Governo. Passos recusa ser primeiro-ministro em gestão corrente

Governo. Passos recusa ser primeiro-ministro em gestão corrente


Ou Cavaco recua ou força Passos a um cenário que o líder do PSD abjura. Há ainda uma terceira via.


Passos Coelho não quer continuar primeiro-ministro se o governo for derrubado no parlamento e Cavaco recusar a alternativa de esquerda proposta por António Costa. Ficar em gestão corrente até ao Verão é um cenário que o primeiro-ministro quer ver afastado. Na comissão política de quinta-feira, Passos desabafou: “Nem pensem que vou ficar aqui a assar para depois limpar o que os outros fizeram”.

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Com Cavaco Silva indisponível para dar posse a um governo liderado pelo PS e apoiado pelo Bloco e pelo PCP, a solução do governo Passos em gestão até o novo PR  tomar posse está no horizonte. Mas Passos não quer essa solução, embora a lei só lhe permita terminar funções quando for nomeado um novo primeiro-ministro. Não querendo dar posse ao governo de esquerda, Cavaco ainda tem a possibilidade de indigitar um primeiro-ministro que seja aceite pela maioria dos deputados que, de acordo com a visão do PR, teriam de ser PS e PSD.

Os candidatos à Presidência da República da área política do PS, Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa, acusam o actual titular do cargo de, com o discurso de indigitação de Passos Coelho, “condicionar” e “confrontar” o parlamento. A candidata bloquista, Marisa Matias, vai mais longe e acusa Cavaco de ter feito um “discurso de cruzada ideológica”.
O “tom de desafio e confronto com a Assembleia da República” é o que o candidato presidencial Sampaio da Nóvoa destaca nas suas críticas à intervenção de Cavaco Silva no seu discurso de indigitação de Passos Coelho. 

Este candidato da área política socialista nada tem a “apontar” à “decisão formal” de Cavaco Silva ao indigitar Pedro Passos Coelho para formar governo. O que Sampaio da Nóvoa salienta e condena é “o tom de desafio e confronto adoptado na comunicação”, acusando o Presidente de “ser factor de divisão, de instabilidade” e de “intolerância” ao “ameaçar” manter em funções um governo de gestão e sem Orçamento, “decida o parlamento o que decidir”.

O antigo reitor da Universidade de Lisboa considera que essa solução configuraria “uma situação grave do ponto de vista democrático”, pondo em causa a Constituição por “não assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas”. Por outro lado, considera “preocupante” que o PR tenha manifestado a intenção de “excluir” da vida democrática e de qualquer solução governativa partidos como o Bloco de Esquerda, o PCP e o PEV, que representam mais de um milhão de eleitores e que manifestaram vontade de construir uma solução de governo com estabilidade política. 

Critica ainda Cavaco Silva por, ao justificar-se com “o receio de uma eventual reacção dos mercados”, dramatizando “a escolha política dos partidos e deputados, numa intervenção que sabia de antemão que teria eco internacional”, poder “ter provocado uma instabilidade até agora inexistente”, disse.

Também Maria de Belém, a candidata presidencial da mesma área política que Sampaio da Nóvoa, considerou que o PR não deve “condicionar nunca a actuação do parlamento” e, pelo contrário, “deve salvaguardar a unidade do Estado e a separação de poderes”. Não se alongando em comentários ao discurso presidencial, Maria de Belém considera, na sua interpretação dos poderes que a Constituição confere ao titular do cargo, que “o uso da palavra deve ser criterioso no sentido de fomentar a união entre os portugueses”.

Marisa Matias, candidata do Bloco de Esquerda às presidenciais, considerou que no discurso Cavaco Silva “expulsa um milhão de portugueses da democracia” e acusa o PR de “total ausência de imparcialidade e isenção” e de ser um factor de divisão dos portugueses.

“A indigitação de Pedro Passos Coelho é um acto formalmente legítimo e politicamente legítimo”, escreve Marisa Matias num comunicado enviado à Lusa, mas condena o facto de ter sido acompanhada de “um discurso de cruzada ideológica”.