Desejo de Ano Novo: que o Governo comece a governar


Costa sabe que a maioria que apoia o seu governo tem a estabilidade de um castelo de cartas e a credibilidade do congresso de Vilar de Perdizes


Ao longo dos últimos meses, talvez anos, as esquerdas intoxicaram o espaço político com o seu pobre pensamento mágico. Com António Costa no poder, e as esquerdas radicais a acolitar o PS, a austeridade em Portugal desapareceria num abrir e fechar de olhos. A economia arrancaria com pujança de um mustang. E o país daria um salto social, até civilizacional, apenas e só por ter a(s) esquerda(s) em São Bento. A fuga para esta lengalenga do pensamento mágico que, de resto, os eleitores não compraram em Portugal, em Espanha, ou no Reino Unido, é sintomática da decadência acelerada dos partidos da família socialista europeia. Reflete uma incapacidade para se reformarem programaticamente e para apresentarem alternativas de governo que compatibilizem a estabilidade das contas públicas, a defesa do Estado Social e a competitividade no espaço da globalização. Mesmo assim, num arranjo que quebrou todas as tradições democráticas e tentou subverter o primado da legitimidade política, num acordo sobre o qual a história ainda está por ser escrita, as esquerdas entenderam que tinham um direito natural de governar. De abrir “um tempo novo”, de “virar a página” e “derrotar a direita neoliberal” (coisa que nunca existiu), para recorrer a expressões da liturgia oficial de Costa, Catarina e Jerónimo. Para inaugurar este “tempo novo”, o líder da coligação social/comunista António Costa garantiu ao país ter uma “maioria de esquerda” que acontece, por alinhamento cósmico, ser “estável, duradoura e credível”. Dito por outras palavras, uma maioria autossuficiente. Com um mês de vida, provou-se que a maioria de esquerda não existe. Obviamente, não fui eleitor nem de Costa nem de nenhum dos partidos à esquerda. Mas como português, sinto-me defraudado por tão periclitante início de ciclo governativo. No lugar de novas políticas a olhar para o futuro, aparecem velhas políticas que nos querem levar de regresso a 2011. No lugar da audácia reformista mora um espírito reacionário. A página está a ser virada, de facto, mas para trás e não para a frente. Quando se esperava determinação na ação política do governo, frescura nas propostas e vigor na sua execução, o que temos assistido é a uma incapacidade preocupante de decidir. Costa tinha prometido melhor do que isto, um governo mais preocupado com a sua própria existência do que com o país. 

Há sempre uma desculpa para nada fazer, ou para fazer diferente daquilo que é prometido aos portugueses. Suspeito que no meio de tanta negociação com esquerda radical, o programa do PS tenha ficado reduzido a duas orientações estratégicas: por um lado, tirar o cavalinho da chuva; por outro, passar as culpas – ao governo anterior, à Europa ou aos parceiros de coligação, conforme der mais jeito. 

Como governar é mais do conduzir a olhar pelo retrovisor, é muito mais do que deitar abaixo, não faltará muito até que Costa nos diga aquilo que sempre soube e que sempre escondeu: que tal como um mais um são dois, a sua geringonça não funciona. Pau que nasce torto, nunca se endireita. Costa sabe que a maioria que apoia o seu governo tem a estabilidade de um castelo de cartas e a credibilidade do congresso de Vilar de Perdizes. Ele só espera o melhor momento para se desfazer dos seus companheiros de viagem e criar outra crise política que origine eleições. Enquanto esse momento de admissão de disfuncionalidade da maioria de esquerda não chega, e ele chegará, porque se isto foi assim no primeiro retificativo imagine-se no próximo OE, Costa lá vai prometendo tudo a todos. Mais dinheiro para salários, outro tanto para pensões, corta-se um imposto aqui, reintroduz-se uma benesse acolá. As contas mostram que, no fim do dia, o virar de página de António Costa não passa de 1,8€ (um euro e oitenta) por mês nas pensões mais baixas. Viva o fim da austeridade, exclamam uns. É poucochinho, dirão outros. Pois, mas é a soma de poucochinhos para todos os gostos que aumenta o risco que Portugal seja de novo feito protetorado das instituições internacionais. Que Deus nos livre de tal destino.

Na minha lista de pedidos para 2016, tenho um desejo político: desejo que Costa governe, sem desculpas nem subterfúgios. Para que 2016 (e daí para a frente) possa ser mais do que um ano “poucochinho” para todos nós. E para que de 2017 em diante, não voltemos às agruras e sofrimentos que estávamos a deixar para trás. 

