Afonso Reis domina seis idiomas. Além da língua materna, consegue falar fluentemente em inglês, alemão, francês, espanhol e italiano. Não foi por necessidade que as coleccionou. O ponto de partida desta viagem foi a escola, com inglês e francês, mas o interesse e a curiosidade levaram-no mais longe. Na universidade teve disciplinas em inglês, participou no programa Erasmus (em Lausanne, na Suíça), viajou muito e trabalhou em vários países. E de cada paragem levou consigo uma mochila cheia de culturas e experiências de vida.
“O facto de termos uma língua materna latina torna mais fácil aprender os idiomas latinos”, garante o agora empreendedor e professor universitário. Só o alemão saiu fora do baralho, e para o aprender foi preciso mudar “radicalmente a maneira de pensar”. O interesse pelas línguas abriu-lhe portas fora do país, levando-o à OCDE, às Nações Unidas e à organização social Swisscontact. Actualmente a viver em Portugal, reconhece que não utiliza diariamente este leque linguístico, mas falar seis línguas é um trunfo no trabalho.
“Vivemos num país pequenino, mas pensar que as línguas não são necessárias é um erro."
Para as minhas aulas vou buscar conteúdos a vários países e tenho alunos de todo o mundo”, conta o professor de 32 anos. Além disso, a organização que fundou com o intuito de incentivar a participação cívica dos jovens, Mentes Empreendedoras, está agora a internacionalizar–se para a Suíça.
INGLÊS, LÍNGUA GLOBAL Dominar vários idiomas é uma vantagem tanto para quem quer voar para longe como para os que não tiram os pés de Portugal. “Hoje, na maioria das empresas mais activas no recrutamento (multinacionais e internacionais), a perspectiva de uma carreira internacional é quase obrigatória”, avisa o profissional de recursos humanos da RAY Human Capital Miguel Abreu. E é por isso, aliás, que a multinacional de consultoria Everis disponibiliza um programa de idiomas no seu plano de formação, em versão e-learning e presencial.
“As línguas estrangeiras nas quais investimos mais são as dos países nos quais estamos presentes”, conta Cláudia
Silva, da equipa da People, destacando o inglês, o castelhano e o italiano. O essencial é que os profissionais saibam comunicar em mais de um idioma, com o inglês no topo da lista. “Ainda assim, e tendo em conta a aposta que se tem feito em Portugal para a formação em inglês, já não o encaramos como uma vantagem, mas como um obstáculo a enfrentar por quem não o domina.”
Obrigatória ou não, certo é que a língua inglesa não está tão enraizada como parece entre a população portuguesa. Quem o diz é Miguel Abreu e Inês Espada Vieira. A professora e coordenadora do curso de Línguas Estrangeiras Aplicadas da Universidade Católica está convencida de que a ideia de que actualmente todos conseguem falar inglês é apenas um “mito”. “Existe ainda uma percentagem considerável de pessoas que, quando são avaliadas neste idioma, se sentem pouco à vontade”, acrescenta o consultor da RAY Human Capital, explicando que o nível
normalmente exigido não tem de ser perfeito, mas deve ser “suficiente para uma pessoa se sentir confortável a comunicar.”
DO GLOBAL AO MINORITÁRIO Que o inglês deveria ser hoje um dado adquirido, ninguém duvida. Segue-se o espanhol, porque é impossível fugir aos nossos vizinhos, mas o francês e o alemão também têm bastante peso no mercado de trabalho, especialmente se os planos passam pela União Europeia.
Já o mandarim, com o crescimento da China no panorama económico internacional, é uma aposta de futuro. Mas está
longe de ser um desafio fácil. “Tem um sistema linguístico tão diferente do nosso que não podemos investir apenas dois anos e desenvolver o resto sozinhos”, avisa Inês Espada Vieira. Falar a língua dos chineses exige paciência, método, esforço e concentração.
E o que dizer das línguas minoritárias? Idiomas como o catalão, o basco e o gaélico escocês – circunscritos a regiões específicas, com um número reduzido de falantes – tornam-se, do ponto de vista profissional, menos imediatos. Mas uma língua vai muito além da sua razão mercantil, “embora seja também esse tipo de relação afectiva que muitas vezes desencadeia os negócios”, ressalva a professora da Universidade Católica. Cláudia Silva concorda.
Mesmo nestes casos, o conhecimento da língua “pode valorizar o currículo de um profissional, como factor de distinção”. A explicação é simples: é impossível separar valorização pessoal e profissional. E a aprendizagem de uma língua é uma “estimulação global de grande impacto”, assegura o psicólogo da Universidade de Lisboa Paulo Jesus.
Os benefícios são a todos níveis.
Aprender línguas é um processo que “complexifica e enriquece o cérebro com impactos ao nível da linguagem, da inteligência e da aprendizagem em geral”, ajudando ainda a “enriquecer as
competências sociais e comunicacionais”.
BURRO VELHO APRENDE LÍNGUAS Com um catálogo de vantagens tão alargado, o melhor é começar cedo. “Quanto mais precoce for a aprendizagem, mais duradouros serão os seus benefícios”, diz Paulo Jesus, explicando que as crianças conseguem aprender mais rapidamente, sem esforço e com uma perfeição gramatical e fonética que na idade adulta é impossível alcançar.
Ainda assim, aprender novos idiomas não é um horizonte inatingível para os mais velhos. “Os adultos necessitam de
muita gramática e treino fonético para corrigir contágios entre línguas, mas não é uma tarefa impossível”, diz o psicólogo. O estudo de idiomas difíceis e radicalmente novos (como o coreano ou o mandarim, entre outros) tem, aliás, um “efeito estimulador do cérebro”, com grandes benefícios para os idosos, por ajudar “a prevenir doenças como o Alzheimer”.