Café Central. Em Paderne, ali mesmo ao lado do Purgatório

Café Central. Em Paderne, ali mesmo ao lado do Purgatório


Quase esquecido nos confins do concelho de Albufeira, o Café Central de Paderne tem as paredes verdes para “tranquilizar” os clientes. Por enquanto tem resultado e as únicas exaltações foram do pai do actual dono.


Enxertia, Agostas, Marcos Mendes, Vale da Ursa, Pedra de Escorregar, Maritenda… A busca por cafés centrais leva-nos por caminhos impensáveis e visitas a juntas de freguesia pouco próprias para este infernal calor algarvio. “Há um lá para os lados de Paderne”, diz alguém na estrada. Mas também houve alguém em Vizinhanças, terra nas vizinhanças de Moncarapacho, que recomendava outro fechado há uma década.

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O fim deve estar próximo e não é por acaso que no ecrã do GPS começam a surgir indicações para o Purgatório. Purgatório, essa terra perto de Paderne, que por sua vez também fica a caminho de Guiné e Vale de Pegas. Purgatório, o sítio ideal para uma paragem para uma cerveja antes que seja tomada qualquer decisão.

E é precisamente no Purgatório que conhecemos o veredicto final: o Café Central em Paderne está vivo e recomenda–se.

Aleluia, senhores, que isto já se estava a tornar penoso. Paderne não é grande, não conhece grandes problemas de estacionamento e o toldo do dito Café Central, ali mesmo a três passos, brilha quase tanto como a próxima cerveja que nos espera no balcão.

“Eu pago”, oferece-se um homem depois de pronunciar qualquer coisa sobre as ressacas de segunda-feira e de citar António Variações e “o corpo é que paga” do costume. “Eu trabalho no campo, então depois não consigo estar de cabeça para baixo.”

O Café Central está vazio até chegarem dois polícias para um Calipo de limão. Também surge outro miúdo a pedir gelados e, por enquanto, a arca da Olá está a ganhar ao frigorífico de minis. Três Calipos contra duas minis num dia de calor. A coisa não se vai ficar por aqui e é tempo de conversar com o simpático Luís Pereira, dono do estabelecimento.

Luís herdou o negócio aberto no final de 1980 pelo pai, Agostinho Pereira, que não tinha muita paciência para a coisa. “Não lhe agradava a profissão, isto não é para toda a gente”, comenta. Aliás, ainda se lembra do dia em que o pai, em resposta a um cliente queixoso, varreu com o braço para o chão a pilha de loiça que estava em cima do balcão.
Não é para todos, de facto, e a prova disso é que a família voltou para o Canadá, para onde já tinha emigrado, e o café esteve alugado a outra pessoa durante mais de 25 anos – e até 25 de Maio deste ano. Foi nessa altura que Luís, durante 28 anos empregado numa empresa de aluguer de automóveis em Albufeira, teve de voltar ao café.

“A firma chegou a ser uma das maiores, com uma frota de 8600 carros, mas entrou em problemas financeiros”, diz Luís, um dos prejudicados. “Tenho muita pena, custou-me muito sair porque gostava muito de lá estar. Senão nem tinha ficado tanto tempo.” Com o dinheiro que levou para casa remodelou o café (excepto o balcão, que ainda mantém o tampo de origem) e pintou as paredes de verde-claro. “Dei um ar um pouco mais moderno. O verde nas paredes foi para manter as pessoas calmas. Andei a estudar as cores e vi que o verde tranquiliza. Até tive rolo de papel higiénico verde. E até agora tem resultado.”

Os clientes do café são os locais de Paderne e alguns visitantes, principalmente os que vêm à terra para a missa de domingo. Também há algum turismo, mas nada que se compare à vizinha Albufeira. “Nós estamos no fim do concelho e fomos ficando para trás”, conta. “Um bocado esquecidos.” De vez em quando alguém se lembra de Paderne para uma visita ao castelo, “um dos castelos que estão na bandeira portuguesa”, explica Luís.

De resto, nada de grande movimento, talvez só em dias de jogos de futebol. “Uns estrangeiros até já me reservaram aquela salinha só para ver a Liga inglesa”, conta. O café também podia entrar no Guinness com a esplanada mais pequena do mundo, num minúsculo pátio nas traseiras, com uma mesa e duas cadeiras, onde duas pessoas já ficam apertadas.

“Não era a profissão que eu idealizava para o resto da minha vida, mas tudo bem”, conforma-se Luís. Na verdade, a sua paixão é o automobilismo. “Também não me importava de ser camionista de longo curso.” O café não tem mais empregados e a única folga é à quinta-feira, quando Luís gosta de conduzir até uma praia longe da confusão de Albufeira. “Odeceixe, por exemplo.”

No caminho de volta pelo Purgatório também pensamos numa boa alternativa para escapar ao inferno da praia da Oura. Procuramos no GPS e a solução aparece algures nas imediações: Vale de Paraíso. Será que também há por aí algum Café Central? 

Café Central de Paderne
Ano: 1980
Dono: Luís Pereira
Especialidade: Caracóis e pipis
Preço do café: 60 cêntimos
Preço da cerveja: 1,10 euros uma média, 70 cêntimos a mini
Clube de futebol do dono: Benfica