Red Bull Cliff Diving. “Ver as meninas saltar é três vezes mais stressante”

Red Bull Cliff Diving. “Ver as meninas saltar é três vezes mais stressante”


Na estreia da etapa feminina nos Açores, as mulheres arrasaram.


Ilha de São Miguel. Estamos a Este de Ponta Delgada, em Vila Franca do Campo. A curta viagem de barco até ao ilhéu onde se disputa a etapa do Red Bull Cliff Diving é um desafio aos sentidos, onde é impossível não se deixar impressionar pela beleza natural do nosso destino.

À medida que nos aproximamos, distinguimos claramente duas plataformas montadas num penhasco, a 27 e 20 metros de altura em relação ao mar. Estão preparadas para as competições masculina e feminina, respectivamente. Porém, quando chegamos, as mulheres estão a saltar directamente da rocha, num local conhecido como Cabeça de Cobra. O cenário imponente e o estilo das mergulhadoras impressiona.

Mais tarde os homens saltarão quase do mesmo local, poucos metros acima. É a quarta vez que os Açores recebem uma etapa do circuito mundial do Red Bull Cliff Diving, mas é uma estreia para a competição feminina (o tour só se iniciou em 2014). E a coragem das oito mergulhadoras não passa despercebida a ninguém, nem sequer aos atletas masculinos, habituados a saltar de alturas superiores. “As senhoras são uma loucura. Não gosto de ver os mergulhos dos outros competidores porque alguém se pode magoar. Mas, com as meninas, é três vezes mais stressante para mim. Hoje estiveram tão bem ou melhor que os homens. Lindo”. É Artem Silchenko, russo vencedor do circuito em 2013, que nos confessa.

Uma a uma, as senhoras completavam os seus saltos com graciosidade e técnica. Na ronda 2, já da plataforma de 20 metros, voltaram a estar a grande nível. Adriana Jiménez, a atleta mais pontuada do dia, garante-nos que esta é a sua paragem favorita do circuito mundial. A mexicana de 30 anos destilava boa disposição e explicava, com uma descontracção desarmante, que a sua estratégia para não ter medo é pensar que o sítio de onde salta não é assim tão alto. Boa ideia. Na prática, não é assim tão fácil. Mais tarde, quando temos oportunidade de pisar a plataforma a 27 metros do mar, percebemos a dificuldade do desafio: só dar alguns passos para chegar à ponta e espreitar lá para baixo é algo que poucos conseguem. Os atletas fazem-no para efectuar mergulhos com mortais, piruetas e outros tantos truques. A margem de erro é menor que na maior parte dos desportos. Uma queda em falso e a temporada pode terminar naquele momento.

Fair play é isto Rachelle Simpson, a norte-americana de 27 anos que venceu o Red Bull Cliff Diving em 2014, também estava maravilhada com o Ilhéu de Vila Franca do Campo. “É esmagador. Levou-me mais tempo a entrar no meu ritmo de mergulho. Hoje, por exemplo, o primeiro mergulho correu bem, mas no segundo os meus sentidos ainda estavam sufocados pela paisagem, o monolito, as ondas… é um desafio mas adoro”, explicou ao i.

De acrobata num espectáculo aquático em Macau, Rachelle passou a estrela do circuito feminino de Cliff Diving. Venceu todas as etapas no ano passado e a primeira desta temporada, no Texas. O primeiro dia nos Açores [a prova termina amanhã, sábado] não correu tão bem, mas o medo é algo que não controla a atleta norte-americana. “Embora o mergulho não tenha sido tão bom como esperava, estou aqui a ultrapassar isso neste sítio tão, tão lindo. Se pudermos continuar a fazer mais coisas destas, bring it on!”.

A camaradagem entre os atletas é raramente vista noutras modalidades. Aqui, todos se apoiam e encorajam uns aos outros. Antes de adversários, são amigos. Ou irmãos, como alguns preferem dizer. Cada salto é aplaudido pelos rivais. Entre as mulheres não é diferente. O que todos valorizam no fim de um dia de trabalho é estarem sãos e salvos.

Certamente que se recorda dos elogios de Artem Silchenko à performance das senhoras. Vindo dele, as palavras têm ainda mais peso. O russo é um dos mais destemidos saltadores do tour. Hoje tentou um novo mergulho, “um dos mais difíceis do mundo”. “Ainda ninguém o fez”, garantiu. O que lhe disseram os seus adversários, ou amigos? “Man, és maluco!”. Se isto não é um espectáculo à parte, é porque ainda não o viu ao vivo. E agora, com as senhoras, os Açores têm o dobro do espectáculo para oferecer.