© Petros Giannakouris/AP
Os dramas humanos que se vivem nas fronteiras da Europa exigem uma clara assunção de responsabilidades e de deveres futuros. Há décadas que a União Europeia sabe que às suas costas chegam milhares de pessoas fugidas a conflitos ou, simplesmente, à miséria extrema, que procuram a qualquer custo o asilo europeu.
No entanto, na década passada, o discurso político era então, de forma simplista, em torno da necessidade de mais vigilância policial e, simultaneamente, de apoio aos países de origem, procurando conter a pressão migratória na sua génese.
A situação piorou dramaticamente nos últimos anos. Apoiar países de origem em guerra ou em desagregação total é impossível. Vigiar fronteiras e devolver àqueles cenários lamentáveis milhares de pessoas é inaceitável. Entre 2004 e 2014, o números de pedidos de asilo a países da União Europeia mais do que duplicou.
Chegam à Europa provindos da Síria, do Iraque, do Afeganistão, do Kosovo, da Eritreia… Perante mais de 600 mil pedidos de asilo em 2014, nem sequer metade foram decididos a favor dos requerentes. Portugal, aliás, dos meros 155 pedidos de asilo que decidiu em 2014, rejeitou 115, segundo os dados compilados pelo Eurostat – uma proporção, aliás, próxima de diversos outros estados europeus.
Então que fazer? Mais uma vez, os países da União recuperam as suas próprias histórias e fragilidades, para o melhor e para o pior. Não vale a pena clamar por uma política europeia na matéria, como se tem visto. Ela não existe, por mais declarações políticas que se possam encontrar, porque se até pode haver critérios de acolhimento comuns, é a nível nacional que eles se aplicam.
E, no tema, os interesses e as sensibilidades nacionais são extraordinariamente diversos e conjunturais. Mais uma vez, a Europa, celebrando em permanência a sua união económica e monetária, mostra quão divergente é na realidade.
A única solução pode vir a residir no reconhecimento da excepcionalidade deste nosso tempo. Pode ser que isso sirva para montar as fundações de algo novo, algo que permita afirmar a Europa perante os outros e perante si própria em torno de valores que gostamos de patentear como europeus, e que não sirva apenas os habitantes do presente, mas também os que venham depois de nós. Que sirva para apaziguar as tensões internas na Europa e as da Europa com os seus vizinhos.
Que sirva, enfim, para fazer política a sério e não apenas daquela que se faz tantas vezes na União, feita apenas à medida de um próximo cargo ou de um favor a este ou àquele estado-membro.
É preciso, portanto, que a Europa seja mais uma vez aquilo que a fez grande e ambicionada: uma terra onde o futuro conta mais do que o passado.
Professor da Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira