Robbie Maddison. No oceano não há hora de ponta

Robbie Maddison. No oceano não há hora de ponta


Vai daí o australiano decidiu dar outro uso à sua moto. Surfou a poderosa onda de Teahupo’o e quase não sobrevivia para contar a história do “Pipe Dream”, que levou dois anos a preparar.


"Estava num barco, a navegar pelo rio, e olhava para o movimento da prancha de wakeboard da minha mulher, quando algo fez clique na minha cabeça. Fantasiei pôr esquis numa moto e conduzir na água. Foi uma visão estúpida na altura, mas continuei a brincar com o conceito e acabou por se tornar realidade.” Quando Robbie “Maddo” Maddison tem uma ideia que envolva motos, é melhor levá-lo a sério. O australiano de 34 anos habituou-se a desafiar a gravidade por cima de duas rodas. Já saltou sobre um campo de futebol americano, por cima do Arco do Triunfo em Las Vegas, de um lado para o outro da Tower Bridge londrina (aberta com mais de 8 metros de intervalo), por cima do canal de Corinto, na Grécia, ou do alto de uma rampa de esqui a 90 metros.

O seu último projecto, intitulado “Pipe Dream”, não implicava aterragens em terra ou cimento. A estrada que Maddo queria percorrer move-se e não é sólida. Falamos da onda de Teahupo’o, no Taiti, uma das mais espectaculares e perigosas do planeta. O australiano surfa desde os oito anos, mas desta vez deixaria a prancha e o wax em casa. Tal como muitos condutores aproveitam as duas rodas para escapar ao trânsito nas horas de ponta, Maddo usaria a sua moto de freestyle para ultrapassar o crowd no line-up e dropar uma bomba de Teahupo’o. Mas havia obstáculos a ultrapassar – esqueça a lei de Arquimedes; se conduzir uma mota na água, ela vai afundar. “Podes andar por pouco tempo, até a roda da frente furar a superfície e atirar-te por cima do guiador”.

O desafio era grande. Teahupo’o (que na língua local significa Pilha de Cabeças) é uma vila onde quebra uma poderosa onda em fundo de coral. Reza a lenda que o seu nome vem de uma famosa guerra tribal, em que os vencedores decapitaram os guerreiros mortos e fizeram uma pilha com as cabeças. Acredite-se ou não na história, é impossível negar a raiva do mar naquele local. O rugido das ondas a quebrar faz qualquer surfista experiente pensar duas vezes antes de descer as cavernosas paredes da onda. “Teahupo’o não é uma onda, é uma zona de guerra. Uma aberração da natureza que algum desgraçado decidiu chamar
surf spot”, descreveu Gary Taylor, reputado jornalista de surf norte-americano.

Antes de pensar nesses perigos, Maddo precisava que a sua moto se aguentasse à superfície da água. O projecto demorou dois anos a concluir. “Sempre que a moto afundava (aconteceu mais de 100 vezes), tínhamos um extenso trabalho mecânico a reconstruí-la para mais uma volta. Sabíamos que ia afundar várias vezes, por isso mudámos para um motor a dois tempos, menos complexo e com menos electrónica”. Por baixo das rodas foi colocado um esqui feito à medida, com quilhas por baixo, para ajudar a manobrar. O resultado foi um veículo anfíbio, que se movia da terra para o mar sem dificuldade.

A parte técnica estava resolvida. It’s showtime. Robbie apanhou algumas ondas, mas faltava uma que enchesse a vista, para o plano final do vídeo (11,5 milhões de visualizações no YouTube em três dias). Até que uma tempestade tornou o mar mais alto e ameaçador, com ondas a chegarem aos 10 metros. “Cada átomo do meu corpo dizia que não fosse. Mas sentei-me na água e de forma arrogante disse que ia”, contou à televisão australiana. Maddo lida bem com a adversidade: ganhou os X-Games com um pulso partido e foi duplo de Daniel Craig (James Bond) nas arriscadas perseguições de moto pelos telhados de Istambul em “Skyfall”.

Aqui, se corresse mal, não era um simples “corta” e “take 2” que o salvaria. O australiano apanhou uma daquelas bombas. “Tinha pelo menos 7 metros.” Acabou por cair. “Pensei que era o fim. Tive de esperar pacientemente que a onda me desse porrada. A moto bateu-me nas costas e perdi todo o ar nos pulmões. Tive, literalmente, de desistir de viver.” Diz-se que a sorte protege os audazes. Talvez seja verdade. “Rendi-me e, antes de me aperceber, estava a respirar novamente. Assim que abri os olhos uma onda bateu-me na cara e fui ao fundo outra vez.” Já pode respirar fundo: Maddo foi resgatado depois de levar com quatro ondas e o “Pipe Dream” não terminou tragicamente.