Uma figura improvável esteve na passada segunda-feira perante uma plateia de socialistas a apresentar o livro de Pedro Adão e Silva e Mariana Trigo Pereira “Cuidar do Futuro – Os mitos do Estado social português”. Essa figura era Manuela Ferreira Leite. Na sua intervenção, a antiga líder do PSD não poupou o governo, falando de uma “quebra de confiança” dos cidadãos.
Enquanto ministra das Finanças de Durão Barroso, Ferreira Leite foi acusada de viver obcecada com os valores do défice, ao ponto de o Presidente Jorge Sampaio dizer, numa célebre frase, “há vida para além do défice”. Na altura, a ministra chegou a afirmar: “Nós tomaremos todas as medidas que forem necessárias para que esse objectivo [redução do défice] seja cumprido.”
Porém, hoje que o governo parece cumprir o tipo de política que a antiga ministra das Finanças defendia, Ferreira Leite não perde uma oportunidade para mandar alfinetadas ao governo laranja… O que a motiva?
Há quem acredite que, ao criticar o executivo de Passos Coelho, Ferreira Leite só tem mostrado a sua imparcialidade. Outros, menos benevolentes, acham que se trata de uma vingança pelos cortes no valor da sua pensão. Penso que há uma terceira explicação para isso (e que, de resto, não exclui por completo as anteriores): a dama-de-ferro do PSD não consegue perdoar ao homem que a substituiu na liderança do partido.
Pode uma figura destacada dos sociais-democratas dar a sua opinião? Claro que pode. Não tem direito a criticar o seu partido? Com certeza que tem (e ainda bem que dispõe de liberdade para isso). Mas num momento em que se joga o tudo ou nada na campanha para as legislativas, não deixa de ser estranho ver Ferreira Leite mais próxima dos socialistas que do seu partido. Tão estranho que se torna legítimo questionarmo-nos de que lado está realmente. E quais os seus motivos.