Nota prévia: de todas as que houve, esta é a campanha presidencial que reúne o naipe de candidatos mais desinteressante, havendo alguns patéticos e até patetas. Essa circunstância não dignifica o regime republicano, antes pelo contrário. Um dos primeiros trabalhos do próximo PR terá de ser a recuperação da imagem da República, que muitos portugueses associam a bandalheira.
Henrique Neto: Como outros, vem do espaço PS. Limita-se a falar do que sabe, o que evita disparates. Foi duro nos debates e é resiliente. Todos o respeitam não só por ser o mais velho e um empresário de sucesso, mas também por ter passado antifascista. Não tem manifestamente hipóteses de eleição, mas valorizou a corrida. Expectativa: 3,5%.
Sampaio da Nóvoa: Temia-se que fosse um “Sampaio II”, tal a complicação inicial dos seus discursos, mas melhorou e ficou mais assertivo à medida que a campanha avançou. Mesmo assim, ainda usa expressões evangélicas do tipo “tempo novo”. Tenta chegar transversalmente ao eleitorado da esquerda, apesar de não ter passado político ativo. Os contributos dos ex-Presidentes não parecem compensar a falta do PS. Não ganhou o debate com Marcelo, mas superou Maria de Belém, tendo condições para ficar à frente desta. Se houvesse segunda volta e passasse, daria luta a Marcelo, até porque aí o PS apareceria em força. Expectativa: 16%.
Cândido Ferreira: Praticamente ninguém o conhecia fora de Leiria. Fez uns números à Garcia Pereira, dando que falar. Porém, os ganhos instantâneos foram engolidos pela ausência em debates onde poderia ter marcado pontos, dada a sua condição de médico prestigiado. Refugia-se em afirmações de falsa modéstia do tipo “houve um grupo que me incitou a avançar”. Tem passado político no PS e no MDP. Expectativa: 0,3%.
Edgar Silva: Um fracasso. Errático, hesitante e baralhado. Tenta combater algum défice de reconhecimento dentro do próprio PCP com excessos de zelo, o que se percebe num comunista-católico praticante das duas coisas. Nunca daria um Presidente e também não é para isso que corre. Conta quando muito com o núcleo mais duro dos votantes do PCP. Expectativa: 5%.
Jorge Sequeira: Um Tino com curso superior. Faz lembrar Jerry Lewis, em parte pelo aspeto e também por não ter graça nenhuma. Expectativa: 0,1%.
Vitorino Silva: Um desatino! Faz lembrar o célebre “touxim”, mas sem ovelhas. Perdeu a espontaneidade. Tem como qualidade o facto de não andar só a dizer mal dos outros candidatos. Boa alternativa ao voto branco ou nulo. Expectativa: 1%.
Marisa Matias: Preenche todos os requisitos do Bloco e da extrema-esquerda civilizada e urbana. É mulher. É interessante e inteligente. É ativista de causas. Conhece as matérias. Muito ideológica, é uma candidata de fação. No entanto, sabe perfeitamente distinguir a função de PR da condição estritamente partidária em que se apresenta. Expectativa: 5%.
Maria de Belém: Caiu no ridículo com propostas como a de levar convidados estrangeiros a ir comer a lares de idosos. Sofreu alguns ataques corrosivos e justificados à sua autoproclamada superioridade política e ética. Não entusiasma ninguém e irrita um santo quando usa a insinuação como arma. Com Sampaio da Nóvoa, chegou ao ponto de ir buscar críticas do catedrático ao falecido Mariano Gago. Inaceitável! Saiu–se mal porque Nóvoa ignorou o golpe baixo. Procura agradar à direita católica para assegurar ali os votos que perde no PS. A campanha no terreno não parece estar a resultar. Tem um apoio enorme: Jorge Coelho. Expectativa: 12%.
Marcelo Rebelo de Sousa: Um dos poucos portugueses, com Amália e Eusébio, conhecidos pelo nome próprio, o que diz tudo sobre a sua enorme popularidade. Ganhou os debates com Sampaio e Belém. É claramente o candidato que tem a noção correta do que é ser Presidente. Todavia, optou por uma ativíssima campanha baseada no afeto, retirando parte da dimensão simbólica de Estado à função de PR, o que não é bom para o regime. Se os afetos fossem essenciais em eleições, Cavaco nunca teria obtido quatro maiorias absolutas. A abstenção e o facto de ter nove adversários a correr contra ele são o grande obstáculo. Se não conseguisse ser eleito à primeira volta, ainda teria hipóteses na segunda. Expectativa: 52,5%.
Paulo Morais: Candidatura “monotemática” de combate à corrupção. É verdade que se trata de uma praga enorme. Mas é péssimo meter tudo no mesmo saco, lançando a suspeição generalizada. Este professor universitário daria um excelente procurador-
-geral da República, se houvesse eleições para o cargo. Expectativa: 1,5%.
Abstenção previsível: Entre 49% e 56%. Brancos e nulos: cerca de 3%. Assim sendo, prevê-se que não haverá segunda volta e que Marcelo Rebelo de Sousa será eleito dia 24 com uma margem simpática.
Método utilizado: conversas em transportes públicos, supermercados, filas das Finanças, do IEFP, da Segurança Social, lugares de fruta, mercearias do Bangladesh, tascas, restaurantes de classe média, um taxista, um barbeiro, Estádio da Luz e rulotes adjacentes, debates, entrevistas, painéis televisivos (142, pelo menos), “opinadores” de imprensa e… o próprio.
Jornalista