“Estava só a gritar para a bola. A dizer ‘vai, vai’. Não sei se a força seria suficiente e fiquei muito aliviado quando a vi a passar os postes.” Foi desta forma que Dan Carter comentou o lance que marcou a vitória da Nova Zelândia sobre a Austrália na final do Mundial (34-17).
O jogo estava cada vez mais tenso. A vantagem no início do segundo tempo por 21-3 parecia confortável mas o cartão amarelo de Ben Smith aos 52 minutos inverteu a tendência. David Pocock (53’) e Tevita Kuridrani (64’) conseguiram ensaios que encurtaram a diferença para quatro pontos e tornaram o desfecho imprevisível para o último quarto de hora. Foi então que apareceu o médio de abertura dos All Blacks.
O melhor marcador do râguebi internacional (1598 pontos) não é conhecido pelos pontapés de ressalto – o perfil no site da selecção diz mesmo que essa é a única fraqueza que lhe pode ser apontada – mas foi assim que levou a Nova Zelândia ao título. Primeiro na meia-final, quando a equipa perdia por cinco pontos, depois na final, restabelecendo a vantagem em sete pontos.
As horas de prática com o pai no quintal das traseiras tiveram finalmente efeito e o sonho de ganhar uma final foi concretizado, com Carter a marcar 19 dos 34 pontos. “Estou muito grato por estar aqui depois do que se passou há quatro anos. Trabalhei muito desde então e estou muito orgulhoso. Vencer finais consecutivas é um sonho transformado em realidade para a Nova Zelândia”, afirmou após o jogo.
Dan Carter estreou-se pelos All Blacks a 21 de Junho de 2003 e foi conquistando um espaço no grupo. Nesse ano, e em 2007, a selecção não foi campeã. Em 2011 regressou aos títulos mas Dan Carter só jogou dois jogos na fase de grupos, sofrendo uma ruptura no adutor em vésperas da partida com o Canadá, em que seria capitão pela primeira vez. Semanas depois, em Auckland, estava de muletas na final ganha sobre a França por 8-7.
A sina de Carter era esta: lesões, lesões e mais lesões. Mas nunca desistiu. E o seleccionador Steve Hansen nunca deixou que caísse no esquecimento. Porque o haka não é apenas um ritual para fazer cara feia e entreter os espectadores. Também passa pela necessidade de fazer sacrifícios para concretizar os sonhos. No caso do médio de abertura, foi preciso esperar pelos 33 anos. “É o derradeiro prémio da minha carreira. Foi um percurso incrível e é difícil acreditar na forma como acabou. Tive de trabalhar muito nos últimos quatro anos para chegar onde estou.”
O adeus foi mítico. Pela vitória, pelo pontapé de ressalto a 40 metros (o oitavo pela selecção em 112 jogos) e pela forma como assinou a despedida, convertendo o último ensaio da final com o pé direito, em vez do esquerdo. Porque o adeus de um génio aos All Blacks não poderia pedir menos que isso.