Educação à medida. Todos iguais ou há espaço para a diferença?

Educação à medida. Todos iguais ou há espaço para a diferença?


A escola de massas foi importante para democratizar o acesso ao ensino mas tem vindo, cada vez mais, a ser questionada por escolas com abordagens diferentes. Motivo de alarme ou oportunidade de mudança?


Do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos, há um lugar mágico para os alunos. Um colégio em Atlanta deu vida a Hogwarts, a escola de magia de Harry Potter, de forma original. Os alunos, fardados, estão organizados por equipas e ganham pontos de acordo com os resultados académicos, o comportamento e outros parâmetros. As salas de aula são temáticas e não é estranho ver um professor a dançar em cima da mesa, acompanhado pelos alunos. Juntos, cantam e dançam Matemática, Geometria e outras disciplinas, que podem incluir áreas tão distintas como falar em público e competição saudável. Mas sem rigor esta magia de ensinar e aprender não acontece e é por isso que existe um código de conduta: as 55 regras de Clark, como responder a perguntas com frases completas. O sonho do Ron Clark Academy é simples mas ambicioso: fazer que os alunos adorem lá estar. Uma escola com uma identidade tão forte como esta cria certamente muitos amores e muitos ódios. Mas este exemplo americano – e tantos outros, na Finlândia, na Noruega e por esse mundo fora – é um bom pretexto para lançar a seguinte dúvida: o ensino deve ser diferenciado? Esta pergunta, em teoria, não oferece grande margem para erro. Já a sua aplicação prática não é fácil. Sim, o ensino deve ser diferenciado, responde o psicólogo e presidente do Instituto Superior de Ciências Educativas, Luís Picado. Mas a diferença não vale por si mesma e por isso esse modelo deve ter como fim “o desenvolvimento de aprendizagens significativas” e capazes de criar novas competências. Rodrigo Queirós e Melo, director executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, acrescenta ainda a importância de dar “várias opções a cada família, oferecendo-lhes diferentes alternativas para os filhos”. O que é algo que só se alcança com a diversificação de métodos, disciplinas, conteúdos e competências.

 

Mudança

Olhando para Portugal, é ainda preciso “partir muita pedra”. O actual modelo de educação massificada “está falido”, defende Queirós e Melo. Foi importante para democratizar o acesso ao ensino, nos anos 60 e 70, mas é agora necessário trilhar outros caminhos: personalizar e procurar alternativas à educação convencional, a um nível micro (professores e escolas) ou macro (políticas públicas). É essencialmente dentro da escola ou da sala de aula que têm surgindo, aos poucos, formas mais criativas de ensinar.

Professores e instituições de ensino já não podem olhar só para o seu umbigo: têm de alargar o campo de visão, conhecer os alunos e procurar novas formas de educar. Dar aulas na rua, substituir o Powerpoint pela experimentação, separar rapazes e raparigas ou misturar as várias idades são algumas das alternativas que existem no nosso país. “Há escolas em que a abordagem escolhida é mais tradicional, por dar segurança a professores e alunos, outras em que é possível a utilização de metodologias mais experimentais”, conta o professor e historiador de educação Paulo Guinote. Mas não é isso que determina se os alunos aprendem melhor ou pior a lição, defende Queirós e Melo, que prefere falar em “métodos centrados no professor ou no aluno”. Nenhum é melhor que a outro, garante. Tudo depende da abordagem da escola ou do professor e da predisposição do aluno para cada modelo de ensino. Para Luís Picado, no entanto, uma coisa é certa: “Apenas o ensino que vê a aprendizagem e o crescimento da criança como um processo complexo”, além da educação académica (mas também pessoal e social), pode ter sucesso.

Olhando para Portugal, é ainda preciso partir muita pedra. O modelo de educação massificada está falido.

Privado Vs Público

A educação deve reinventar-se, mas nem todas as escolas têm a mesma margem de manobra. Enquanto os colégios privados podem diversificar mais, nas escolas públicas a situação é diferente. Com turmas maiores, sujeitas à instabilidade da colocação de professores, à legislação vigente e mais dependentes do Ministério da Educação, estão mais limitadas. “É mais difícil personalizar”, explica Queirós e Melo, sublinhando que aquela que joga melhor nesse campeonato é a Escola da Ponte.

Estarão assim de mãos tão atadas? Carlos Silva assegura que não. O director do agrupamento de Silves Sul defende que as escolas públicas “deviam ter mais vontade” de inovar. As que dirige já o fazem: trabalham numa base da psicologia positiva, acabaram com o professor único no 1.o ciclo e estreitaram a relação com os pais. E reformularam ainda o currículo procurando acompanhar os diferentes ritmos de aprendizagem. É também por esse motivo que o director proíbe turmas com mais de 24 alunos: “É o mesmo que meter duas famílias num T2.” O sonho de Carlos Silva é que este modelo alastre ao resto do país. Mas é preciso ter em conta as características de cada comunidade, avisa Paulo Guinote, dando o exemplo da Escola da Ponte. “A partir dessa experiência que correu bem quis-se transmitir a ideia de que era possível criar escolas da Ponte em todo o país. Nenhum modelo de educação massificado pode ser diferente.”