Dívida Pública. MP quer levar a julgamento académico canadiano


Peter Boone é acusado de ter ganho mais de 819 mil euros com a manipulação dos títulos em 2010.


Chama-se Peter Boone, é canadiano e economista da London School of Economics. O Ministério Público pediu ontem o seu julgamento por ter manipulado em 2010 títulos da dívida portuguesa e lucrado 800 mil euros, de acordo com a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (PGDL). Segundo a PGDL, o arguido é acusado do crime de manipulação de mercado tendo por objecto a desvalorização das obrigações do Tesouro portuguesas.

Sublinhando que se trata de uma acusação “por crime com contornos inéditos”, a PGDL adianta que em Abril de 2010 Peter Boone era administrador de uma sociedade que prestava serviços de consultoria de investimento e de gestão de carteiras sobre investimentos financeiros a uma outra sociedade gestora de fundos de investimento especulativo.

De acordo com a prova recolhida, o arguido tinha interesse na desvalorização da dívida portuguesa e na subida dos yields (margem de lucro), uma vez que só a respectiva desvalorização permitia recuperar a dívida com mais-valias e potenciar os seus ganhos, tendo, com esta finalidade, publicado, entre Fevereiro e Abril de 2010, vários artigos em blogues, um deles associado a um jornal de referência mundial.

A PGDL acrescenta que “os artigos de opinião tiveram impacto nas yields da dívida pública portuguesa e influenciaram os investidores, até porque o arguido era um académico prestigiado, doutorado em Economia pela Universidade de Harvard, e os artigos foram publicados em contexto de grande instabilidade financeira, de receio de contágio pela dívida grega, estando os mercados em situação de elevada susceptibilidade”.

Segundo a PGDL, o arguido nunca mencionou nos artigos editados os seus interesses negociais, o que teria “reduzido a credibilidade da opinião divulgada”, tendo obtido, na negociação da dívida soberana portuguesa, ganhos de 819 099 euros através da desvalorização dos títulos de Tesouro respectivos. Desta forma, realça aquela estrutura do MP, o arguido “atentou contra as regras da livre concorrência e a confiança do mercado”.

De facto, Peter Boone estava ligado à Salute Capital Management, que prestava serviços de aconselhamento de investimento em dívida pública portuguesa à Moore. Nos artigos, na parte do disclaimer, o autor assumia a sua ligação à Salute Capital Management, mas nunca fez referência aos serviços por esta prestados à Moore, ou seja, ao conflito de interesses que a sua opinião poderia representar, de acordo com o “Diário Económico”.

Peter Boone escreveu vários artigos mas um deles causou maior impacto e mereceu uma reacção do então ministro das Finanças, Teixeira dos Santos. O artigo “The Next Global Problem: Portugal” era assinado por dois autores: Peter Boone e Simon Johnson. Este último havia sido economista-chefe do FMI e dizia claramente no final do artigo que não prestava qualquer serviço de investimento ou consultoria relacionado com a dívida pública portuguesa.