Passos Coelho teve de vir ontem a meio da tarde deixar um aviso a António Costa para acalmar as hostes do PSD. “Que não se fie nessa votação para achar que é assim que tem o apoio para governar”, disse o líder social-democrata para sossegar aqueles que não gostaram de vê-lo voltar a dar mão a Costa numa situação em que teria de enfrentar o chumbo anunciado do PCP e o provável voto contra do BE.
O líder social-democrata não quis que ficassem dúvidas sobre a forma como vai liderar a oposição a Costa. Passos quer manter uma posição responsável, mas não será uma muleta para a governação socialista.
Apesar de não ter havido vozes críticas na reunião da bancada feita ontem a meio da discussão do Orçamento Retificativo para decidir o sentido de voto do PSD, Passos Coelho sabe que a decisão que tomou não foi apoiada de forma unânime no partido. Mesmo que a oposição não tenha sido feita de forma clara, o desconforto era evidente.
Evitar o ónus do Banif A divisão à esquerda era vista por muitos no PSD como um momento a explorar depois de semanas a esgrimir o argumento político da “geringonça de esquerda” e da falta de legitimidade política do executivo do PS. Mas Passos não quis correr o risco de ficar com o ónus de fechar o Banif, ao chumbar o Orçamento Retificativo que permite as ajudas do Estado para concretizar a resolução do banco.
“Não vamos contribuir para a liquidação do banco que foi uma coisa que sempre quisemos evitar”, justificou o ex-primeiro-ministro, que percebeu que inviabilizar o plano de Costa e Centeno para o Banif tornaria ainda mais difícil de gerir um dossiê que já faz estragos no PSD e no CDS.
Para Passos, o mais importante é manter um perfil de oposição responsável, ao mesmo tempo que lança dúvidas não sobre o modelo de resolução, mas sobre os montantes envolvidos. “Não usamos matérias relacionadas com a estabilidade do sistema financeiro para fazer desforras politicas”, reforçou ontem, ao mesmo tempo que dizia haver ainda muito por esclarecer por parte de Costa e Centeno.
“Se temos dúvidas sobre este processo, e temos, elas devem ser esclarecidas na comissão de inquérito ou, como exigi pela voz do líder parlamentar do PSD, então, deve ser contratada uma auditoria externa independente para avaliar tudo o que se passou desde que houve capitalização em janeiro de 2013 até agora”, afirmou Passos Coelho.
A estratégia é deixar claro que o PSD não tem nada a esconder no caso, apesar de ser evidente do embaraço político com o tema do Banif.
Divórcio consumado A decisão do PSD de viabilizar o Orçamento Retificativo foi usada pelo CDS como uma forma de garantir distanciamento em relação ao antigo parceiro de coligação.
Os centristas querem marcar o seu espaço político e aproveitaram para tomar uma posição diferente, fazendo alarde disso nas redes sociais. “Depois de tudo o que aconteceu nos bancos portugueses, agora no Banif não podem voltar a ser os contribuintes chamados a responder, em primeiro lugar, a pagar o custo da salvação de mais um banco privado”, escrevia no Facebook o deputado do CDS João Almeida.
O centrista Michael Seufert também usava ontem a sua página para explicar a posição política do CDS: “Portas avisou em devido tempo: Se Costa não pôde negociar com os seus parceiros de geringonça – era difícil, conceda-se mas foi quem o próprio escolheu para a gloriosa tarefa dum governo de geringonça – já sabia que não contava com o CDS”.
Do lado do PSD, evita-se criticar abertamente a posição do partido de Paulo Portas, mas é notório algum desconforto. “A questão é: o CDS teria uma solução diferente se fosse governo?”, questiona um deputado social-democrata.
Passos Coelho, confrontado com o sentido de voto decidido por Portas, foi seco na resposta, mas evitou alimentar polémicas. “O CDS decidiu como entendeu e eu respeito essa decisão do CDS”, afirmou Passos, que está consciente de que nos próximos tempos a situação tem potencial para se repetir. “A coligação acabou”, como o próprio fez questão de anunciar no jantar de Natal do PSD há uma semana, e isso vai notar-se cada vez mais.