Sócrates perde processo contra Correio da Manhã

Sócrates perde processo contra Correio da Manhã


O Tribunal Cível de Lisboa absolveu 14 jornalistas do Correio da Manhã (incluindo quatro diretores), bem como a Cofina, proprietária do jornal, de uma queixa que lhes tinha sido movida por José Sócrates. Em causa estão diversas notícias publicadas entre o final de 2011 e meados de 2012, entre as quais as que expunham os…


Sócrates pedia uma indemnização de 250 mil euros, a título de danos não patrimoniais, queixando-se de violação do seu direito ao bom nome e reputação. Em sentença proferida na terça-feira, o juiz José António Rocha Capacete concluiu que os artigos publicados “ocorreram ao abrigo do direito fundamental de liberdade de expressão e do direito, também fundamental, de liberdade de imprensa”. Considerou ainda que Sócrates não conseguiu provar “que danos concretos” lhe causaram as notícias (que, nas suas palavras, foram fonte de “mágoa, tristeza, indignação e angústia”).

Entre as notícias em causa estavam as que referiam que “Sócrates gasta 15 mil euros por mês em Paris”. Mas também artigos relativos à licenciatura irregular do ex-primeiro-ministro na Universidade Independente e ainda reportagens sobre o julgamento do processo Face Oculta, em cujos factos surgia envolvido, por via do seu relacionamento com o arguido Armando Vara. Todos os factos noticiados nesses artigos do CM foram dados como provados pelo Tribunal, bem como o respetivo interesse público, além do facto evidente de Sócrates ser uma figura pública.

Não juntou recibos da renda apesar de intimado

Sobre as despesas em Paris, a sentença refere: “Foi o próprio autor (José Sócrates), em sede depoimento prestado na audiência, quem afirmou que gastava mensalmente na capital francesa, com o pagamento das propinas da faculdade que frequentava, em alimentação, em transportes e na renda da casa onde residia, uma quantia inferior a dois terços do montante referido (15 mil euros). Daí o tribunal concluir (…) que despendia em Paris, nas datas referidas, cerca de 10 mil euros mensais”.

O juiz salienta, a propósito, que, apesar de isso lhe ter sido ordenado, Sócrates “nunca apresentou cópia dos recibos de renda de casa e do contrato de arrendamento” do apartamento que habituou no 16º bairro de Paris, um dos mais caros da capital francesa.

Para fundamentar a decisão, o magistrado cita, ao longo de 117 páginas, juristas portugueses e, sobretudo, diversas decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que tem condenado Estados, incluindo Portugal, valorizando a liberdade de expressão. Uma jurisprudência que, salienta-se, os tribunais portugueses têm vindo a adotar.

O que diz a sentença

“O autor (José Sócrates) é uma figura pública absoluta, uma vez que desempenhou um papel determinante no decurso da história política portuguesa contemporânea e sobre ele tem recaído, mesmo depois de ter cessado funções como primeiro-ministro, um amplíssimo interesse público de informação, garantia de um acesso privilegiado aos meios de comunicação social.”

“O autor é uma figura pública permanente, pois, em virtude do papel que, enquanto PM, desempenhou na história política portuguesa contemporânea e das questões polémicas a que, como é público e notório, o seu nome surgiu associado perante a sociedade portuguesa (…) manteve sobre si os holofotes de uma intensa e permanente exposição pública.”

“O autor é uma figura pública voluntária, pois foi o próprio autor quem se lançou para a vulnerabilidade da opinião pública ao aceitar exercer e ao candidatar-se aos altos cargos públicos de natureza política que exerceu”.

“Esta notoriedade de que o autor é titular tem um custo correlativo que o mesmo não pode escamotear e que se traduz na sujeição da sua atividade enquanto homem público e politico à constante sindicância da comunidade, em geral, e dos órgãos de comunicação social, em particular”.

“É inderrogável o interesse em dar a conhecer aos cidadãos matérias com as quais estejam relacionadas relevantes figuras públicas e políticas, nomeadamente quando se tratam de matérias polémicas e controversas”.

“O autor é um alvo de enorme interesse público, sujeito, portanto, ao permanente escrutínio da opinião publica, ao comentário e à investigação jornalística”.