Aviões. O que acontece quando um passageiro morre no ar?

Aviões. O que acontece quando um passageiro morre no ar?


A morte em voo é “muito pontual e quase sem expressão estatística” tendo em conta o número de voos operados, explica a TAP. Mas nestas situações quais são os procedimentos habituais?


Pode nem ter medo de andar de avião, mas com toda a certeza conhece alguém que estremece só com a ideia de entrar num aparelho e seguir para outro destino. Por mais perto que seja. A fobia a um dos transportes mais seguros do mundo pode, para muitos, ser difícil de explicar, mas quando um passageiro se sente mal a ponto de necessitar de ajuda médica o caso muda de figura. Acidentes, turbulência e poços de ar à parte, o que acontece quando alguém morre a bordo? 

A notícia da morte de John Kennedy dos Santos Gurjão, de 25 anos, num voo da Aer Lingus que ligava Lisboa a Dublin correu os noticiários nacionais e internacionais. Aos primeiros sinais de indisposição e agitação, o cidadão brasileiro foi levado para a parte de trás do avião e socorrido por um médico e duas enfermeiras que estavam a bordo. Mesmo com o desvio de rota – o avião aterrou no aeroporto de Cork, na Irlanda – nada foi possível fazer para salvar John. Causa da morte: um dos pequenos pacotes de cocaína que ingeriu ainda na capital portuguesa rebentou no estômago. 

Mas ter um passageiro com formação médica a bordo é um bónus com que nem todas as ligações aéreas contam. Na TAP são os tripulantes de cabina que lidam directamente com situações de doença ou morte a bordo. Estes “recebem treino teórico e prático inicial e anual” e estão ainda habilitados a lidar com o pânico a bordo que estes episódios podem causar: “Estão treinados para este tipo de situações e têm formação em técnicas adequadas de comunicação e gestão de stresse e conflitos”, refere a transportadora aérea nacional. 

O i contactou um assistente de bordo da TAP que já viu um passageiro morrer em pleno voo. Apesar de ter recebido treino em primeiros socorros, cedo percebeu que “não estava psicologicamente preparado para lidar” com o que se passou. Os sintomas do homem começaram por dores de estômago que foram posteriormente acompanhadas por dificuldades de respiração. O voo era de longo curso mas estava a ser operado num avião de médio curso, que, além de não ter um desfibrilhador, também “não tinha condições para esconder o corpo”. 

O passageiro foi levado para uma “zona mais recuada do avião”, mas todas as pessoas a bordo perceberam o incidente: “Não houve alarme a bordo, mas a situação não passou despercebida”, garante o assistente de bordo. Apesar das manobras de reanimação – o avião leva “uma mala de médico muito bem apetrechada” –, o homem não sobreviveu. O óbito foi declarado por um médico no local onde a aeronave aterrou. 

Em casos de indisposição de um passageiro em que seja necessária intervenção médica há ainda a possibilidade de desviar a rota e aterrar no aeroporto mais próximo. Na Europa, explica o assistente de bordo, poderá ser mais fácil lidar com situações destas uma vez que “há sempre um hospital a vinte minutos de distância”. A TAP afirma que “o desvio para um aeroporto alternativo dependerá da situação concreta e das condições de segurança e auxílio médico existentes nesse aeroporto”.

MORTE A BORDO A transportadora aérea nacional explica ao i que os casos de morte a bordo “são muito pontuais e quase sem expressão estatística se tivermos em conta o número de voos operados pela companhia”. Mas, caso ocorra, a tripulação de cabine irá “imediatamente comunicar o facto ao comandante, que irá reportar a situação ao air traffic control e informar a companhia via rádio”. A companhia ou o seu representante irão contactar as autoridades aeroportuárias, de forma a preparar todos os meios necessários à chegada, afirma ainda a TAP. 

O cadáver é “tratado da forma mais discreta possível”. Os procedimentos a adoptar devem ter em conta as circunstâncias concretas, mas regra geral “a tripulação irá colocar o cadáver numa fila sem passageiros, pôr o cinto de segurança, fechar os olhos e cobrir o corpo com um cobertor”. Durante este processo, é prestada assistência aos familiares ou companheiros da vítima: “A tripulação solicita todas as informações necessárias”, garante ainda a companhia. 

Também a Ryanair assegurou ao i que “todas as equipas são treinadas em primeiros socorros”. A companhia aérea acrescenta que, em caso de incidente que requeira intervenção médica, “a tripulação irá verificar se há algum passageiro a bordo com formação médica” e seguidamente desviar a rota em direcção ao aeroporto mais próximo, solicitando sempre assistência médica para o momento em que o avião aterre.

Mas nem todas as companhias aéreas lidam da mesma forma com situações de indisposições graves ou morte a bordo. Contactada pelo i, a International Civil Aviation Organization (ICAO) confirma existir “uma diversidade de abordagens” na forma de gerir os incidentes graves e os cadáveres a bordo e afirma que qualquer questão sobre estes temas deve ser directamente dirigida às transportadoras.