As mentiras  dos Espírito Santo que os Papéis do Panamá revelaram

As mentiras dos Espírito Santo que os Papéis do Panamá revelaram


Declarações de José Manuel Espírito Santo e Ricardo Salgado no parlamento, em 2014, são contrariadas pelos Papéis do Panamá 


A sociedade E. S. Enterprises, considerada o “saco azul” do Grupo Espírito Santo, foi criada em 1993, com o conhecimento de todos os membros do Conselho Superior, e não tinha como objetivo, ao contrário do que disse Ricardo Salgado na comissão parlamentar de Inquérito, a “prestação de serviços à área financeira”. Era, segundo noticiado este fim de semana pelo “Expresso” e pela TVI, uma plataforma para entregar dinheiro e património de forma camuflada a diversos agentes, até agora desconhecidos. Desde a sua criação, passaram pela E. S. Enterprises – empresa que nunca constou nos relatórios e contas do Grupo Espírito Santo – mais de 300 milhões de euros.

Todas estas informações constam da vasta documentação analisada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI), onde existem cerca de uma centena de documentos sobre esta empresa. Outra das revelações é o facto de a E. S. Enterprises ter como presidente Ricardo Salgado e como vice-presidente José Manuel Espírito Santo. 

Escondida mais de 20 anos Durante mais de duas décadas, o Grupo Espírito Santo conseguiu esconder de tudo e todos a E.S. Enterprises, que o Ministério Público suspeita agora ter sido o “saco azul” do GES. 
Escondeu a empresa e escondeu um emaranhado de outras 300 sociedades offshore por onde terá passado muito dinheiro e propriedades. 

O objetivo? Segundo a TVI e o “Expresso” – parceiros portugueses do CIJI –, o uso destas empresas-fachada pretendia dificultar a compreensão sobre quem detinha o quê e com quem.

Como e onde foi criado O “saco azul” do GES foi criado em 1993 com recurso a uma offshore sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, a Trident Trust Company. A sua ligação à Mossack começa muitos anos mais tarde, em 2007. Foi nesse ano que se decidiu mudar a gestão fiduciária da Enterprises para a sociedade de advogados fundada por Jürgen Mossack e Ramón Fonseca. A alteração obrigou a que toda a documentação da empresa, desde a sua fundação, migrasse para o Panamá, constando agora dos registos a que o consórcio teve acesso.
As trocas de emails e as atas encontradas nos mais de 11 milhões de documentos revelam algumas contradições em relação ao que Ricardo Salgado e José Manuel Espírito Santo disseram, no final de 2014, na comissão parlamentar de inquérito. No acervo constam documentos com assinaturas de todos os membros do Conselho Superior.

As duas contradições Apesar de constar como vice-presidente da E. S. Enterprises nos Papéis do Panamá, José Manuel Espírito Santo disse em 2014, no parlamento, desconhecer esta empresa, alegando que o conhecimento que tinha era do que tinha saído na comunicação social.

Contactado nos últimos dias pela TVI e pelo “Expresso”, reforçou: “A memória e o conhecimento que tinha quando fui ouvido na Assembleia da República são os mesmos que tenho hoje, ou seja, trata-se de uma entidade da qual nada sei.”

Mas as contradições também apanharam Ricardo Salgado, que perante os deputados apresentou a E. S. Enterprises como uma empresa criada para “regularização dos serviços partilhados do grupo” e para “prestação de serviços à área financeira”.

Esta investigação jornalística descobriu, porém, que a E. S. Enterprises era, na verdade, detentora de várias offshores que, por sua vez, detinham outras offshores – um esquema em pirâmide.

Uma das sociedades citadas no trabalho da TVI e do “Expresso” é a Blygor Properties Inc., criada pela Mossack Fonseca por incumbência da Eurofin – sociedade do GES que também está na mira dos investigadores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal. Sobre a Eurofin recaem suspeitas de ter sido uma plataforma através da qual se facilitava a passagem de dinheiro do BES para elementos próximos da família.
Para exemplificar a complexidade da teia, o “Expresso” refere que a Blygor Properties detinha outra offshore, a Blygor KFT, que por sua vez detinha um projeto imobiliário na Hungria.

Outras das offshores detetadas neste esquema e relacionadas com o universo Espírito Santo foram a Polyreal S.A.L. e a Paison Holdings Limited.

Confrontado com todo este esquema e com o facto de a Enterprises ser muito mais que uma mera prestadora de serviços, Salgado não quis prestar quaisquer declarações, resguardando-se no segredo de justiça que cobre as investigações ao universo Espírito Santo.

300 offshores ligadas ao GES Nos registos dos 40 anos de existência da Mossack Fonseca há referências à criação de mais de 300 sociedades offshore ligadas ao Grupo Espírito Santo. A sociedade, refere o consórcio de jornalistas, foi eleita nos anos 80 pelo grupo português para criar e redomiciliar empresas de fachada.
Grande parte das sociedades criadas teria como principal objetivo dificultar qualquer possível investigação sobre quem tinha o quê e quem recebia o quê de quem.

Segundo o “Expresso”, para criar estas offshores em vários paraísos fiscais. o Conselho Superior do GES recorreu a quatro estruturas fiduciárias que estavam na esfera do GES (a E. S. Services, a Gestar, a Eurofin e o Banque Privée E.S.) e a duas fora da esfera do grupo (a FTA Consulting e o escritório Ana Bruno e Associados). Terá sido nesta lógica, por exemplo, que nasceu a Escom.

Quanto ao “saco azul”, a E. S. Enterprises, foi sob a gestão da E. S. Services que este foi criado.
As outras offshores mais complexas ligadas ao universo Espírito Santo surgiram a pedido da Eurofin – sociedade que entretanto saiu da esfera do GES.

De todas, a sociedade fiduciária mais ativa era mesmo a Gestar. Segundo os documentos analisados pelo CIJI, só para esta a Mossack criou 250 offshores, das três centenas que estão relacionadas com o grupo.