© Afonso Palma
Sabemos como os americanos gostam de arrumar as realidades nas gavetas certas. Agarram-se às estatísticas e às naturezas como ninguém e compartimentam como sábios. Dá-lhes previsibilidade para assumirem o risco. É uma receita e resulta. Como o mundo ocidental bebe pela cultura dos americanos, meia volta e outro tanto (pelos livros, pelas revistas e pelos jornais) chega – no que agora interessa – para compreendermos o afã com que se etiquetam as gerações nascidas depois de terminada a II Guerra Mundial – o verdadeiro início da “nova ordem”.
Rezam os estudos que, desde então, tivemos, na fase de proliferação entusiasta da espécie, os “baby boomers” (que se seguiram à geração “silenciosa” que nasceu entre as duas grandes guerras) e, depois, como filhos, a Geração X (onde estão os que hoje têm entre os 36 e os 50 anos – aqui estamos eu e nós, metidos na transição para o fabuloso mundo da tecnologia!). Nós fomos as cobaias das fortunas informáticas de Gates e Jobs, e desde então vivemos em esforço permanente e sucessivo para acompanhar a evolução.
Ensinamos o que podemos aos pais (que fizeram o que puderam na lógica de “contracultura” da década de 60) e olhamos de lado para a Geração Y, os denominados “millennials” – que vai, actualmente, da adolescência até aos 35 anos. Esta geração do “milénio” (ou da Internet) é já considerada a categoria sociológica mais poderosa dos tempos que correm (ainda que só 1/5 da população), ancorada nos avanços tecnológicos, medida pela virtualidade na interacção social e profissional, enraizada ou influenciada pelo ambiente das células urbanas.
Diz-se deles que têm dificuldade em constituir ou manter família e em ver o emprego como algo de estável e duradouro (ainda que queiram equilíbrio com a vida pessoal). Viajaram desde cedo, ganharam mundo e educaram-se para além da formação e do curso. São os mais qualificados de sempre; são os mais inovadores e egocêntricos de que há memória; imediato e efémero é a praia deles.
São materialistas e intelectualmente desembaraçados, desde logo porque os pais (tal como os pais da minha geração) compensaram neles as impossibilidades e as lacunas. Querem progredir nas carreiras (e até chegar ao topo) porque, acima de tudo, ambicionam salários que suportem a qualidade de vida a que aspiram. Preferem gozar a serem proprietários. São práticos na vivência com a experiência e “fast adopters” com a mudança. São polivalentes, flexíveis e criam negócios.
Desvalorizam as ideologias e privilegiam o consumo. Cultivam o corpo e desmerecem o conhecimento enciclopédico. E já não vivem sem as facilidades dos smartphones, dos tablets e das redes sociais, com a expectativa de, em tempo real, despacharem informação e entretenimento em qualquer lugar do mundo e em qualquer momento do dia.
São verdadeiramente digitais, estabelecem relações pessoais online e compram nas plataformas e nas aplicações. São a primeira geração do mundo democraticamente “global”. São modernos (antes da pós-modernidade táctil dos filhos deles e dos meus). Mas são uma geração também sacrificada: pelos patrões das gerações mais velhas, pelas convenções passadas, pelos vícios da padronização, pelo horror ao devir.
É deles que tratamos quando se fala da emigração que a austeridade da troika implicou. Fizeram-se à vida. E não querem saber de política. Mas, entre os que ficam e os que voltam, são eles que vão decidir o próximo governo. Podem estar indecisos, mas vão optar. Sim, é a geração Y que vai mandar por último. Eles gostam disso.
Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto
Escreve à quinta-feira