Portugal começou a receber fundos europeus há mais de 30 anos, ainda antes de aderir à então CEE, em 1986, como forma de acelerar a convergência com os países mais prósperos da Comunidade. Nos primeiros anos, é evidente que estes fundos foram de uma extrema utilidade, bastando lembrar que a mais importante autoestrada do país, de Lisboa ao Porto, só ficou concluída em 1991, substituindo uma estrada nacional que estava completamente entupida e que era um óbvio travão ao desenvolvimento.
No entanto, após os investimentos mais necessários começaram as despesas em obras de utilidade cada vez mais duvidosa, que já nem sequer se devem apelidar de investimentos, tal o seu despropósito. O mais claro sinal de que os fundos europeus têm sido aplicados de forma extremamente errada reside no facto de, há cerca de década e meia, o país ter deixado de convergir com a UE, quando esse era o principal objetivo desta ajuda.
Os erros na utilização destes fundos residem, em parte, na atitude do país e também na forma como eles são atribuídos pela UE. Em termos nacionais, instalou-se a ideia de que os fundos são europeus e que se deve “sacar” o mais possível.
Em primeiro lugar, convém relembrar que cerca de metade destes fundos equivalem às contribuições portuguesas, pelo que não devem ser encarados como maná caído do céu, antes como contendo uma elevada participação nacional.
Em segundo lugar, “sacar” o máximo pode ser um erro calamitoso, porque se as despesas de manutenção destes “investimentos” forem superiores aos benefícios correntes, é preferível nem sequer gastar estes fundos.
Em terceiro lugar, os fundos criaram uma indústria de pura parasitagem que beneficia quem conhece as regras e as pessoas certas, devendo também envolver uma dose inevitável de corrupção. Isto é o cúmulo da atividade extrativa, que caracteriza as sociedades que têm pouco sucesso. Aliás, é incrivelmente irónico que fundos que deveriam promover o desenvolvimento em vez disso promovam atividades que são o oposto do que é necessário ao desenvolvimento.
Finalmente, há também as regras europeias, que exigem que os fundos sejam utilizados num conjunto muito particular de atividades, limitando fortemente a subsidiariedade de serem as autoridades mais próximas dos problemas a conhecer e decidir melhor onde se devem gastar estes apoios.
Para além do desastre económico que estes fundos europeus se têm revelado, temos de lhe acrescentar o grave problema político que também criaram, já que também têm servido para emudecer a democracia. Dado que o governo em funções tem, apesar de tudo, alguma discricionariedade para atribuir os fundos entre as várias candidaturas, há muitos indivíduos e instituições que silenciam as suas críticas, com medo de perder acesso a esta benesse. Para desgraça nacional, estamos de volta à “compra” de votos, tão comum no século xix, que limita o escrutínio imprescindível a uma democracia saudável.
Por tudo isto, retomo uma proposta que já venho fazendo há anos. Deveríamos negociar com a UE receber menos, digamos, 20% dos fundos europeus a que temos direito mas, em contrapartida, passaríamos a ter liberdade para os gastar. Poderíamos baixar o IRC para atrair investimento estrangeiro ou baixar a TSU das empresas, mas melhorar a competitividade ou, simplesmente, baixar o défice público. A probabilidade de esta proposta ser aceite é nula, mas sempre serviria para chocar a UE e evidenciar a necessidade de rever as regras de atribuição destes fundos.