O debate, a foto e a mulher nua


Passos perdeu uma oportunidade de dilatar uma vantagem que parecia desenhar-se a favor da coligação e Costa ganhou o ponto de vantagem que lhe pode permitir relançar a alma socialista.


© Jose Sena Goulao/Lusa

A 15 dias das eleições, hoje realiza-se o debate radiofónico que colocará pela última vez nesta campanha, frente a frente, Pedro Passos Coelho e António Costa.

Será interessante verificar se Passos Coelho rectificará erros básicos de forma e irá recuperar a dinâmica de confiança, ou se António Costa ampliará a vitória que obteve num directo televisivo soporífero.

Um debate não faz uma campanha. Ele define espaços, confirma tendências e faz sobressair debilidades. Para além da preparação que os candidatos têm obrigação de realizar, a personalidade do interveniente é decisiva.
Uma campanha eficaz é a resultante da convivência, adaptabilidade e manipulação, de vários ambientes, meios e receptores, juntamente com factores psicológicos, culturais e históricos.

Depois existem fenómenos naturais de empatia que se valorizam, ou de desinteresse e rejeição que a “máquina” tem de neutralizar ou minimizar.

Sendo verdade que a televisão é um meio de enorme poder, não substitui a rua. O plano ficcional que se adquire em estúdio não substitui nem supera a realidade e o factor humano. 
Pode perder-se na rua o que se ganhou nos estúdios, mas não se perde na televisão o que está ganho nas ruas. 
Se assim fosse, bastaria ter acesso à tecnologia televisiva para garantir a perpetuidade no poder, e isso não é verdade. Pode manipular factos e retardar evoluções do estado político, mas não consegue impedir o inevitável percurso social.

Mas sobre o fenómeno dos debates televisivos já Luís Bernardo, um dos poucos que sabe por prática feita, em Portugal, o que significa e como se organiza uma campanha política, escreveu um texto de qualidade exemplar. 
Não fui dos que davam ao debate televisivo de 9 de Setembro um carácter dramático e decisivo para a decisão final dos portugueses, nem sequer para a formação de uma opinião mais sustentada e susceptível de orientar uma opção de voto definitiva.

Em tese, isso poderia acontecer, mas num debate insonso, com os protagonistas a jogar à defesa, um menosprezando o interlocutor e o outro sem killer instinct para aproveitar o espaço inesperadamente oferecido, não foi isso que sucedeu.

Optaram por falar de percentagens, plafonamentos horizontais e verticais e outras espargatas. 

Esqueceram os que em casa esperavam que, em directo com eles, de forma clara, lhes falassem sobre o emprego, a reposição de salários e reformas, a redução da carga fiscal, e, dirigindo--se-lhes olhos nos olhos, trouxessem palavras de esperança, falassem do futuro de forma concreta, que sem eles, portugueses de todas as condições e talentos, não existe economia, nem projecto de desenvolvimento, nem país, e que os políticos são servidores eleitos pelo povo, e não eleitos por predestinação de casta ou sorte de videirinho. 
Para além do mais, o debate fez-se a uma distância confortável da data das eleições, faltavam ainda 23 dias, um tempo, apesar de tudo, ainda suficiente para reparar rombos significativos na estratégia de campanha, se os tivesse havido. Não houve. 

Pelo contrário, a vantagem de Costa no confronto televisivo pode ser perigosa se a organização da campanha do PS a considerar definitiva, tal como o tropeção de Passos Coelho pode ter alertado para a necessidade de não embandeirar em facilitismos.

Passos perdeu uma oportunidade de dilatar uma vantagem que parecia desenhar-se a favor da coligação e Costa ganhou o ponto de vantagem que lhe pode permitir relançar a alma socialista e reencontrar energias numa campanha que estava à deriva.

Curiosamente, o debate na rádio, que pode atingir um milhão de ouvintes, realizado mais próximo da data das eleições, com uma carga afectiva e emocional que a rádio tem diferente da televisão, e porque o horário vai coincidir com o período de trabalho das pessoas, ou seja, vão ser confrontadas com a sua própria realidade vivida ao mesmo tempo que escutam os dois políticos, pode acabar por ter mais influência inesperada. 

A foto que Sócrates fez chegar à TVI, de um convívio em sua casa em volta da mesa com amigos, é especial do ponto de vista semiótico. A foto não é a imagem de um homem vulgar a jantar numa situação normal, mas antes a de uma ideia de Sócrates e da sua forma de estar na vida. Frugal, apreciador das coisas simples, distante de vícios. É que na foto, apesar da presença dos copos utilizados para o vinho, as garrafas sumiram-se. Só ficaram as de água, tão natural como ele. 

Persiste, está no seu direito, tal como os outros estão em omitir opinião sobre o seu acto público. Dá pena porque, seja por falta de bom senso, ânsia descontrolada de protagonismo ou alucinação, no fim o que resta é só o corpo nu de uma mulher. 
 
