O “golo!” não devia ser trocado pelo “chupa!”


O mundo que rodeia o futebol está muito diferente do que era há uns anos. Os clubes estão cada vez mais profissionais, os jogadores são mais bem pagos, os árbitros em Portugal começaram a deixar o amadorismo e a comunicação das equipas começa a ser usada como um trunfo. Os adeptos sofreram com tudo isto.…


O mundo que rodeia o futebol está muito diferente do que era há uns anos. Os clubes estão cada vez mais profissionais, os jogadores são mais bem pagos, os árbitros em Portugal começaram a deixar o amadorismo e a comunicação das equipas começa a ser usada como um trunfo. Os adeptos sofreram com tudo isto. Deixaram de ter tantos jogos à tarde, deixou de haver fins-de-semana de bola como antigamente e o contacto com as estrelas é cada vez mais limitado e muitas vezes resume-se a um vislumbre através de um vidro fumado ou de um rápido abrir de janela à entrada para as caixas-fortes que são os centros de estágio.

O FC Porto aproveitou as últimas décadas para se impor definitivamente no topo mas o dérbi de Lisboa continua a ter mais história. Porque são dois clubes da mesma cidade, porque dividiram a hegemonia do futebol entre as décadas de 40 e 80 e porque semearam assim a rivalidade nos vários cantos de Portugal. A contratação de Eusébio, o Verão Quente e as goleadas do passado apimentaram conversas de café e transformaram a segunda-feira num dia com uma conotação ainda mais negativa para quem perdia. Quem saía vitorioso, ganhava um novo sorriso e podia andar de peito feito no trabalho, universidade ou escola. Quem perdia, estava obrigado a atravessar um corredor da morte, sujeito a ouvir bocas a qualquer momento. Fazia parte, era mesmo assim. Não havia como escapar e, mais tarde ou mais cedo, os papéis invertiam-se.

A rivalidade do século XXI é muito diferente. Tornou-se doentia. O que antes parecia circunscrito a um círculo de amigos e conhecidos (e dentro destes era preciso ter confiança com a pessoa), agora aumentou exponencialmente por culpa de personagens criadas em laboratório para semanalmente acicatarem ódios em vez de reforçarem paixões. Foi esta mudança que transformou a prioridade nos festejos dos melhores momentos. Onde antes havia um grito de “golo!” saído das profundezas mais escondidas da alma, há agora um “chupa!” ou um “incha!” fabricado nas entranhas do ódio. É o fenómeno que se confirma nas redes sociais mas que não lhe é exclusivo.

O anti-clubismo não está mais forte do que o clubismo mas não anda longe. A prioridade ao festejo entre adeptos do mesmo clube foi substituída pela boca contra os rivais. E é assim, semana após semana, aumentando de dimensão a cada declaração mais imprudente de comentadores de programas ou antigos e actuais dirigentes que se preferem cautelosos e previdentes.

Quem vê de fora, sente vergonha. O dérbi é no domingo mas já anda irrespirável há muito tempo. E durante o jogo – e nas horas seguintes – só terá tendência para piorar. Porque aqueles que sairão de cima, não se vão preocupar em apreciar o topo, apenas em espezinhar os que ficaram por baixo. Isso e fazer fila para assistir à “azia” dos comentadores de segunda-feira. É o triste caminho que se leva por cá.

Coordenador de desporto
Escreve ao sábado 

O “golo!” não devia ser trocado pelo “chupa!”


O mundo que rodeia o futebol está muito diferente do que era há uns anos. Os clubes estão cada vez mais profissionais, os jogadores são mais bem pagos, os árbitros em Portugal começaram a deixar o amadorismo e a comunicação das equipas começa a ser usada como um trunfo. Os adeptos sofreram com tudo isto.…


O mundo que rodeia o futebol está muito diferente do que era há uns anos. Os clubes estão cada vez mais profissionais, os jogadores são mais bem pagos, os árbitros em Portugal começaram a deixar o amadorismo e a comunicação das equipas começa a ser usada como um trunfo. Os adeptos sofreram com tudo isto. Deixaram de ter tantos jogos à tarde, deixou de haver fins-de-semana de bola como antigamente e o contacto com as estrelas é cada vez mais limitado e muitas vezes resume-se a um vislumbre através de um vidro fumado ou de um rápido abrir de janela à entrada para as caixas-fortes que são os centros de estágio.

O FC Porto aproveitou as últimas décadas para se impor definitivamente no topo mas o dérbi de Lisboa continua a ter mais história. Porque são dois clubes da mesma cidade, porque dividiram a hegemonia do futebol entre as décadas de 40 e 80 e porque semearam assim a rivalidade nos vários cantos de Portugal. A contratação de Eusébio, o Verão Quente e as goleadas do passado apimentaram conversas de café e transformaram a segunda-feira num dia com uma conotação ainda mais negativa para quem perdia. Quem saía vitorioso, ganhava um novo sorriso e podia andar de peito feito no trabalho, universidade ou escola. Quem perdia, estava obrigado a atravessar um corredor da morte, sujeito a ouvir bocas a qualquer momento. Fazia parte, era mesmo assim. Não havia como escapar e, mais tarde ou mais cedo, os papéis invertiam-se.

A rivalidade do século XXI é muito diferente. Tornou-se doentia. O que antes parecia circunscrito a um círculo de amigos e conhecidos (e dentro destes era preciso ter confiança com a pessoa), agora aumentou exponencialmente por culpa de personagens criadas em laboratório para semanalmente acicatarem ódios em vez de reforçarem paixões. Foi esta mudança que transformou a prioridade nos festejos dos melhores momentos. Onde antes havia um grito de “golo!” saído das profundezas mais escondidas da alma, há agora um “chupa!” ou um “incha!” fabricado nas entranhas do ódio. É o fenómeno que se confirma nas redes sociais mas que não lhe é exclusivo.

O anti-clubismo não está mais forte do que o clubismo mas não anda longe. A prioridade ao festejo entre adeptos do mesmo clube foi substituída pela boca contra os rivais. E é assim, semana após semana, aumentando de dimensão a cada declaração mais imprudente de comentadores de programas ou antigos e actuais dirigentes que se preferem cautelosos e previdentes.

Quem vê de fora, sente vergonha. O dérbi é no domingo mas já anda irrespirável há muito tempo. E durante o jogo – e nas horas seguintes – só terá tendência para piorar. Porque aqueles que sairão de cima, não se vão preocupar em apreciar o topo, apenas em espezinhar os que ficaram por baixo. Isso e fazer fila para assistir à “azia” dos comentadores de segunda-feira. É o triste caminho que se leva por cá.

Coordenador de desporto
Escreve ao sábado