Philippe Quesne: “Quem vê uma peça nossa vê o mundo a desacelerar”

Philippe Quesne: “Quem vê uma peça nossa vê o mundo a desacelerar”


“Swamp Club” está hoje no Teatro Municipal do Porto, numa apresentação única. Às 21h30.


É um dos nomes maiores da programação do Teatro Municipal do Porto. Está hoje no Rivoli para uma apresentação única de “Swamp Club”. O espectáculo foi gerado de acordo com a visão que o da companhia Vivarium Studio, Philippe Quesne (também é o actual director do Centro Dramático Nacional Nabterres-Amandiers), sempre teve: juntar a importância da cenografia e da imagem a interpretações que vão crescendo a cada representação.

“Swamp Club” conta a história de uma colectividade artística que procura defender um espaço improvável face a uma ameaça de destruição iminente. Numa espécie de refúgio natural que ninguém quer – um pântano – acompanhamos um grupo de criadores que apenas quer defender o que é seu.

Quesne, que arriscar como quase nenhum outro criador, diz-nos, em entrevista, que o Vivarium também foi criado para dar espaço a ideias que não tinham formar de respirar. A vida real e a imaginária estão juntas numa peça que deverá continuar a correr mundo, dois anos depois de ter nascido.

– Estão no Porto uma só noite. Há mais pressão por ser uma apresentação única? Mais responsabilidade?

Não, há coisas que ganham mais importância e deixam isso para segundo plano. Estamos muito contentes por apresentar “Swamp” Club no Porto, é a primeira vez em Portugal. Apresentámos o espectáculo pela primeira vez há 12 anos no festival de Viena, em Autriche, e desde então nunca mais parámos. É uma excelente oportunidade de viajar e montar as nossas criações em locais distintos, com culturas diferentes. Temos tido a oportunidade de apresentar praticamente todas as nossas criações em Lisboa, na Culturgest ou no festival Alkantara. Mas esta é a primeira vez no Porto. Melhor ainda é estar aqui durante a primeira temporada dirigida pelo Tiago Guedes, com quem já estive em diferentes digressões. Aliás, a produção cultural portuguesa é presença regular em Paris, por exemplo. Tiago Rodrigues, Vera Montero, muitos outros nomes, são criadores extraordinários.

– Estão em digressão com “Swamp Club” há dois anos. Não há um prazo de validade para o que vemos em palco?

“Swamp Club” conta a história de um centro de artes ameaçado. Logo por aqui parece-me um assunto que será sempre actual. Decidi, desde o início, colocar a peça num cenário metafórico, um pântano. É, por natureza, um terreno onde não se pode construir nada, ao mesmo tempo é o local que as personagens querem defender. Tem esse lado dramático, quase trágico, que é ampliado por um quarteto de cordas, um grupo de músicos que é sempre do local onde actuamos.

– Talvez isso também esteja relacionado com o facto de estarmos perante personagens que não são pessoas especiais, não heróis nem indivíduos fora de série.

Claro. Não trabalho com actores de fomação mas trabalho sempre com as mesmas pessoas, a partir do primeiro dia, do primeiro espectáculo. E à medida que o tempo vai passando, vamos todos acrescentando e mudando coisas, alterando a linguagem. É um processo fascinante, estamos sempre a descobrir um novo vocabulário. O que gosto de fazer é de montar micro-mundos, com gente que quer levar em diante as suas fantasias e filosofias. Afinal, é mais ou menos isso que qualquer pessoa faz, em qualquer dia. Só que nós fazemo-lo perante um público, com um determinado objectivo. Daí essa proximidade.

– São tudo princípios que tem seguido desde o início do Vivarium Studio, fundado há 12 anos. Como avalia o trabalho feito até agora?

A minha formação está nas artes visuais, trabalhei durante uma dúzia de anos como cenógrafo de espectáculos e exposições. Acontece que cheguei a um momento em que não conseguia encontrar o meu lugar enquanto espectador na oferta cultural que tinha em França. Foi nessa altura que decidi fazer os meus espectáculos, foi para isso que criei o Vivarium Studio. O meu objectivo era misturar diferentes expressões criativas, das artes plásticas á literatura, ao mesmo tempo que dava toda a importância aos diferentes processos de construção, a importância que eles merecem. Queria defender o lugar das artes nas nossas vidas, das utopias colectivas. As peças que fazemos têm como centro o prazer pela observação, que o espectador goste de ver, reconheça no palco um ecossistema, sem ter necessariamente que recorrer às tensões dramáticas clássicas. Tudo isto fazendo com que o tempo ande mais devagar. Quem vê uma peça nossa vê o mundo a desacelerar.

– Estão continuamente em viagem, em diferentes palcos de diferentes países. A língua nunca é um obstáculo?

Muitas vezes procuramos fazer alguma adaptação em relação aos locais onde estamos, revemos muitas vezes as questões linguísticas. Mas a verdade é que as nossas peças têm poucas palavras, não há muito discurso, e quando há está muitas vezes misturado com os sons e com a música.

– Além do trabalho enquanto criador, é um espectador assíduo?

Claro que sim. A última peça que vi foi “Gala”, uma criação de Jérôme Bel.