Apontamentos de Verão


A época de férias servirá para reflectir sobre o voto de Outubro e para se decidirem as candidaturas presidenciais de Maria de Belém e Alberto João Jardim.


1. Aproxima-se o tempo das decisões. Para os indecisos e para os que “juraram” não voltar a ir ao silêncio da urna. O Verão vai ser intenso e ditar muito do que Outubro dirá. Muitos deliberarão o seu voto no passeio pela praia, no piquenique no monte, no jantar da família reunida, na espera por um avião ou no reencontro de fim-de-semana.

Encontram-se reunidos os pressupostos para muitos optarem em regime colegial, entre o aconchego dos mais próximos e influentes. Um regime de partilha que as sondagens não vão conseguir captar até à hora de colocar a cruz. Seja como for, os prognósticos apontam para que os blocos de possível governo possam ter 75% dos votos. Talvez um pouco mais, considerando o significado último do voto útil. Está tudo em aberto. Mas é preciso fechar mais os círculos. A Passos e Portas não basta o refrão do temor do regresso ao passado – é preciso um programa com uma ideologia nova. A Costa não bastam os acordes de um plano – é preciso adesão com a realidade. Depois, parece que a roda vai acabar em Cavaco. E nas novas lideranças de quem não ganhar. 

2. A legislatura chega ao fim e o ciclo da troika esgota-se. Este foi o primeiro governo de coligação que cumpriu até ao fim o mandato. Esteve para não ser assim. No Verão de 2013, a saída epistolar de Vítor Gaspar (lembram--se?) e a ascensão meteórica de Maria Luís Albuquerque motivaram a querela entre a irrevogabilidade de Portas e a persistência de Passos. Quase que se determinava a queda do governo. Os esforços de Cavaco Silva – com a garantia de realizar eleições antecipadas em 2014 – e a recusa de António José Seguro em participar nos “pactos de governação” fizeram com que a coligação ganhasse um outro fôlego. Internamente, por questões de sobrevivência mútua; externamente, por reflexo da saída limpa do resgate e da melhoria dos indicadores orçamentais e económicos. Foi esse o momento (letal para Seguro) que permitiu que a coligação chegasse até aqui com reais possibilidades de lutar pela vitória em Outubro, capitalizando pelo caminho uma certa “normalização” da vida do país. Em grande medida, portanto, Seguro contribuiu para uma nova vida da coligação, recusando, a prazo curto, a mais que provável cadeira de sonho de São Bento. Em outra medida, conclui-se, Seguro acabou por minar o caminho alegadamente triunfal de António Costa. Quem ressuscita em política é sempre alguém a ter em conta.

3. No balanço da coligação no Conselho de Ministros ficam erros e equívocos. E deveria ficar uma lição: a teimosia nem sempre é qualidade. Vejamos o caso de algumas figuras. Por muito que se confie e acredite na equipa de ministros seleccionada no início, há alturas em que a parte (ou as partes) prejudicam decisivamente o todo. Cavaco jamais caiu nessa falência: nunca olhou para trás na altura de abdicar de um ministro que intoxicasse o trabalho de todo o governo. Relvas fez o que tinha a fazer. Outros, ao saírem, permitiram um rejuvenescimento cirúrgico, como aconteceu com Pires de Lima. Outros ficaram e não deviam. Na hora de decidir o voto, serão recordados. Desnecessariamente. 

4. E se Maria de Belém e Alberto João Jardim se candidatassem à Presidência? Os sinais parecem indicar que estão com vontade e esperam pelo dia seguinte às legislativas, pois agora todos se convencem que esse é o dia que interessa para esta luta. Se avançarem, seria necessariamente tudo diferente à esquerda e à direita. E muito mais estimulante, inovador e desafiante. O Verão também servirá para resolver as incógnitas.

Professor de Dir eito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto
Escreve à quinta-feira

Apontamentos de Verão


A época de férias servirá para reflectir sobre o voto de Outubro e para se decidirem as candidaturas presidenciais de Maria de Belém e Alberto João Jardim.


1. Aproxima-se o tempo das decisões. Para os indecisos e para os que “juraram” não voltar a ir ao silêncio da urna. O Verão vai ser intenso e ditar muito do que Outubro dirá. Muitos deliberarão o seu voto no passeio pela praia, no piquenique no monte, no jantar da família reunida, na espera por um avião ou no reencontro de fim-de-semana.

Encontram-se reunidos os pressupostos para muitos optarem em regime colegial, entre o aconchego dos mais próximos e influentes. Um regime de partilha que as sondagens não vão conseguir captar até à hora de colocar a cruz. Seja como for, os prognósticos apontam para que os blocos de possível governo possam ter 75% dos votos. Talvez um pouco mais, considerando o significado último do voto útil. Está tudo em aberto. Mas é preciso fechar mais os círculos. A Passos e Portas não basta o refrão do temor do regresso ao passado – é preciso um programa com uma ideologia nova. A Costa não bastam os acordes de um plano – é preciso adesão com a realidade. Depois, parece que a roda vai acabar em Cavaco. E nas novas lideranças de quem não ganhar. 

2. A legislatura chega ao fim e o ciclo da troika esgota-se. Este foi o primeiro governo de coligação que cumpriu até ao fim o mandato. Esteve para não ser assim. No Verão de 2013, a saída epistolar de Vítor Gaspar (lembram--se?) e a ascensão meteórica de Maria Luís Albuquerque motivaram a querela entre a irrevogabilidade de Portas e a persistência de Passos. Quase que se determinava a queda do governo. Os esforços de Cavaco Silva – com a garantia de realizar eleições antecipadas em 2014 – e a recusa de António José Seguro em participar nos “pactos de governação” fizeram com que a coligação ganhasse um outro fôlego. Internamente, por questões de sobrevivência mútua; externamente, por reflexo da saída limpa do resgate e da melhoria dos indicadores orçamentais e económicos. Foi esse o momento (letal para Seguro) que permitiu que a coligação chegasse até aqui com reais possibilidades de lutar pela vitória em Outubro, capitalizando pelo caminho uma certa “normalização” da vida do país. Em grande medida, portanto, Seguro contribuiu para uma nova vida da coligação, recusando, a prazo curto, a mais que provável cadeira de sonho de São Bento. Em outra medida, conclui-se, Seguro acabou por minar o caminho alegadamente triunfal de António Costa. Quem ressuscita em política é sempre alguém a ter em conta.

3. No balanço da coligação no Conselho de Ministros ficam erros e equívocos. E deveria ficar uma lição: a teimosia nem sempre é qualidade. Vejamos o caso de algumas figuras. Por muito que se confie e acredite na equipa de ministros seleccionada no início, há alturas em que a parte (ou as partes) prejudicam decisivamente o todo. Cavaco jamais caiu nessa falência: nunca olhou para trás na altura de abdicar de um ministro que intoxicasse o trabalho de todo o governo. Relvas fez o que tinha a fazer. Outros, ao saírem, permitiram um rejuvenescimento cirúrgico, como aconteceu com Pires de Lima. Outros ficaram e não deviam. Na hora de decidir o voto, serão recordados. Desnecessariamente. 

4. E se Maria de Belém e Alberto João Jardim se candidatassem à Presidência? Os sinais parecem indicar que estão com vontade e esperam pelo dia seguinte às legislativas, pois agora todos se convencem que esse é o dia que interessa para esta luta. Se avançarem, seria necessariamente tudo diferente à esquerda e à direita. E muito mais estimulante, inovador e desafiante. O Verão também servirá para resolver as incógnitas.

Professor de Dir eito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto
Escreve à quinta-feira