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O que sempre caracterizou os partidos do arco da governação foi não apenas poderem governar, mas estarem disponíveis para deixar os outros governar em caso de derrota. Foi assim que Mário Soares, Cavaco Silva, António Guterres e José Sócrates puderam governar em minoria, sem que os derrotados se unissem aos partidos dos extremos para formar governo.
Só Vítor Constâncio derrubou Cavaco para propor um governo do PS com o PRD e o PCP, mas Soares matou esse governo à nascença, dissolvendo o parlamento. Nas eleições seguintes Cavaco teve maioria absoluta.
António Costa, que já tinha demonstrado um radicalismo pouco usual no PS quando ameaçou reprovar o orçamento, assume agora que não deixará a coligação governar em caso de derrota do seu partido, indo formar governo com o PCP ou o BE. Seria um governo ainda mais absurdo do que a coligação do SYRIZA com o ANEL na Grécia, que ao menos acordava no anti-europeísmo, ainda que tenha acabado por ceder às imposições europeias.
O PS é pró-europeu, ao contrário do PCP e do BE. O que faria assim esse governo em relação à reestruturação da dívida, que o BE defende e o PS rejeita? E em relação ao euro, que o PCP se propõe abandonar, e o PS não? É claro que esse governo seria um aborto político, que levaria o país à bancarrota ou à saída do euro.
António Costa acha, porém, que pode invocar a sua capacidade de fazer acordos na Câmara para obter os consensos necessários a esse governo. Vai acabar a descobrir como a Dorothy do Feiticeiro de Oz: "We're not in Kansas anymore".
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira