A queda de um mito. Afinal, as formigas também são preguiçosas

A queda de um mito. Afinal, as formigas também são preguiçosas


Investigadores norte-americanos acabaram com o mito das formiguinhas trabalhadoras. Nestes casos, a preguiça até terá a sua utilidade mas, nos humanos, pode funcionar como uma “desresponsabilização” em alturas de tensão.


Inspirados pelas histórias que nos contaram na infância, sempre tivemos uma tendência para ver as formigas como insectos activos que, em contraponto com a cigarra, trabalham o Verão inteiro em benefício da colónia. Pequeninas e esforçadas abdicam dos momentos de ócio e da sua individualidade para que a sua espécie sobreviva durante as estações mais frias do ano. É tudo mentira. Os  investigadores norte-americanos da Universidade de Tucson, no Arizona, desmistificam agora esta teoria: afinal, as formigas também sofrem de preguiça, este mal que afecta tantos humanos.

O mito caiu por terra. “Quando começamos a investigar as sociedades compostas por insectos, percebemos que estas também têm os seus problemas: metade delas estão apenas a andar de um lado para o outro enquanto as outras fazem todo o trabalho”, explica à R&D Magazine. Daniel Charbonneau, o responsável pelo estudo.

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Para chegar a esta conclusão, publicada na revista “Behavioral Ecology and Sociobiology”, foram observadas 250 formigas marcadas individualmente com cores e separadas em cinco colónias artificiais. Quase metade não executou qualquer tarefa e a razão pela qual isto aconteceu ainda não é clara: “Penso que a explicação mais comum seja que estas formigas servem para substituir outras que entretanto morrem ou então só começam a trabalhar quando o volume de trabalho dentro da colónia aumenta.”

Utilidade Estas teorias, contudo, ainda estão por provar, mas o certo é que na natureza nada acontece por acaso. E, diz o investigador americano, “todos os estudos que tentaram activar as formigas inactivas falharam”. O papel que estas formigas preguiçosas têm dentro da colónia permanece um mistério. As teorias são muitas e Charbonneau refere que o aparente “ócio” até pode ter alguma utilidade. Estes insectos podem funcionar como entreposto de comida para as formigas que realmente estão a fazer o trabalho árduo ou então, constituírem uma reserva a ser usada no caso de um ataque ao formigueiro. E ainda há outra hipótese que os autores do estudo deixam em aberto: “É também possível que as formigas inactivas estejam a ser egoístas e evitem as tarefas mais perigosas enquanto usam os recursos da colónia para investir na sua reprodução.”

Humanos. Esta é a pior possibilidade de todas porque a partir de agora comparar um humano com uma formiga já não poderá ser um elogio. E, pensando bem, a preguiça sempre foi um dos grandes problemas com que a humanidade teve de lidar. Basta recuar a Abril de 1905 quando o médico alemão Wolfgang Weichardt anunciava ter descoberto uma substância capaz de arrebitar qualquer preguiçoso.

Só que a preguiça não é algo que se cure com um remédio nem sequer é uma tendência inata nos homens, avisa o psicólogo Nuno Sousa. Este pecado capital, que figura ao lado de outros como a gula, a luxúria ou a inveja nas classificações dos piores vícios humanos, é também usado como “estratégia” para evitar grandes tensões. Basta olharmos para o que acontece nos trabalhos em equipa para encontrarmos vários exemplos. “No caso dos estudantes, por exemplo, há sempre um quer não faz nada nos trabalhos de grupo”, lembra o especialista, avisando que existem sempre pessoas que, por sentirem que como há quem faça o trabalho por elas, “se colocam numa posição de pouca autonomia e delegam as responsabilidades nos outros.” Este é, para o psicólogo clínico, “o contexto mais tradicional de preguiça”.