Zé Luís (ou José Luís dos Santos Sousa, como muita gente faz questão de se apresentar por estes lados) só tem dois sítios para estar na vida. No mar, onde trabalha quatro noites por semana, na pesca do chicharro (palavra que, pelo sotaque, demoramos algum tempo a decifrar e que quer dizer carapau), e no Central de Vila Franca. “Sempre que não estou aqui é porque estou no mar”, diz, relógio ainda a bater as 11 da manhã e já de Especial (a cerveja açoriana) na mão.
Dizemos-lhe que viemos do Continente e ele sabe perfeitamente como é, já lá esteve, foi lá em Almada que fez a maior das suas tatuagens, “uma cobra que vai do ombro assim pelo peito até aqui”. Mas voltou.
Quando Zé Luís nasceu, há 59 anos, numa casa muito perto daqui onde vivia o seu pai que, como o pai dele e o pai do pai dele, era pescador, era o tempo em que se apanhava “mil quilos de chicharro” num dia só. “E vendia-se os mil pelo preço de mil.” Agora, queixa-se Zé Luís, pesca-se 300 e não dá mais. Não é só no Continente que não se consegue viver da pesca, desabafa. “Agora? Agora pescamos 300 e às vezes nem esses 300 se vendem.” E, claro, Zé Luís só recebe pelo peixe que vende.
{relacionados}Onde a pesca tem futuro, diz, é na América (nos Açores, o sonho americano é o verdadeiro sonho para muitos). Zé Luís tem nove filhos, seis homens, e os seis emigraram para a América. De um dia para o outro, sem papéis, como vão todos. “Lá a pesca não é como aqui, lá tem de se esperar por lugar para poder ir para o mar”, explica. “Aqui, se me disser que quer vir pescar, pode vir já amanhã.” A sério? “A sério. Quer vir?” E dá--nos o número de telefone.
Na América, os seus filhos são pedreiros. Zé Luís tem seis filhos e com seis filhos será o último pescador numa família que sempre viveu do mar.