Consultor de comunicação
Escreve às quintas-feiras

O debate, a foto e a mulher nua


Passos perdeu uma oportunidade de dilatar uma vantagem que parecia desenhar-se a favor da coligação e Costa ganhou o ponto de vantagem que lhe pode permitir relançar a alma socialista.


© Jose Sena Goulao/Lusa

A 15 dias das eleições, hoje realiza-se o debate radiofónico que colocará pela última vez nesta campanha, frente a frente, Pedro Passos Coelho e António Costa.

Será interessante verificar se Passos Coelho rectificará erros básicos de forma e irá recuperar a dinâmica de confiança, ou se António Costa ampliará a vitória que obteve num directo televisivo soporífero.

Um debate não faz uma campanha. Ele define espaços, confirma tendências e faz sobressair debilidades. Para além da preparação que os candidatos têm obrigação de realizar, a personalidade do interveniente é decisiva.
Uma campanha eficaz é a resultante da convivência, adaptabilidade e manipulação, de vários ambientes, meios e receptores, juntamente com factores psicológicos, culturais e históricos.

Depois existem fenómenos naturais de empatia que se valorizam, ou de desinteresse e rejeição que a “máquina” tem de neutralizar ou minimizar.

Sendo verdade que a televisão é um meio de enorme poder, não substitui a rua. O plano ficcional que se adquire em estúdio não substitui nem supera a realidade e o factor humano. 
Pode perder-se na rua o que se ganhou nos estúdios, mas não se perde na televisão o que está ganho nas ruas. 
Se assim fosse, bastaria ter acesso à tecnologia televisiva para garantir a perpetuidade no poder, e isso não é verdade. Pode manipular factos e retardar evoluções do estado político, mas não consegue impedir o inevitável percurso social.

Mas sobre o fenómeno dos debates televisivos já Luís Bernardo, um dos poucos que sabe por prática feita, em Portugal, o que significa e como se organiza uma campanha política, escreveu um texto de qualidade exemplar. 
Não fui dos que davam ao debate televisivo de 9 de Setembro um carácter dramático e decisivo para a decisão final dos portugueses, nem sequer para a formação de uma opinião mais sustentada e susceptível de orientar uma opção de voto definitiva.

Em tese, isso poderia acontecer, mas num debate insonso, com os protagonistas a jogar à defesa, um menosprezando o interlocutor e o outro sem killer instinct para aproveitar o espaço inesperadamente oferecido, não foi isso que sucedeu.

Optaram por falar de percentagens, plafonamentos horizontais e verticais e outras espargatas. 

Esqueceram os que em casa esperavam que, em directo com eles, de forma clara, lhes falassem sobre o emprego, a reposição de salários e reformas, a redução da carga fiscal, e, dirigindo--se-lhes olhos nos olhos, trouxessem palavras de esperança, falassem do futuro de forma concreta, que sem eles, portugueses de todas as condições e talentos, não existe economia, nem projecto de desenvolvimento, nem país, e que os políticos são servidores eleitos pelo povo, e não eleitos por predestinação de casta ou sorte de videirinho. 
Para além do mais, o debate fez-se a uma distância confortável da data das eleições, faltavam ainda 23 dias, um tempo, apesar de tudo, ainda suficiente para reparar rombos significativos na estratégia de campanha, se os tivesse havido. Não houve. 

Pelo contrário, a vantagem de Costa no confronto televisivo pode ser perigosa se a organização da campanha do PS a considerar definitiva, tal como o tropeção de Passos Coelho pode ter alertado para a necessidade de não embandeirar em facilitismos.

Passos perdeu uma oportunidade de dilatar uma vantagem que parecia desenhar-se a favor da coligação e Costa ganhou o ponto de vantagem que lhe pode permitir relançar a alma socialista e reencontrar energias numa campanha que estava à deriva.

Curiosamente, o debate na rádio, que pode atingir um milhão de ouvintes, realizado mais próximo da data das eleições, com uma carga afectiva e emocional que a rádio tem diferente da televisão, e porque o horário vai coincidir com o período de trabalho das pessoas, ou seja, vão ser confrontadas com a sua própria realidade vivida ao mesmo tempo que escutam os dois políticos, pode acabar por ter mais influência inesperada. 

A foto que Sócrates fez chegar à TVI, de um convívio em sua casa em volta da mesa com amigos, é especial do ponto de vista semiótico. A foto não é a imagem de um homem vulgar a jantar numa situação normal, mas antes a de uma ideia de Sócrates e da sua forma de estar na vida. Frugal, apreciador das coisas simples, distante de vícios. É que na foto, apesar da presença dos copos utilizados para o vinho, as garrafas sumiram-se. Só ficaram as de água, tão natural como ele. 

Persiste, está no seu direito, tal como os outros estão em omitir opinião sobre o seu acto público. Dá pena porque, seja por falta de bom senso, ânsia descontrolada de protagonismo ou alucinação, no fim o que resta é só o corpo nu de uma mulher. 
 
Consultor de comunicação
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