Pode dizer-se que foi curta e meteórica a carreira de Bessie Smith, que morreu em 1937, aos 43 anos, num acidente de carro. Mas duas décadas bastaram para a cantora impor o seu génio e ficar para a história da música como a Imperatriz dos Blues. Não só marcou de maneira determinante a música americana como protagonizou situações que atravessaram as fronteiras artísticas: por exemplo, com o momento em que expulsou membros do Ku Klux Klan, durante um concerto em Concord, na Carolina do Norte, em 1927.
E este é apenas um dos episódios da vida da lendária artista recuperados no filme “Bessie”, que a HBO lançou este ano e que se estreia na televisão portuguesa no domingo, às 21h30, no canal TVCine 1.
Realizado e escrito em colaboração por Dee Rees, o filme, que ganhou vários prémios Emmy, entre os quais o de Melhor Filme de Televisão, é protagonizado por Queen Latifah, que conquistou uma nomeação para Melhor Actriz de Filme ou Minissérie. A acção centra-se nos anos 20 e 30, o auge da carreira de Bessie Smith, que começou a cantar nas ruas de Chattanooga, Tennessee, tendo assinado o primeiro contrato discográfico em 1923, com a Columbia Records.
A ascensão da mulher que cantava “I’m as good as any woman in your town” (em “Young Woman Blues”) e rejeitava ser a segunda escolha em qualquer circunstância é o fio condutor de “Bessie”, trazendo ao ecrã não só os principais momentos do seu percurso artístico, mas também os da vida pessoal.
Da relação com Ma Rainey (Mo’Nique), outro dos nomes maiores dos blues e que no filme é apontada como a impulsionadora da carreira de Bessie Smith, ao preconceito que teve de ultrapassar numa América racista e repressora e num mundo masculino para chegar ao topo, o filme recorda ainda as relações amorosas de Bessie, tão intempestivas e viscerais como a cantora.
Começa com o primeiro marido e agente, Jack Gee (interpretado por Michael Kenneth Williams), figura controversa e violenta, que terá fugido com o filho adoptivo de ambos, passando pelo amante Richard (Mike Epps), com quem viveria depois da separação. “Bessie” aborda também relações que apontam para a alegada bissexualidade de Bessie Smith e que aqui aparecem concentradas na personagem Lucile (Tika Sumpter).
O filme de Dee Rees levou mais de 20 anos a ser feito e a primeira audição de Latifah para o papel aconteceu em 1992.
A actriz e cantora, que já tinha brilhado no musical “Chicago”, disse, em entrevista à “Billboard”, que foi a primeira vez que viu um filme seu e confessou que chorou por estar a ver a personagem, que a desafiou a todos os níveis, e não a si própria. Uma vida turbulenta difícil de ver no ecrã, diria a actriz ao “The New York Times”, mas uma história que “tinha de ser contada”.
Bessie
de V/A
(Sony)
Tal como acontece no filme, a protagonista da banda sonora é Queen Latifah, desde sempre fã de Bessie Smith, patroa dos blues, mais que qualquer outra. Latifah canta seis temas, quase sempre sozinha, com PatBass em “Weepin’Woman Blues”, rodeada depois de outros que aqui prestam homenagem a clássicos dos anos 20 e 30.
Na voz de Bessie Smith escutamos o enorme “Gimme a Pig’s Foot and a Bottle of Beer” e também há Fats Waller, Louis Armstrong, Sippie Wallace e a orquestra de Kid Ory. Tudo isto no tempo certo, com o filme mas a viver bem sem as imagens, quando o disco roda por conta própria.