O fim da carreira. Luís Miguel Cintra desce o pano

O fim da carreira. Luís Miguel Cintra desce o pano


O encenador, actor e director da Cornucópia anunciou no sábado, no fim de “Hamlet”, que a sua carreira chegou ao fim.


No sábado à noite, no fim da última representação de “Hamlet”, que esteve um mês em cena no Teatro da Cornucópia, Luís Miguel Cintra anunciou que se iria afastar dos palcos. O encenador e actor de 66 anos disse que foram “problemas de saúde” que ditaram o fim da sua carreira no teatro.

Não se pronunciou sobre o futuro do Teatro da Cornucópia, que fundou em 1973 com Jorge Silva Melo (e do qual é director desde então), mas já se sabe que a companhia enfrenta problemas financeiros. Em Julho, e a propósito da estreia de “Hamlet” no Festival de Almada, Luís Miguel Cintra, que desde que começou no teatro, em 1968, já fez mais de cem espectáculos, dizia ao i que a sua saúde já não lhe permitia “fazer papéis muito grandes” – e por isso tinha optado por um pequeno papel em “Hamlet”, a peça que encenava. “Gosto tanto de representar… Aliás, é-me mais difícil não representar que não encenar, sou mais actor na minha maneira de ser”, confessava.

 Na mesma entrevista, e apesar de se ter reformado a 29 de Abril, dizia não querer parar. “A minha memória baralha-se, há coisas de que tenho pena mas já não consigo fazer. Vou tentar continuar a encenar espectáculos e sobretudo ser útil aos que vão continuar depois. Mais que fazer brilharetes para coroar aquela coisa da carreira, apetece-me é fazer coisas arriscadas, perigosas e que me dêem a conhecer a vida dos mais novos, a forma como pensam. Quero continuar a viver.”
O encenador dirigiu peças de autores como Ésquilo, Sófocles, Beckett ou Brecht. Deixou para o fim “Hamlet”, de Shakespeare, com uma tradução que lhe foi prometida por Sophia de Mello Breyner, porque “não pareceu nunca urgente” pô-la em cena, explicava. “Sempre achei que a ideia das carreiras é estúpida, no teatro, pelo menos.

A ideia de que uma pessoa vai subindo degraus até estar à altura da dignidade de fazer o ‘Hamlet’ é uma ideia muito tonta. Portanto, sempre tive a reacção espontânea de dizer ‘essa não vale a pena fazer porque é o que toda a gente quer fazer’”, contava. “Como tal, fui deixando para trás, além disso havia uma tradução prometida…”

O mesmo espectáculo, em co-produção com a Companhia de Teatro de Almada, vai voltar ao Teatro de Almada na próxima sexta-feira – e fica até 15 de Novembro.

Talvez a adivinhar a sua saída de cena, Luís Miguel Cintra será também (ao lado de Wim Wenders) um dos homenageados na edição deste ano do Lisbon & Estoril Film Festival, que acontece entre 6 e 15 de Novembro em vários locais de Lisboa e em Cascais.

Além de uma selecção de 13 filmes em que participou – ao todo, e desde que se estreou em 1971 numa curta de João César Monteiro, “Quem Espera Por Sapatos de Defunto Morre Descalço”, foram mais de 70 filmes, o último, “O Gebo e a Sombra”, de 2012, de Manoel de Oliveira –, o festival também vai exibir filmagens de algumas peças que encenou, como “E Não Se Pode Exterminá-lo”, de 1979, “A Ilha”, de 2009, ou “Ilusão”, do ano passado.

O próprio vai estar presente para a leitura de poemas e de vários textos e para, depois das projecções, conversar com o público e “com as várias personalidades com que se cruzou ao longo da sua carreira”, adianta o programa do festival.