A pressa de António Costa e o tempo de Cavaco Silva


O PR é o último reduto de estabilidade. Decidirá quando quiser e como quiser, sempre dentro do perímetro constitucional


“Qual é a pressa?” Tal como António José Seguro, quando António Costa lhe exigiu um congresso extraordinário para assaltar o PS, também agora há dificuldade em entender a pressa de Costa. Teve pressa para trair Seguro. Teve pressa para condenar o país à espiral recessiva e pressa para pedir eleições antecipadas. Tinha pressa para que a anunciada maioria socialista não lhe escapasse, como escapou. Derrotado, Costa achou que era uma perda de tempo (lá está a pressa) o Presidente da República cumprir a Constituição, dando posse à coligação. Costa, sempre em excesso de velocidade para chegar ao poder, tem pressionado o PR para que decida. E não só exige isso – mais um profundo desrespeito institucional – como espera que o faça em favor da sua causa, para a qual já convidou ministros. Costa, que até é autor de profícua sabedoria popular – “quem ganha por poucochinho é capaz de poucochinho” –, devia saber que “a pressa, nos desejos, é tardança”. 

A situação política é suficientemente delicada para se tomarem decisões apressadas. Pervertendo práticas constitucionais e regras democráticas com mais de 40 anos, o PS é o (ir)responsável por este teste de stresse ao sistema. O PR é o último reduto de estabilidade. O PR decidirá quando quiser e como quiser, sempre dentro do perímetro constitucional. 

Em cima da mesa, o PR deverá ter três cenários: (1) um governo em gestão até posse do próximo Presidente; (2) indigita António Costa; (3) pede a Costa que lhe traga um acordo digno desse nome. O cenário (1) cumpre-se se Cavaco acreditar que um governo de gestão é melhor do que um governo ingerível do PS. A solução, como lembrou o PR, não é inédita. Mais: nenhuma solução de governo é auto–suficiente no parlamento e Costa, ao contrário do que vende, não mudou a natureza minoritária do PS. Conseguiu dar-lhe uma circunstancial máscara de maioria. Mas quando for testada pela realidade – e o próximo dia 27, com os diplomas agendados pelo PCP e BE, será esclarecedor –, quando não houver despesa para aumentar ou impostos para descer, quando o fardo da governação pesar e a máscara dessa maioria cair, o que sobra será um governo com apoio parlamentar mais reduzido do que aquele de que hoje goza, sozinho, o maior partido da coligação. Quanto a (2), é viável caso o PR acredite que o custo de indigitar Costa é menor do que o custo de não ter Orçamento. Sobra (3): Cavaco Silva pede a António Costa um acordo a sério, que não foi alcançado, e que é mais do que aquilo que serviu para derrubar o governo. O que Costa tem são três “posições conjuntas”, assinadas bilateralmente de forma atabalhoada (nem se deram ao trabalho de tirar as cadeiras da fotografia), numa sala sem dignidade. As posições não são acordos: não podem. Os acordos pressupõem força política, vontade e compromisso. Isto não está nos papelinhos que Costa assinou à sua esquerda, onde nem o OE para 2016 está garantido.
Por esta altura, o PR terá confiança mínima em Costa. Lembremo-nos de que o líder do PS saiu de Belém, já lá vai um mês, a dizer que tinha um acordo para governar. Não tinha. E o que assinou a semana passada não é um acordo. Costa mentiu – ao PR e ao país. 

Os partidos devem agora remeter-se ao silêncio. O parlamento falou. Este é o tempo do Presidente. 
O PR pode indigitar Costa tanto quanto pode manter o governo de gestão. A Constituição atribui-lhe o poder discricionário de encontrar a melhor solução para o país. Não vale a pena a esquerda barafustar: Cavaco Silva é o político no activo com mais votos, com mais eleições ganhas (coisa que Costa parece querer ignorar). E caso o PR não queira colocar um governo politicamente ferido de morte em jogo, terá toda a razão do seu lado. Afinal de contas, o PR só estará a cumprir a Constituição que jurou defender. A mesma Constituição que a troika das esquerdas usou para justificar a troca de um governo eleito pelo povo por um governo negociado pelos deputados. Suprema ironia: ainda vamos ver a esquerda a pedir uma revisão constitucional.  
              
