer é finais felizes.