PCP. O sucessor de Jerónimo deve ser o próprio Jerónimo

PCP. O sucessor de Jerónimo deve ser o próprio Jerónimo


Os comunistas marcaram congresso para 2016 e o secretário-geral admite mudanças na direcção. Mas ele quer, e deve, continuar.


Ainda não será no próximo congresso do PCP, marcado no domingo para 3 e 4 de Dezembro de 2016, que a questão da sucessão do secretário-geral do PCP se deverá levantar. Ao contrário do que alguns dentro e fora do partido admitem, o sucessor de Jerónimo de Sousa poderá bem ser ele próprio.

“Dificilmente Jerónimo sairá no próximo congresso. Ele ficou muito fortalecido com este processo de governação à esquerda”, diz ao i o ex-dirigente do PCP Carlos Brito.

Na campanha eleitoral, o líder comunista “teve a capacidade de aliar a crítica severa ao PS com a disponibilidade para construir uma solução de governo”, explica Carlos Brito. E, à saída das eleições, Jerónimo foi claro e tempestivo “quando teve aquela frase certeira de que ‘oPS só não é governo se não quiser’”.

Jerónimo foi eleito para substituir Carlos Carvalhas em 2004. Se for reeleito para um quarto mandato, em Dezembro de 2016, estará quase a fazer 70 anos. Carlos Brito desvaloriza o handicap da idade. “Relevou algum cansaço na campanha mas ainda está robusto.” E Cunhal liderou o PCP até aos 79 anos.

Jerónimo não só pode ficar como quer ficar, dizem várias fontes comunistas ao i. “Ele não quer deixar a liderança mas há um movimento nesse sentido, com base na má prestação nas legislativas”, diz um ex-dirigente. O sucesso ou fracasso desse movimento será conhecido esta semana, quando se souber o nome que o PCP indica para o Conselho de Estado. “Se não for Jerónimo, o indicado será o futuro líder. Se for o Jerónimo, é porque ele ainda tem força suficiente para se manter”, argumenta a mesma fonte. O facto de o PCP sempre se ter feito representar pelo líder no Conselho de Estado é o pressuposto deste raciocínio.

Há quem tem tenha visto na entrevista ao “Expresso” um indício da disponibilidade do líder para sair. Os mais atentos à vida interna do PCP, porém, não concordam com essa conclusão. “Percebe-se que tem vontade de continuar”, diz um dirigente que o acompanhou muitos anos. Ao longo da entrevista, Jerónimo diz que o acordo que viabilizou um governo do PS “é um elemento que com certeza ficará registado na história”. Ou seja, é com ele que o PCP consegue um resultado histórico, que Cunhal teria validado e que é suportado pela maioria do partido, superando resistências internas.

Jerónimo repete que o “colectivo” pesou na decisão – “não olhem para mim como aquele que descobriu a pólvora”, chega a dizer – e vai buscar legitimidade a Cunhal (nessa época, diz Jerónimo, só não houve entendimento com o PS “porque o PS fez uma opção ao contrário”).

Nem todo o PCP deseja a continuidade do actual líder e “há quem tenha pressa” em substituí-lo para “não correr o risco de disputar eventuais legislativas antecipadas novamente com Jerónimo”, diz um observador atento da vida do PCP. Esta ala do PCP está porém a perder terreno. “A antecipação do congresso foi discutida mas não vingou”, sublinha a mesma fonte. Jerónimo, aliás, não poderia concordar: “Ficava a ideia de que o congresso tinha sido antecipado só para o despacharem mais cedo.” Ao “Expresso”, sobre esta questão, numa altura em que ainda não era conhecida a data, Jerónimo responde: “Eu não vejo razões para o antecipar. Ocomité central pode ver.” Não viu.

JERÓNIMO VAI TER ADJUNTO? A sucessão pode, ainda assim começar a desenhar-se em 2016, ainda com Jerónimo (que em Setembro disse ao i “estou aqui para as curvas”, mostrando a sua vontade de ficar), mas já com um sucessor apontado. Como aconteceu com Cunhal, que antes de sair escolheu Carvalhas para secretário-geral adjunto. Jerónimo parece indicá-lo quando diz na entrevista ao “Expresso” que no próximo congresso “pode haver alteração de responsabilidades” na liderança. Isto depois de deixar claro (“já respondi a isso de diversas formas”) que quer ficar líder.

OS DESAFIOS No ano que falta até ao congresso, Jerónimo terá pela frente o desafio inédito de gerir o apoio do PCP ao governo do PS. Carlos Brito antevê que “isso vai dar imensos problemas, por exemplo quando se tocar em direitos dos trabalhadores”, mas que Jerónimo está preparado.

Outro ex-dirigente do PCP considera que o grande desafio para Jerónimo é mesmo “a sua continuidade como líder”, algo que pode ter implicações não só para o PCP mas também para a vida política do país. “Um novo líder pode querer afirmar-se liderando a ruptura, como também Jerónimo pode querer aguentar-se conduzindo a ruptura”, explica.

Com A.S.L.