Escreve à quarta-feira

A pressa de António Costa e o tempo de Cavaco Silva


O PR é o último reduto de estabilidade. Decidirá quando quiser e como quiser, sempre dentro do perímetro constitucional


“Qual é a pressa?” Tal como António José Seguro, quando António Costa lhe exigiu um congresso extraordinário para assaltar o PS, também agora há dificuldade em entender a pressa de Costa. Teve pressa para trair Seguro. Teve pressa para condenar o país à espiral recessiva e pressa para pedir eleições antecipadas. Tinha pressa para que a anunciada maioria socialista não lhe escapasse, como escapou. Derrotado, Costa achou que era uma perda de tempo (lá está a pressa) o Presidente da República cumprir a Constituição, dando posse à coligação. Costa, sempre em excesso de velocidade para chegar ao poder, tem pressionado o PR para que decida. E não só exige isso – mais um profundo desrespeito institucional – como espera que o faça em favor da sua causa, para a qual já convidou ministros. Costa, que até é autor de profícua sabedoria popular – “quem ganha por poucochinho é capaz de poucochinho” –, devia saber que “a pressa, nos desejos, é tardança”. 

A situação política é suficientemente delicada para se tomarem decisões apressadas. Pervertendo práticas constitucionais e regras democráticas com mais de 40 anos, o PS é o (ir)responsável por este teste de stresse ao sistema. O PR é o último reduto de estabilidade. O PR decidirá quando quiser e como quiser, sempre dentro do perímetro constitucional. 

Em cima da mesa, o PR deverá ter três cenários: (1) um governo em gestão até posse do próximo Presidente; (2) indigita António Costa; (3) pede a Costa que lhe traga um acordo digno desse nome. O cenário (1) cumpre-se se Cavaco acreditar que um governo de gestão é melhor do que um governo ingerível do PS. A solução, como lembrou o PR, não é inédita. Mais: nenhuma solução de governo é auto–suficiente no parlamento e Costa, ao contrário do que vende, não mudou a natureza minoritária do PS. Conseguiu dar-lhe uma circunstancial máscara de maioria. Mas quando for testada pela realidade – e o próximo dia 27, com os diplomas agendados pelo PCP e BE, será esclarecedor –, quando não houver despesa para aumentar ou impostos para descer, quando o fardo da governação pesar e a máscara dessa maioria cair, o que sobra será um governo com apoio parlamentar mais reduzido do que aquele de que hoje goza, sozinho, o maior partido da coligação. Quanto a (2), é viável caso o PR acredite que o custo de indigitar Costa é menor do que o custo de não ter Orçamento. Sobra (3): Cavaco Silva pede a António Costa um acordo a sério, que não foi alcançado, e que é mais do que aquilo que serviu para derrubar o governo. O que Costa tem são três “posições conjuntas”, assinadas bilateralmente de forma atabalhoada (nem se deram ao trabalho de tirar as cadeiras da fotografia), numa sala sem dignidade. As posições não são acordos: não podem. Os acordos pressupõem força política, vontade e compromisso. Isto não está nos papelinhos que Costa assinou à sua esquerda, onde nem o OE para 2016 está garantido.
Por esta altura, o PR terá confiança mínima em Costa. Lembremo-nos de que o líder do PS saiu de Belém, já lá vai um mês, a dizer que tinha um acordo para governar. Não tinha. E o que assinou a semana passada não é um acordo. Costa mentiu – ao PR e ao país. 

Os partidos devem agora remeter-se ao silêncio. O parlamento falou. Este é o tempo do Presidente. 
O PR pode indigitar Costa tanto quanto pode manter o governo de gestão. A Constituição atribui-lhe o poder discricionário de encontrar a melhor solução para o país. Não vale a pena a esquerda barafustar: Cavaco Silva é o político no activo com mais votos, com mais eleições ganhas (coisa que Costa parece querer ignorar). E caso o PR não queira colocar um governo politicamente ferido de morte em jogo, terá toda a razão do seu lado. Afinal de contas, o PR só estará a cumprir a Constituição que jurou defender. A mesma Constituição que a troika das esquerdas usou para justificar a troca de um governo eleito pelo povo por um governo negociado pelos deputados. Suprema ironia: ainda vamos ver a esquerda a pedir uma revisão constitucional.  
              
Escreve à quarta-feira