Escreve à quarta-feira


Desejo de Ano Novo: que o Governo comece a governar


Costa sabe que a maioria que apoia o seu governo tem a estabilidade de um castelo de cartas e a credibilidade do congresso de Vilar de Perdizes


Ao longo dos últimos meses, talvez anos, as esquerdas intoxicaram o espaço político com o seu pobre pensamento mágico. Com António Costa no poder, e as esquerdas radicais a acolitar o PS, a austeridade em Portugal desapareceria num abrir e fechar de olhos. A economia arrancaria com pujança de um mustang. E o país daria um salto social, até civilizacional, apenas e só por ter a(s) esquerda(s) em São Bento. A fuga para esta lengalenga do pensamento mágico que, de resto, os eleitores não compraram em Portugal, em Espanha, ou no Reino Unido, é sintomática da decadência acelerada dos partidos da família socialista europeia. Reflete uma incapacidade para se reformarem programaticamente e para apresentarem alternativas de governo que compatibilizem a estabilidade das contas públicas, a defesa do Estado Social e a competitividade no espaço da globalização. Mesmo assim, num arranjo que quebrou todas as tradições democráticas e tentou subverter o primado da legitimidade política, num acordo sobre o qual a história ainda está por ser escrita, as esquerdas entenderam que tinham um direito natural de governar. De abrir “um tempo novo”, de “virar a página” e “derrotar a direita neoliberal” (coisa que nunca existiu), para recorrer a expressões da liturgia oficial de Costa, Catarina e Jerónimo. Para inaugurar este “tempo novo”, o líder da coligação social/comunista António Costa garantiu ao país ter uma “maioria de esquerda” que acontece, por alinhamento cósmico, ser “estável, duradoura e credível”. Dito por outras palavras, uma maioria autossuficiente. Com um mês de vida, provou-se que a maioria de esquerda não existe. Obviamente, não fui eleitor nem de Costa nem de nenhum dos partidos à esquerda. Mas como português, sinto-me defraudado por tão periclitante início de ciclo governativo. No lugar de novas políticas a olhar para o futuro, aparecem velhas políticas que nos querem levar de regresso a 2011. No lugar da audácia reformista mora um espírito reacionário. A página está a ser virada, de facto, mas para trás e não para a frente. Quando se esperava determinação na ação política do governo, frescura nas propostas e vigor na sua execução, o que temos assistido é a uma incapacidade preocupante de decidir. Costa tinha prometido melhor do que isto, um governo mais preocupado com a sua própria existência do que com o país. 

Há sempre uma desculpa para nada fazer, ou para fazer diferente daquilo que é prometido aos portugueses. Suspeito que no meio de tanta negociação com esquerda radical, o programa do PS tenha ficado reduzido a duas orientações estratégicas: por um lado, tirar o cavalinho da chuva; por outro, passar as culpas – ao governo anterior, à Europa ou aos parceiros de coligação, conforme der mais jeito. 

Como governar é mais do conduzir a olhar pelo retrovisor, é muito mais do que deitar abaixo, não faltará muito até que Costa nos diga aquilo que sempre soube e que sempre escondeu: que tal como um mais um são dois, a sua geringonça não funciona. Pau que nasce torto, nunca se endireita. Costa sabe que a maioria que apoia o seu governo tem a estabilidade de um castelo de cartas e a credibilidade do congresso de Vilar de Perdizes. Ele só espera o melhor momento para se desfazer dos seus companheiros de viagem e criar outra crise política que origine eleições. Enquanto esse momento de admissão de disfuncionalidade da maioria de esquerda não chega, e ele chegará, porque se isto foi assim no primeiro retificativo imagine-se no próximo OE, Costa lá vai prometendo tudo a todos. Mais dinheiro para salários, outro tanto para pensões, corta-se um imposto aqui, reintroduz-se uma benesse acolá. As contas mostram que, no fim do dia, o virar de página de António Costa não passa de 1,8€ (um euro e oitenta) por mês nas pensões mais baixas. Viva o fim da austeridade, exclamam uns. É poucochinho, dirão outros. Pois, mas é a soma de poucochinhos para todos os gostos que aumenta o risco que Portugal seja de novo feito protetorado das instituições internacionais. Que Deus nos livre de tal destino.

Na minha lista de pedidos para 2016, tenho um desejo político: desejo que Costa governe, sem desculpas nem subterfúgios. Para que 2016 (e daí para a frente) possa ser mais do que um ano “poucochinho” para todos nós. E para que de 2017 em diante, não voltemos às agruras e sofrimentos que estávamos a deixar para trás. 

Escreve à quarta-feira