À primeira sessão parlamentar da XIIIlegislatura ficou desenterrado o machado de guerra. Desde que, ao início da manhã de ontem, o PSD escolheu o socialista Alberto Martins para presidir aos trabalhos até que, a meio da tarde, Ferro Rodrigues avisou Belém que exige respeito pela soberania do parlamento, o clima de tensão e confronto foi indisfarçável num hemiciclo partido em dois blocos políticos.
O primeiro embate saldou-se por uma vitória para a esquerda. A eleição do presidente da Assembleia opôs o socialista Ferro Rodrigues ao social-democrata Fernando Negrão. A votação por voto secreto em urna era um teste à unidade da esquerda – ou, mais concretamente, à do PS, depois de os deputados seguristas terem feito saber que preferiam o nome de Alberto Martins como candidato à presidência da AR. Para já, a esquerda (quase) não mostrou brechas. Ferro recolheu 120 votos (a esquerda unida tem 122 deputados), Negrão 108 (PSD e CDS têm 107 assentos), numa votação com duas abstenções.
A divisão tornou-se ainda mais evidente com o discurso de tomada de posse de Ferro Rodrigues. O que costuma ser uma intervenção institucional, pouco dada a polémicas, foi ontem um discurso cheio de recados políticos, fortemente criticado à direita. Falando um dia depois de Cavaco Silva ter anunciado ao país a indigitação de Passos Coelho como primeiro-ministro, deixando duras críticas a uma coligação à esquerda, Ferro Rodrigues ripostou na direcção de Belém. “Temos o direito e o dever de exigir respeito pela soberania da Assembleia da República”, afirmou o recém-empossado presidente da AR, aplaudido pelas três bancadas à esquerda, enquanto à direita muitas cabeças acenavam em sinal de desaprovação. Aplausos e críticas repetiram-se quando, já no final do discurso, Ferro Rodrigues deixou outra mensagem com destinatário no Palácio de Belém: “Num parlamento democrático, nenhum – sublinho, nenhum – representante do povo está à partida impedido de contribuir para o futuro.” E se dúvidas ainda houvesse: “Assim como não há deputados de primeira e de segunda, também não há grupos parlamentares de primeira e de segunda, coligações aceitáveis e outras banidas.” Um discurso que não foi poupado a apartes das bancadas da direita, sobretudo à menção das palavras “compromisso” e “lealdade”.
As intervenções que se seguiram deverão ser o espelho da legislatura que agora se abre. Luís Montenegro e Nuno Magalhães apontaram para a quebra de uma regra de 40 anos da democracia (a indicação do presidente da AR pelo partido mais votado). Àesquerda, os líderes parlamentares fizeram questão de sublinhar que o equilíbrio de forças mudou – e ontem foi só o início. António Costa disse isso e mais: “A nossa liberdade não é manipulável por qualquer força que queira bloquear a expressão dos portugueses.” Na sua intervenção, o líder do PS deixou ainda uma frase – dirigida ao candidato derrotado, Fernando Negrão – sublinhando que “o mérito não se apura pelo resultado dos votos”. Uma frase a que a direita respondeu com um sonoro “ahhh”. Com Rita Tavares