Ateliê. Creche para cães já tem lista de espera

Ateliê. Creche para cães já tem lista de espera


Projeto nasceu há três anos. Empresa vai buscar os cães a casa dos donos e também é responsável pelo seu regresso ao fim do dia


“Está tudo louco?” e “Que ideia genial!” foram as duas reações antagónicas – ambas estridentes – que se fizeram ouvir na redação do i sobre este projeto. A balança pendeu, no entanto, para a segunda por uma razão muito simples: é que a maioria dos jornalistas que tem, teve ou apenas sabe o que significa ter um cão identificou-se de imediato com esta creche para cães, situada em Mem Martins.

Há cerca de três anos, Íris Lourenço, arquiteta, e Ricardo Rodrigues, técnico de audiovisual e multimédia – agora, ambos com 31 anos -, começaram a empresa que nos levou a trazê-los para estas páginas. “Começámos por fazer dog walking”, contam. Rapidamente sentiram necessidade de expandir o negócio porque, como donos de cães, sentiam na pele a dimensão da problemática de os deixar tanto tempo sozinhos em casa.

“Mesmo tendo cuidado, os cães acabam por ficar sozinhos oito horas por dia.” Resultado? Mau comportamento, problemas depressivos (sim, já aqui explicámos noutra ocasião que está cientificamente comprovado que os cães que passam muito tempo sozinhos podem desenvolver esta doença) e… donos com sentimentos de culpa.

Íris não concebia que a sua vida profissional fosse passada num escritório, Ricardo teve cães desde sempre, e decidiram, de forma natural, que este seria o caminho. Pesquisaram (com base nos negócios em outros países, visto que em Portugal é tão inédito que nem há legislação adequada a este modelo), fizeram formações de treino canino e procuraram, por fim, um espaço.

Há cerca de um ano que o Ateliê – ou seja, o infantário para cães – da Cãopreensão existe. O nome não é, propositadamente, creche, mas é exatamente disso que se trata. “Não é um hotel, não é um canil, como nos chegaram a dizer, é um sítio onde os cães diariamente interagem, brincam, descansam e chegam a casa cansados”, explicam Íris e Ricardo.

Mas vamos por partes, porque a descrição do Ateliê é demasiado boa para estar confinada a três linhas. Primeiro, são os donos da empresa que, de manhã, vão buscar a casa dos donos os “patudos”. “Todos os cães [obviamente, todos tratados pelo nome] moram em Lisboa. Fazemos as viagens consoante o sítio onde vivem para os recolhermos”, diz Ricardo. Ao fim do dia, dá-se o processo inverso. Para fazer parte da matilha, o critério principal é ser “zero agressivo”. Primeiro, os cães são avaliados na sua casa e, caso passem no teste, introduzidos no grupo. “A maioria dos novos membros, passado um ou dois dias, já estão à vontade”, contam. Há ainda outro pré-requisito: todos os animais têm de ser esterilizados.

Neste momento, há 30 “alunos” no Ateliê da Cãopreensão, a lotação máxima que o espaço permite receber. Cada cão tem ainda uma lancheira num saquinho onde leva a ração (e posteriormente pendurada num cabide com o nome de cada um) e há ainda um espaço fechado onde cada um descansa dentro de uma boxe, depois da brincadeira. Ao lado da “casa das sestas” há uma casa de banho com brita no chão. “Eles já sabem que é aqui o sítio da casa de banho. Às vezes há um ou outro que ainda faz na relva, mas no alpendre sabem que estão proibidos”, diz Íris. Resultado? Um jardim imaculado, fruto de muito cuidado com a higiene e também de cães ensinados. “Temos o dobro do cuidado com a higiene. E a maior prova disso é que esta também é a nossa casa”, explicam a sorrir. Apesar de ser um trabalho fantástico, “também é muito cansativo”, admitem.

No entanto, não há cansaço que impeça os planos de crescimento. Porquê crescer, quando a lotação está esgotada? A resposta é muito simples: os pedidos de inscrição não param. Se está a gostar da ideia e a pensar que é a solução ideal para o seu cão, saiba, portanto, que o processo pode não ser instantâneo. “Neste momento, temos cerca de 30 cães em lista de espera”, confidenciam. “O nosso sonho era ter um espaço em Lisboa onde os donos pudessem eles próprios deixar os cães e ir buscá-los, não estando assim tão restringidos nos horários.” A busca pelo espaço perfeito – que já encetaram no passado mas puseram em banho-maria devido às dificuldades que foram surgindo – poderá, portanto, ser retomada em breve. É que Íris e Ricardo sabem que os donos cada vez mais sentem e tratam os animais como membros da família. Aqui, a ideia é que o ambiente continue a ser familiar e a prova disso são as festas de anos e as fotografias “de família”, encenadas durante dias.

Pois, tanto cão junto deve ser uma barulheira desgraçada, pensará o leitor. No tempo em que durou a visita, pela saúde do i, se ouvimos três latidos foi muito. Incãopreensível? Nem por isso.